Folha de S. Paulo


Rios e geleiras são ponto alto de parte pouco explorada da Patagônia chilena

No norte da Patagônia chilena, um incêndio provocado por desbravadores nos anos 1920 deixou marcas que podem ser vistas até hoje. Troncos queimados, pedaços de madeira preta espalhados pelos campos. O fogo, usado para desmatar a área e permitir a criação de gado, durou 20 anos –manteve-se nas raízes das plantas, sob a neve, despertando quando o gelo derretia.

Ao percorrer as estradas, os vestígios da queimada são elementos da paisagem de extensos campos, uma ou outra casinha colorida, cercas demarcando o espaço de ovelhas, montanhas ao fundo e, mais adentro, cachoeiras, lagos e geleiras.

Na região de Aysén há seis vezes mais ovelhas que pessoas, dizem. Sua criação é a mais importante atividade da economia local, seguida do gado e só então do turismo.

"Esta é a região mais bonita e menos explorada do Chile. Obrigada por terem escolhido vir para cá", diz o diretor do grupo Aires de la Patagonia, Jorge Velasquez.

Viver nesse pedaço isolado tem suas particularidades. "Nós da Patagônia não nos sentimos chilenos ou argentinos, apenas patagões", diz Marisol Fernandes, integrante do grupo.

A cultura está muito arraigada, os jovens dançam chamamé até na discoteca –a dança folclórica, também existente na Argentina e no sul do Brasil, tem força na Patagônia chilena. Executada com bombachas e saias rodadas, é dançada a dois e marcada pelo ritmo, inclusive com sapateado.

Brasileiros não são vistos na região, que geralmente é visitada por chilenos de outras partes do país. "Eu tinha o sonho de conhecer a lagoa San Rafael, mas não imaginava quantas belezas naturais veria aqui", diz Gladys Salinas, funcionária pública.

Nos rios, lagos e lagoas estão os principais atrativos de Aysén –a Patagônia tem a terceira maior reserva de água doce do mundo. No Parque Nacional de San Rafael, reconhecido pela Unesco como reserva da biosfera por sua biodiversidade, fica a lagoa de mesmo nome. Por ela, se navega em catamarã até chegar a uma grande e azulada geleira, da qual só se pode ver um terço, já que sob a água está sua maior parte.

Nas paredes que circundam a geleira, marcas deixadas pelo homem apontam os limites antigos do gelo. Em 20 anos, é chocante a mudança de cenário, causada pelo derretimento do cenário.

Não tão lentamente, o clima muda na região. Em dezembro, pleno verão, o sol invade o saguão do aeroporto de Coyhaique pela janela. Uma senhora, mala em punho, observa a luz e diz "Antes, nevava de março a dezembro. O tempo era chuvoso e ventava muito. Não tínhamos esse sol."

Nas geleiras da Patagônia chilena, torcemos para que o tempo esteja nublado. Assim, a luz do sol não é refletida nos blocos de gelo, o que facilita as fotos dos turistas. É bom também não ter vento, que impede a saída em pequenos botes para avistar de perto os paredões azulados. Roupas quentes e impermeáveis são essenciais.

É só se aproximar do gelo que câmeras se acumulam para registrar a paisagem. Famílias se dividem em pequenos botes para ver o cenário –mas não tão perto, já que o gelo se quebra o tempo todo, os pedaços caem na água e ondas mais fortes se formam.

No Parque Nacional Queulat, a 220 quilômetros de Puerto Chacabuco, é possível ver uma geleira entre montanhas a partir do mirante: o ventisquero, de onde saem duas quedas-d'água alimentadas pelo derretimento da neve.

Um passeio de barco pela esverdeada lagoa leva a 600 metros do glaciar (o ângulo, no entanto, pode dificultar a visão completa da paisagem).

A jornalista viajou a convite do hotel Loberías del Sur


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