Folha de S. Paulo


Fazer vídeo para YouTube é como terapia em grupo, diz Galisteu

Adriane Galisteu, João Gordo e Rafael Cortez são exemplos de pessoas que chegaram à fama com a televisão e agora investem em canais no YouTube. Eles se reuniram no youPIX CON, que ocorreu na quarta (28), um evento sobre cultura digital. A fama televisiva surtiu efeito e o painel que os reuniu foi um dos que mais atraiu o público na edição deste ano.

Adriane diz que se sente mais livre na internet. "O modo de enxergar é o oposto da TV, lá tem que fazer de novo se errar, já na internet você está lá de corpo e alma, errar faz parte, fazer as gravações do canal é como um momento de lazer, de liberdade, é como uma terapia em grupo."

Criadores digitais
Produção de conteúdo na internet
Pablo Peixoto, fundador do canal de entretenimento e cultura pop Qu4tro Coisas

Acostumada a falar para um público mais velho do que o que domina a audiência on-line, conquistar os adolescentes foi uma preocupação de Adriane ao lançar seu canal, hoje com mais de 100 mil inscritos, em que faz comentários sobre assuntos cotidianos.

"Achei que seria um público específico bem jovem, que eu teria que conquistar, me preocupava por começar do zero, mas ando na rua e tem gente mais velha que eu que me para e diz que assiste, fazem sugestões, esse público também está on-line", afirma ela.

Para Cortez, que lançou no início deste ano o canal Love Treta, em que dá conselhos sobre relacionamentos com humor e já conquistou mais de 50 mil inscritos, a demora a entrar no YouTube se deve ao fato de que até agora sentia-se completamente à vontade na TV. "Fiz muita coisa legal, então minhas necessidades criativas estavam sendo supridas, tinha muita liberdade. Hoje a TV não é mais tão plena, então recorremos à internet para suprir essas necessidades".

Os três continuam na TV —João Gordo com o programa "Eletro Gordo" no Canal Brasil, Rafael Cortez no "Vídeo Show", da Globo, e Adriane Galisteu no "Face a Face", da TV BandNews—, e não pretendem abrir mão de uma coisa por outra.

Cortez conta que se frustra por não atingir o público teen, "eles são os agitadores do YouTube, se cair nas graças da molecada, tem meio caminho andado", mas considera manter esse público um desafio maior do que conquistá-lo. "Adolescente quando cresce renega o que gostava, a dificuldade maior é se tornar relevante para o público adulto, pois essa molecada vai crescer".

João Gordo também fala para os adultos em seu canal, Panelaço, lançado em 2014, hoje com mais de 150 mil inscritos. "Fodam-se os teen, velho fala é pra velho, as crianças não se interessam", diz. Nos programas semanais no YouTube, ele entrevista os convidados enquanto cozinha. Por lá, já passaram nomes como os músicos Mano Brown, Criolo, Andreas Kisser e MC Guimê.

João Gordo e Mano Brown no Panelaço

LIBERDADE

Apesar de o YouTube oferecer mais liberdade, ainda há responsabilidades envolvidas. Cortez conta que o canal não levar seu nome foi uma decisão estratégica. "Pensei muito sobre desvincular o nome porque, se fosse um fracasso, o tombo seria maior. E não da pra contar só com o nome, se der errado comigo, o canal pode seguir com outro."

Adriane conta com a orientação da Endemol Shine, produtora do canal, mas é ela que decide sobre os temas abordados. "Eu ouço, mas deveria ouvir mais. Por exemplo, fiz um vídeo sobre o caso do príncipe Charles e foi um fiasco. A Endemol não queria fazer, mas fiz mesmo assim, a gente erra e acerta, é a vida", conta.

Quanto às referências, Adriane prefere não assistir a outros canais. "A tendência do ser humano é copiar o que está dando certo, então é melhor não olhar pra fazer do meu jeito, queria encontrar meu tom". Gordo também não tem inspirações no YouTube. "Não assisto nada, não conheço ninguém, uso YouTube pra ver desenho antigo, sou geração TV".

Já Regina Volpato, outra personalidade da TV a investir no YouTube, está fora da televisão há três anos, e não tem pretensão de voltar.

"Estava sem motivação para exercer minha profissão. Me reconciliei com meu ofício ao produzir conteúdo para o YouTube, não faço o canal mirando a TV", conta Regina. A jornalista ficou famosa como apresentadora do programa "Casos de Família", no SBT, entre 2004 e 2009. Em 2011 entrou na RedeTV!, de onde saiu em 2013. Cinco meses atrás estreou no YouTube um canal que leva seu nome e tem mais de 10 mil inscritos.

Para Regina, a proximidade com os inscritos é o ponto alto do YouTube. Ela conta que não fez preparação alguma, e ainda está aprendendo a trabalhar no novo meio. A liberdade na escolha dos entrevistados e dos temas, diferente da mídia convencional, é outra vantagem apontada por ela.

CAMINHO INVERSO

Intitulado "O YouTube invade a TV", outro painel do youPIX CON tratou de quem fez o caminho inverso. Para discutir o assunto foram reunidos os youtubers Malena Nunes, Lucas Lira, Pyong Lee, Taty Ferreira, Isadora Becker, Gusta Stockler, Daniel Saboya e Taciele Alcolea, protagonistas do programa "Entubados", primeiro reality-show do tipo na televisão mundial, que estreou em agosto no canal por assinatura Sony.

Se antes eram os youtubers que almejavam estar na televisão, hoje parece estar acontecendo o contrário. Malena, que tem mais de 2,5 milhões de inscritos em seu canal, conta que a mídia tradicional começou a olhar para youtubers como uma forma de chegar ao público mais jovem, que é muito grande na plataforma de vídeos.

Para Taty, do canal Acidez Feminina, o principal diferencial do programa da Sony foi permitir que os youtubers tivessem liberdade para criar seu próprio conteúdo. Segundo ela, a mídia tradicional falha ao tentar manter a audiência trazida pelos influenciadores digitais por tentar encaixá-los em um formato antigo. "A maior dificuldade da TV é não estar aberta, chama um youtuber, mas dá um programa fechado, assim não adianta."

Pyong Lee, dono de um canal homônimo, acredita que esse também seja o problema de personalidades do meio televisivo que migram para o YouTube. "Muitos famosos vão pro YouTube e não dão certo porque só mudam o meio, o formato é o mesmo, mas isso não funciona."


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