Folha de S. Paulo


Turismo no Alentejo encanta com vinhos, castelos e igreja de ossos

É ermo o cenário no Alentejo, região ao centro-sul de Portugal, ligada à produção de vinho desde a ocupação romana (em 200 a.C.).

Hoje, o lugar abriga mais de 250 produtores –70 mais organizados, com visitas para turistas e, em alguns casos, hotéis. Agosto, quando as vinhas estão carregadas, é o mês mais visado. Dá para acompanhar a vindima, como se chama a colheita, observar a pisa das uvas e até participar do processo.

As principais cidades são Beja, Santarém e Évora. Declarada Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco em 1986, esta é a mais populosa e serve de base aos turistas.

Para chegar lá, normalmente se desembarca em Lisboa. A partir daí, ônibus, trem ou carro alugado, em uma viagem que começa com a travessia do rio Tejo pela bela ponte Vasco da Gama. No curso de 132 quilômetros de viagem, uma boa amostra do espírito alentejano, em que o ambiente urbano passa a dar lugar aos temas campestres.

Na região portuguesa com mais incidência solar durante o ano –por isso, abrigo de casas de veraneio de muitos lisboetas–, ouve-se o badalo de sinos de igrejas contíguas a castelos medievais. A vegetação é rala e pontuada por oliveiras e árvores das quais se extrai a cortiça (o país é o maior produtor mundial).

Cerca de 50 mil pessoas vivem na cidade, parte delas ligadas à Universidade de Évora. Brasileiros são o terceiro público visitante, e o vinho não é o único porquê. A cidade é tida como uma versão lusa de Stonehenge (monumento de pedra do Reino Unido), com ruínas e aquedutos milenares, além de muitos conventos e igrejas.

A de São Francisco abriga a capela dos Ossos, construída com restos humanos no século 17 por monges que tomaram inspiração na transitoriedade da vida. É célebre a inscrição à entrada: "Nós ossos que aqui estamos pelos vossos esperamos".

Nos arredores, no subdistrito de Reguengos de Monsaraz, há um sítio histórico onde fica um dos principais castelos que escudavam os lusitanos. De cima de suas torres, a vista alcança a fronteira com a Espanha.

A cidade e seus arredores são fartos em opções para repousar, de hotéis (vale citar o M'ar de Ar Aqueduto ) a pousadinhas mais simples, passando por hospedagens em vinícolas.

CASTAS ÚNICAS

Nada no Alentejo chama mais a atenção do que a conexão com propriedades vinícolas (as quintas e as herdades). Alguns rótulos são conhecidos de brasileiros, como o Pêra-Manca –trazido nas caravelas de Pedro Álvares Cabral, foi usado para celebrar a primeira missa no Brasil, segundo a lenda tornada slogan pela Adega Cartuxa.

Outros, como os do jovem produtor Tiago Cabaço, 40, dono de uma adega de arquitetura moderna, ganham espaço em um processo mais amplo: cada vez mais busca-se vinhos acessíveis, voltados não só a paladares iniciados.

"Antigamente se valorizava o vinho que, como se diz, 'quase se come', de tão forte", diz Luis Duarte, 50, enólogo da Herdade dos Grous. "Hoje, a busca é pelo elegante."

Países produtores miram mercados como o norte da África, a Oceania e o Brasil, onde a margem de crescimento é enorme –a título de comparação, os portugueses bebem 42 litros de vinho ao ano, contra menos de 1 litro dos brasileiros.

Nesse contexto, dois fatores explicam o potencial do Alentejo, na avaliação da enóloga espanhola Susana Esteban, 46. Um é a diversidade climática: poucas distâncias separam microclimas distintos, de montanhas frias a planícies quentes. O outro é a pluralidade de castas. Um mesmo produtor cria várias espécies de uvas e delas obtém misturas diversas. "A mescla vem da própria vinha; isso faz com que a bebida seja única."

Susana sabe disso por experiência própria. Procurou por anos um exemplar de uma casta de que ouvira falar para os vinhos que produz em escala artesanal (susanaesteban.com ). Foi encontrá-lo no Facebook: "Publiquei uma foto da planta e um conhecido disse que vira igual na quinta da avó. Era verdade".

Veja opções de pacotes para conhecer vinícolas em Portugal.

O jornalista viajou a convite da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana


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