Folha de S. Paulo


Do Coliseu à Muralha, Obama exibiu lado turista em viagens presidenciais

Mergulhar nas águas cristalinas do oceano Pacífico, no atol de Midway? Feito. Passear entre as enigmáticas colunas de pedra de Stonehenge? Feito. Visitar o museu Bob Marley na Jamaica, as pirâmides do Egito e a Grande Muralha da China? Feito, feito e feito.

Ao que parece, percorrer o planeta no Air Force One –avião presidencial americano– ajuda a completar qualquer lista de turista.

O presidente Barack Obama dedicou a maior parte de seu tempo de viagem nos últimos oito anos a tarefas oficiais, incontáveis eventos de arrecadação de fundos, visitas de Estado a capitais estrangeiras, discursos para soldados norte-americanos, anúncios políticos e conferências intermináveis em salões de hotéis de todo o planeta.

Mas talvez mais do que qualquer de seus antecessores, Obama também aproveitou para se tornar um grande turista, reservando tempo para contemplar alguns dos principais destinos do planeta.

"Ele é um presidente com grande curiosidade intelectual", diz Jon Meacham, historiador da presidência norte-americana, que compara o interesse de Obama em visitar lugares turísticos famosos às viagens de Thomas Jefferson pela França entre 1784 e 1789, ainda que elas tenham acontecido antes que Jefferson fosse eleito presidente.

Nem todos os presidentes, porém, são conhecidos pelos interesses turísticos. George W. Bush não tinha muita paciência para visitar lugares famosos. Em 2002, passou apenas 30 minutos na Muralha da China. Dedicou o mesmo tempo ao Arquivo Nacional do Canadá, onde contemplou retratos de Winston Churchill e Franklin Roosevelt.

O presidente Bill Clinton, pelo que dizem pessoas próximas, se dispunha mais a paradas turísticas, mesmo que isso tornasse necessário realizá-las mais cedo ou mais tarde. Em uma visita a Madri,na Espanha, Clinton visitou o Prado, o museu nacional de arte do país, às 23h.

George Bush pai viajava muito a trabalho, mas fazia menos turismo que Obama. Se lhe sobrava tempo, "ele organizava torneios improvisados de jogos com ferraduras", afirma Meacham, que recentemente concluiu uma biografia do primeiro Bush.

Os assessores de Obama dizem que o presidente insiste que eles marquem visitas a locais que lhe deem a oportunidade de fazer passeios. Quando foi a Roma visitar o papa, em 2014, fez uma excursão ao Coliseu, acompanhado por um guia italiano. Depois de quatro dias de negociações de paz no Oriente Médio, em 2013, fez turismo em Petra, na Jordânia, para conhecer ruínas de 2.000 anos.

Em 2014, ao final de uma uma conferência no País de Gales, a comitiva de Obama fez uma visita curta a Stonehenge, onde passeou a pé. Obama definiu o local como "espetacular" e como "especial", antes de dizer a jornalistas: "Mais um item que posso riscar da minha lista".

As viagens de Obama, porém, geraram críticas, especialmente por parte de republicanos, que questionam o valor dessas viagens e os custos delas para os contribuintes.

A Judicial Watch, organização conservadora de ação política, utilizou a Lei de Acesso à Informação e recorreu a processos judiciais para tentar obter informações sobre o custo dos passeios presidenciais. Ela afirma que as viagens de Obama, oficiais e pessoais, custaram cerca de US$ 80 milhões (R$ 257 milhões).

Assessores do presidente insistem que o turismo pessoal de Obama, em geral, serve a propósitos diplomáticos. O jantar romântico do casal Obama em um restaurante de Cuba, por exemplo, ajudou a cimentar a imagem de um novo relacionamento entre Washington e Havana, depois de décadas de inimizade.

Os compromissos da presidência, contudo, podem interferir com o turismo de Obama. O presidente teve de desistir de uma visita ao Taj Mahal, depois da morte do rei Abdullah, da Arábia Saudita, no começo de 2015.

"Ele ficou muito decepcionado por não visitar o Taj Mahal", disse Josh Earnest, secretário de imprensa da Casa Branca, depois da mudança de agenda presidencial na Índia. "Gostaria de poder prometer –e acho que o presidente gostaria que eu pudesse fazer isso– que ele terá oportunidade de visitar o Taj Mahal antes do final de sua presidência, mas não estou certo de que isso acontecerá."

Um dos itens mais importantes na lista do mandatário não deve ser riscado nesses meses que lhe restam de mandato: visitar a Antártica. Assessores dizem que há anos ele deseja visitar a região, mas não tem viagens para lá marcadas em sua agenda.

"Thomas Jefferson tinha um incrível senso de curiosidade. Ele queria ser como que uma correia transportadora de cultura", afirma Meacham. "Ele via o turismo, imagino, como o atual presidente Obama: uma forma de ampliar seu espectro de experiências e aprender o máximo possível."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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