Folha de S. Paulo


Cassino na Rússia vira Las Vegas para chineses endinheirados

Em um momento no qual poucos investidores desejam apostar na Rússia, um complexo construído em meio a uma floresta localizada a 6,5 mil quilômetros a leste de Moscou consegue atrair asiáticos endinheirados que não só não se preocupam com riscos, mas se deliciam com eles.

O Tigre de Cristal, por enquanto o único cassino na região de Vladivostok onde autoridades esperam criar uma vasta zona integrada de entretenimento, com oito palácios de apostas, é o maior complexo russo de jogos de azar.

Financiado majoritariamente por uma companhia de Hong Kong, a Summit Ascent, ele representa o maior investimento chinês em um lugar que o presidente Vladimir Putin tentou transformar no exemplo da virada para o leste da Rússia.

O movimento deu resultado. Os jogadores chineses estão chegando, tanto porque as apostas são ilegais em seu país exceto em Macau, quanto porque a floresta a nordeste de Vladivostok oferece o único cassino acessível aos mais de 100 milhões de chineses que vivem além da fronteira com a Rússia.

Li Yunhui, 45, empresário e apostador de Mudanjiang, cidade chinesa a cerca de 240 quilômetros de Vladivostok, disse que faltavam ao cassino russo o conforto e os serviços de centros já estabelecidos de jogos de azar, como Macau. Pelo menos é perto. E o ar é limpo, afirmou.

A GRANDE APOSTA

Os jogos de azar têm uma história longa e conturbada na Rússia, onde as atitudes são ditadas pela Igreja Ortodoxa, que se opõe aos cassinos como obra do demônio, e pelos escritos de Fiódor Dostoiévski (1821-1881), um viciado em apostas que discorreu sobre o perigo da prática no livro O Jogador.

Defensor dos valores cristãos tradicionais, Putin proibiu os cassinos e as máquinas caça-níqueis em 2009, se queixando de que muitos russos perdem o último centavo que têm e suas aposentadorias em jogos de azar.

Que chineses e outros estrangeiros percam o dinheiro deles em cassinos russos aparentemente não é problema. No ano passado, 300 mil chineses visitaram Vladivostok e a região vizinha de Primorsky, um número mais de 100% superior do que o registrado em 2015.

As apostas dos estrangeiros ajudam a cobrir os salários dos cerca de mil empregados que trabalham para o cassino e oferecem uma fonte de renda para a região, que, exceto por projetos de infraestrutura bancados pelo Estado, enfrenta dificuldade para atrair investimentos.

Os russos também podem jogar no Tigre de Cristal, desde que mostrem seus passaportes e se registrem. Isso não caiu bem junto a sacerdotes e críticos que veem os cassinos como um substituto precário para um desenvolvimento econômico saudável.

Quem leu Dostoiévski conhece bem os problemas que os jogos de azar criam, disse Andrei Kalachinsky, um jornalista veterano de Vladivostok. A expansão da prostituição certamente criará empregos, mas de que tipo?

A Agência de Desenvolvimento Imobiliário de Primorye, órgão governamental responsável pela área, se recusou a dizer o que está sendo feito para combater casas ilegais de jogo ou explicar de que maneira o cassino se enquadra na estratégia de desenvolvimento regional.

Enquanto isso, projetos estrangeiros em Vladivostok se esvaziaram, entre eles dois hotéis Hyatt cinco estrelas que deveriam ter sido inaugurados cinco anos atrás, mas continuam em obras.

Quatro cassinos planejados por outras empresas, que já deveriam ter sido abertos, têm suas obras atrasadas. Terrenos vazios se espalham pela floresta. Recentemente, um tribunal russo cancelou o projeto de uma casa de jogos de azar porque as obras demoraram a decolar.

O cassino Tigre de Cristal, embora tenha enfrentado percalços como a prisão de um parceiro local de negócios, vai bem. Lawrence Ho, presidente do conselho da Ascent Summit, reconheceu que o ano teve lá seus desafios, mas acrescentou que está otimista. O grupo planeja investir mais US$ 500 milhões para construir um segundo hotel de luxo, um clube de golfe e salas de jogos adicionais, na mesma região.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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