Folha de S. Paulo


Rota pelo sul de Cuba mistura marcos da revolução de 1959 a clima boêmio

No sul de Cuba, o principal destino turístico é Trinidad, uma espécie de Paraty, também à beira-mar. Mas, no roteiro percorrido, havia antes Sancti Spíritus.

A igreja matriz da cidade é uma das mais antigas do país. E a maior atração local é a ponte no rio Yayabo, de 1815.

Para observá-la demoradamente, pode-se tomar alguns mojitos na varanda do bar vizinho. O proprietário do local conta que já tentou mais de uma vez sair do país. Na última, foi pego na Colômbia com um passaporte falsificado.

"Alguém me dedurou. Não faz mal, logo tento de novo, e uma hora consigo", contou com ar despreocupado. "Este é um país de loucos", acrescentou, repetindo a frase ouvida mais de uma vez na ilha.

Seguindo viagem, havia outra boa surpresa antes de chegar a Trinidad: o vale dos engenhos. Na região, formada pelos vales de três rios, funcionaram no auge da produção açucareira, entre os séculos 18 e 19, cerca de 50 engenhos de cana, abastecidos pelas mãos de 30 mil escravos.

A família Iznaga foi uma das mais ricas. Sua linda mansão, hoje restaurante e minimuseu, mostra que houve ali uma época de ouro.

No entorno, artesãs vendem toalhas de linho com rendas feitas à mão. Ao lado da casa-grande fica a torre que o senhor de engenho ergueu para que um capanga vigiasse os escravos e avistasse possíveis invasores –o mar está a passos dali.

Conta-se que, ao perceber que se aproximava o fim da escravidão, o senhor Iznaga mandou cunhar moedas que só seriam usadas na propriedade. Com os negros libertados (em 1886), ele passou a usar a própria moeda para pagar os ex-escravos, que só podiam gastá-la no armazém da fazenda –ou seja...

Trinidad, uma das cidades mais bem preservadas de Cuba, fica a poucos quilômetros do vale dos engenhos.

O casario colonial, as ruas estreitas de pedra, as grades de ferro nas janelas, os prédios históricos e a agitação atraem turistas o ano todo. À noite, o espaço ao lado da igreja da Santíssima Trindade se transforma em baile a céu aberto.

Americanas, europeias e outras lourices, boquiabertas, observam a ginga dos cubanos (e são por eles convidadas a entrar na dança), que requebram ao som de maracas, trompetes e tambores madrugada adentro.

Volta à ilha

MEMÓRIAS DO LEVANTE

No retorno a Havana, escala em Cienfuegos, a 84 quilômetros de Trinidad. A "pérola do sul", como é conhecida, foi palco de um levante militar, em 5 de setembro de 1957 –duramente sufocado pelo ditador Fulgencio Batista–, que serviria de estímulo aos revolucionários da sierra Maestra nos anos seguintes.

Por toda a cidade há homenagens ao levante, reencenado anualmente. Mas o nome da cidade não tem relação com Camilo Cienfuegos, um dos três mosqueteiros da revolução (ao lado de Che e Fidel Castro). É homenagem ao espanhol José María Cienfuegos Jovellanos, governador da colônia de 1816 a 1819.

Na praça principal, durante todo o dia, uma imagem simbólica. Excitados, grupos de jovens se divertiam conversando com parentes e amigos pela recém-disponível internet.

De volta à capital, era tempo de visitar o memorial do Granma, famigerado iate por onde começou a revolução.

A lancha, construída para abrigar 12 pessoas e da qual, amontoados, 80 revolucionários desembarcaram em Cuba após partirem do México, só pode ser vista a distância.

Ali, ao lado da relíquia intocável, protegida por uma redoma de vidro, chegavam ao fim os 963 quilômetros de viagem. (Luiz Antonio del Tedesco)

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Compositor teve razão ao falar do calor tropical

Tinha razão José Dolores Quiñones (1918-2008) quando compôs "Mi Cocodrilo Verde" e de Cuba citou a "majestuosa luna y tu sol tropical" –leia letra na capa e tradução ao lado.

No verão (do hemisfério Norte), termômetros chegam a atingir os 41°C –o ar-condicionado do carro pena igualmente. Sob um sol realmente tropical, é por vezes providencial refrescar as forças no hotel entre 12h e 14h antes de passear.

Os hotéis, vale dizer, sempre disponibilizam sombrinhas. Em Havana, elas dão um colorido charmoso às ruas, com motivos que vão de reproduções de obras gregas a imagens estilizadas de personagens da Revolução, como o Che.

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O QUE SABER SOBRE CUBA

MOEDA
A ilha tem duas moedas: o peso cubano (CUP) e o peso convertível (CUC). Esta última, de cotação equiparada à do dólar, é exclusiva para turistas e estrangeiros; por ter câmbio artificial, ela só pode ser adquirida no país

FUSO HORÁRIO
-1h em relação a Brasília

VISTO
Brasileiros precisam de visto (R$ 65 pessoalmente ou R$ 173 por correspondência; cubadiplomatica.cu ); para obtê-lo, é preciso ter passagens e reservas de hotéis


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