Folha de S. Paulo


Às vésperas das visitas de Obama e dos Stones, veja um roteiro por Cuba

"Respeitem os limites de velocidade e, principalmente, nunca deem carona.

Essas foram as advertências que Stally, a dona do apartamento onde a Folha se hospedou em Havana, deu pouco antes de pegarmos a estrada.

O prédio de Stally fica no Vedado, bairro perto do centro, aonde se chega rapidinho com as "lotações", mais baratas e charmosas que táxis comuns –elas, afinal, usam carrões americanos dos anos 1950; não se perde mais do que cinco minutos esperando por um Oldsmobile ou um Buick remendado, e dá até para se dar ao luxo de escolher a cor da relíquia a abordar.

Há anos Stally vem reformando a casa para receber hóspedes. É uma das atividades dos chamados "cuentapropistas", cubanos que têm negócios próprios. Ela já montou quatro suítes com ar-condicionado, que vivem lotadas –principalmente por europeus do norte.

Essas hospedagens alternativas são bem mais simpáticas e em conta que os bons hotéis (que vivem lotados, especialmente os da parte histórica de Havana, e costumam ter preços internacionais com qualidade não tão internacional assim).

Volta à ilha

'EN LA RUTA'

A capital cubana foi o ponto de partida de uma viagem que, em dez dias, percorreria mais de 900 quilômetros pelas estradas locais, com paradas em outras seis cidades.

A missão se revelaria ligeiramente espinhosa logo na saída de Havana em direção ao Oriente –como alguns ainda chamam o lado da ilha que fica para o... oriente.

"É só seguir o Malecón [a principal avenida à beira-mar da cidade] direto, direto", instruíra Stally, a anfitriã.

Como previsto, a falta de sinalização nas estradas cubanas (alardeada por outros turistas e blogs de viagem) fez com que a reportagem logo se visse no caminho da ocidentalíssima Pinar del Río.

Foram necessários uns 50 quilômetros de idas e vindas para enfim encontrar a Autopista Nacional 1, que, em outros 367 quilômetros, levaria ao cayo Las Brujas.

Os "cayos", que existem no litoral norte e sul de Cuba, são como penínsulas que abrigam os resorts chiques, tão procurados pelos turistas que querem conhecer o mar do Caribe.

Apesar de estarem na orla, eles são acessados por estradas. Com dezenas de quilômetros de extensão, as chamadas "pedrapléns" são como diques sobre o mar, cortadas de quando em quando por pontes que permitem a passagem da água.

Nos cerca de 30 quilômetros até o cayo Las Brujas, são mais de 20 pontes. E a sensação de dirigir tendo o azul do mar caribenho aos dois lados é incrível.

O Las Brujas é uma espécie de "primo pobre" dos cayos Santa Maria e Coco, seus vizinhos mais famosos –e bem mais caros. Duas noites em um chalé com sala, com café da manhã, custaram cerca de US$ 150 (R$ 555); em Santa Maria, reserva parecida pode custar quase o dobro.

As águas transparentes, calmas e tépidas do local são um atrativo especial para mergulhadores. Aos aficionados, há saídas para passeios pela região na marina próxima ao resort.

Deixando o cayo e voltando à "ilha-mãe", a viagem seguiria até Santa Clara, a primeira grande cidade a ser tomada pelos revolucionários, em dezembro de 1958.

Ali fica o enorme mausoléu onde estão os restos mortais do guerrilheiro Ernesto Che Guevara (1928-1967) e de outros 16 companheiros mortos com ele na Bolívia –em 1997, Cuba recuperou e "importou" os corpos.

A visita ao memorial, em um ambiente com um quê de sacrossanto, é imperdível. Além de uma estátua de Che, vista a distância nos arredores, há fotos, armas e cartas do guerrilheiro.

Mas, fora isso –e também o monumento ao trem blindado, que representa uma vitória importante na tomada da cidade–, Santa Clara não tem muito a oferecer.

Era hora, então, de partir em direção ao litoral sul da ilha.

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Estradas são planas e permitem conhecer o país mais de perto

A primeira coisa que chama a atenção quando se viaja de carro por Cuba –fora o fato de que as estradas não são tão ruins como se costuma advertir– é o relevo.

Se você pensa numa ilha perdida no mar, talvez imagine algo como Ilhabela, cheia de picos e montanhas. Pois grande parte de Cuba é plana a fazer inveja ao Uruguai.

Por horas viaja-se sem enfrentar uma única ladeira –o carro 1.3 chinês, alugado pela Folha a cerca de US$ 50 (R$ 185) por dia, agradecia.

As autopistas dão chance de ver Cuba de perto. Pessoas consertando carros e carroças no meio da pista (as estradas menores não têm acostamento) são comuns. Com pouco tráfego, porém, não chegam a ser um empecilho.

E a educação choca o turista capitalista sem tempo a perder: ninguém mete a mão na buzina enquanto o pangaré se esforça para vencer seus obstáculos.

CARONAS, SIM

Apesar da advertência de Stally, a anfitriã da reportagem em Havana, muitas vezes demos carona. Como deixaríamos Gleiki, a camareira do hotel no cayo Las Brujas, esperando três horas por seu "guagua" (ônibus)?

Em sete dias, em troca do favor a reportagem ganhou frutas típicas –o esquisito mamey e o pequeno mamoncillo– e a paçoca mais saborosa (e gordurosa) que já provou.

Uma das companhias, uma senhora, não se vexou em nos pedir "um creminho": "¿Tengo la piel muy clara, sabes? Y con este sol...". Mas estávamos prevenidos, com uma sacola cheia de badulaques –e até camisas de futebol (do Oeste, do Penapolense, do Comercial de Ribeirão Preto...) que um amigo brasileiro enviou para os "hermanos".

Cristiane Silvestre/Folhapress
Cubanos com camisas de futebol do Oeste de Itápolis e do Comercial de Ribeirão Preto
Cubanos em barraca de frutas com as camisas do Oeste de Itápolis e do Comercial de Ribeirão Preto

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O QUE SABER SOBRE CUBA

MOEDA
A ilha tem duas moedas: o peso cubano (CUP) e o peso convertível (CUC). Esta última, de cotação equiparada à do dólar, é exclusiva para turistas e estrangeiros; por ter câmbio artificial, ela só pode ser adquirida no país

FUSO HORÁRIO
-1h em relação a Brasília

VISTO
Brasileiros precisam de visto (R$ 65 pessoalmente ou R$ 173 por correspondência; cubadiplomatica.cu ); para obtê-lo, é preciso ter passagens e reservas de hotéis


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