Folha de S. Paulo


Roteiro por destilarias na Escócia permite entender mística do uísque

Gustavo Simon/Folhapress
Turismo 12.05.2016 - Sala da Scotch Whisky Experience, em Edimburgo, que expõe 3.384 garrafas da bebida, a maior coleção do mundo. (Foto: Gustavo Simon/Folhapress)
Sala da Scotch Whisky Experience, em Edimburgo, que expõe a maior coleção de garrafas do mundo

Se a Escócia tem como item do imaginário turístico o uísque, pode-se dizer, sem exageros, que os perfumes de cada passo da fabricação da bebida nacional perpassam o ar das cercanias das 115 destilarias existentes no país.

E dedicar-se a explorar esses aromas mais de perto, no copo, ajuda a entender como e por que o "scotch" virou referência nesse universo.

Para sorte dos turistas dispostos à aventura etílica, as destilarias são atração popular na Escócia (tanto quanto castelos e lojas de artigos com "tartan", a tradicional estampa xadrez): cerca de 40 estão abertas para tours e visitas.

Percorrer as estradas entre uma e outra região produtora configura atração à parte: cidadelas de ar rural, lagos exuberantes e campos verdinhos em relevo complexo, a desafiar a ideia de neblina e tédio do viajante desavisado.

Cada região carrega suas particularidades no copo. Highlands é a maior, em termos territoriais, e fabrica uísques encorpados, mas que podem variar de acordo com a sub-região. Speyside, a mais numerosa (metade das destilarias do país fica aqui), tem bebidas mais elegantes, florais. Islay, ao sul, fia-se nos uísques ricos em notas defumadas. De Lowlands saem rótulos mais leves e secos.

'MASTER BLENDER'

Para quem começa a viagem pela capital, Edimburgo, parada óbvia é o museu Scotch Whisky Experience (de £ 14,50 a £ 65, R$ 74 a R$ 332).

A visita pode envolver, além do batido tour "em 3D" a bordo de um tonel gigante a fazer as vezes de trenzinho, uma aula de degustação e a visita à maior coleção particular de garrafas da bebida (3.384, incluindo bom número de raridades), amealhada pelo brasileiro Claive Vidiz.

É longe da capital, no entanto, que estão os tours mais legais –nas próprias destilarias, que mostram, de perto, o processo da fabricação.

Ele é sempre mais ou menos o mesmo, mas há diferenças pontuais que, conforme se compreende o universo, se tornam mais evidentes.

As marcas podem usar, por exemplo, alambiques de formas variadas, para obter uísques mais ou menos encorpados. A Macallan, em Aberlour, tem uma rede exclusiva de produtores de malte, para maior controle de qualidade, espécie de obsessão da marca (outra curiosidade: na propriedade é possível ver a casa que estampa o rótulo).

Também vale seguir viagem para desbravar marcas bem populares (a Cardhu, em Aberlour, produz a Johnnie Walker; a Glenfiddich fica em Dufftown) ou as mais diminutas, que não raro só podem ser compradas na região em que são produzidas.

Os mais frugais vilarejos escondem uísques valiosos: uma das mais antigas destilarias escocesas (de 1797), a Glen Garioch está em Oldmeldrum, povoado de 2.000 habitantes.

E algumas marcas oferecem experiências além do passo a passo. Em Crieff, na sede da Famous Grouse –onde hoje se produz o potente Glenturret, vendido apenas na Escócia–, a Folha fez uma sessão de "blending" após conhecer a destilaria (e a estátua de Towser, gato que detém o recorde de ter caçado ali mais de 28 mil ratos –é tradição na indústria criar felinos com esse propósito).

A experiência (£ 60, R$ 305) pretende explorar com mais propriedade a função do "master blender", sujeito que zela pela identidade sensorial de cada marca de uísque (a ponto de, por vezes, estampar sua assinatura nos rótulos).

O turista, então, se senta com amostras à frente –com mais ou menos notas de baunilha, frutadas, defumadas etc.– e cria o próprio uísque (e o rótulo da garrafinha a que tem direito).

O jornalista viajou a convite da importadora Aurora

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UÍSQUE PASSO A PASSO

  • MALTEAÇÃO Os grãos são maltados: umedecidos para estimular a germinação, que é interrompida com secagem em um forno. Para o single malt, o único grão maltado permitido é a cevada; para o bourbon, é o milho
  • 'MASHING' O grão seco e moído ('grist') passa por água quente para cozinhar e formar um mosto, de modo que o açúcar seja liberado e possa fermentar
  • FERMENTAÇÃO Ao mosto resfriado são adicionadas leveduras, que vão fermentá-lo por cerca de dois dias e levar à produção de álcool
  • DESTILAÇÃO O composto é, então, destilado duas vezes em sequência, sempre em alambiques de cobre, com formatos distintos. Na segunda destilação, o começo e o final do líquido são descartados; só o 'coração' será transformado em uísque
  • MATURAÇÃO A bebida destilada é, então, envelhecida. Para o legítimo 'scotch', o processo deve durar ao menos três anos e ser feito em barris de carvalho geralmente já usados (para envelhecer jerez ou bourbon, por exemplo); para o bourbon, a lei diz que a barrica deve ser virgem

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