Folha de S. Paulo


Falésias coloridas contrastam com mar azul e dunas brancas em Pipa, no RN

Diferentes línguas se cruzam no balcão da lanchonete onde trabalha Carmem Lúcia da Silva, a Carminha.

O falar dos estrangeiros se mistura sem cerimônia à diversidade de sotaques dos brasileiros. É ali, bem ao lado do seu comércio, o ponto de partida e chegada das vans que percorrem as linhas praianas Tibau do Sul-Pipa e Pipa-Sibaúma, por exemplo.

O olhar atento da moça de 22 anos registra com alguma desconfiança a agitação que faz a fama da praia entre tantos gringos e brasucas.

Sorridente e comunicativa, Carminha também é crítica: "Aqui em Pipa tudo pode. É liberal demais, com controle de menos", diz ela. Entre um aceno e outro a quem passa, relaciona os problemas advindos da permissividade a que se tinha referido.

"Construção desordenada, lixo acumulado em muitos cantos, caos na ruazinha principal, onde pedestres se equilibram em calçadas esburacadas, desviando-se de carros, caminhões e motos conduzidas por gente sem capacete. Ah, tudo isso sem falar na 'drogaiada' e no excesso de ambulantes", afirma.

Com o tempo e os problemas, essa babel à beira-mar vem perdendo a aura paradisíaca que a celebrizou nos anos 1980 entre os amantes do surfe, responsáveis por fixá-la no mapa das atrações turísticas. Mesmo assim, o cenário continua atraindo forasteiros, sempre encantados com as belezas naturais e o aconchego do vilarejo.

Falésias multicoloridas cobertas por vegetação de mata atlântica contrastam com dunas branquíssimas.

Com tanta generosidade da natureza, que ainda pôs ali piscinas naturais e mirantes, Pipa figura fácil no "top ten" das praias brasileiras.

Em 15 anos, o lugar atravessa seu quarto ciclo de "colonização estrangeira". No começo dos anos 2000, com a prosperidade da União Europeia, vieram os portugueses e logo depois os espanhóis.

Em seguida, a praia seria descoberta pelos escandinavos, que chegavam em voo charter, pousando em Natal, a cerca de 80 km de Pipa.

HOLA, QUÉ TAL?

Agora chegou a vez dos argentinos. Eles estão por toda parte: em lojas, restaurantes, bares, pousadas e passeios.

"De fato, eles são muitos, mas não sabemos quantos. Alguns entram pelo Recife; outros, por Natal", diz Beth Bauchwitz, secretária de Turismo de Tibau do Sul (onde fica Pipa), ela mesma nascida em Buenos Aires. Reconhece os problemas citados no começo desta reportagem e diz que há muito a fazer para que Pipa volte a ser "o paraíso que a gente conhecia".

Em viagem de férias por lá, o empresário Beto Siccardi, 40, da região de Córdoba, lembra que na Argentina só se fala daquele trecho ensolarado do litoral sul do Rio Grande do Norte. "Adoramos as praias, as paisagens, a comida, os passeios", empolga-se. Até mesmo o centrinho, como é chamada a avenida Baía dos Golfinhos, a mais movimentada de Pipa, por onde circulam nativos e turistas, lhe caiu no agrado.

Vendedora numa loja de roupas, a portenha Martinella Gonzalles, 22, foi parar em Pipa depois de uma passagem-relâmpago pela Rio-2016 –segundo ela, por causa da fama do local. Chegou e ficou.

Festeira, acha "cosmopolita e agitada a balada pipense", que costuma terminar com o colorido do raiar do sol. "Consigo conciliar trabalho com a vida e seus prazeres. Isto é um privilégio", diz ela, caprichando no português.

"E ainda posso me dar ao luxo de assistir ao espetáculo do pôr do sol a cada dia em uma praia diferente, pintada por uma paleta de cores fora do catálogo. Vou querer mais o que da vida, me diz?"

Arredores de Pipa


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