Folha de S. Paulo


Especialistas em mercado digital indicam erros para não repetir

Com o mercado digital mudando constantemente, cometer erros é fácil. Evitá-los, nem tanto. Por isso, o tema será abordado no youPIX CON, evento sobre a indústria de conteúdo digital que ocorre na quarta-feira (28).

Não será apenas uma palestra, mas "Think Groups". A tradução do termo para o português é "grupos para pensar". No evento, representantes de marcas, do mercado publicitário e produtores de conteúdo se reunirão para selecionar os cinco principais erros a não serem repetidos.

Criadores digitais
Produção de conteúdo na internet
Pablo Peixoto, fundador do canal de entretenimento e cultura pop Qu4tro Coisas

A Folha conversou com a consultora de inovação em comunicação Gica Yabu, 31, e com o consultor e professor de estratégia e conteúdo digital Edney Souza, 40, sobre falhas de comunicação no meio digital.

Para Gica, já havia muito erro no meio offline. A diferença é que agora as discussões que não passavam da mesa de bar ganham outra proporção —às vezes exagerada. "Toda marca precisa ficar atenta, pois, quando você pisa no calo de alguém, nem sempre a reação é proporcional ao erro".

INFLUENCIADORES

Um erro básico em marketing digital que muitas empresas ainda cometem é não trabalhar com influenciadores. Mas fazer isso de forma equivocada talvez seja pior ainda. "É uma forma rápida de agregar valor, mas tem que saber usar", conta Souza.

Ele explica que, ao apostar somente no influenciador, as marcas perdem uma das principais vantagens que o ambiente digital oferece, que é a possibilidade de criar seu próprio espaço. "Quando a empresa não desenvolve conteúdo próprio, não tem presença forte, corre um risco muito grande de ter sua marca excessivamente atrelada ao influenciador. Se ele cometer um deslize no futuro, pode refletir fortemente na marca."

Um exemplo disso é o caso do nadador americano Ryan Lochte, que mentiu sobre um assalto durante os Jogos Olímpicos Rio 2016. Logo que o caso foi noticiado e foi provado que ele havia mentido, seus principais patrocinadores cancelaram os contratos que tinham com ele. A maior parte das marcas investia em outros patrocínios, então suas crises de imagem foram solucionáveis, mas se estivessem mais fortemente apoiadas no nadador teriam perdido muito.

No outro extremo, quando as marcas não confiam no influenciador, elas acabam desperdiçando bons especialistas. "É gente que saiu do zero e de repente tem uma audiência na casa dos milhões. Alguém assim entende muito bem do que faz, esse talvez seja o maior valor deles", explica Souza.

Para o professor, isso acontece principalmente porque empresas e indústria ainda tratam o meio digital como se fosse a televisão. Se na televisão, os influenciadores são apenas atores ou apresentadores, os youtubers são personagens, apresentadores, roteiristas, produtores e diretores de seus canais, um potencial criativo frequentemente desprezado.

DIGITAL OFFLINE

Ao confundir digital e offline ainda há o risco de importar problemas de um para outro. Quando criam perfis em redes sociais em que a comunicação é imediata, as empresas devem estar cientes de que o cliente passará a cobrar por mais agilidade no atendimento.

Gica conta que muitas marcas se inserem em meios novos, mas frustram os clientes ao seguir práticas antigas. "Pra conseguir responder em tempo real, como deve ser a comunicação em redes sociais, é precisar contratar muita gente, então as marcas frequentemente não respondem ou prometem retorno em 30 dias úteis —quando você fala com um amigo no Facebook ele nunca diz que dará retorno em 30 dias úteis".

Outro problema importado do meio offline é recorrer apenas aos influenciadores mais famosos. Se algum tempo atrás, para onde olhasse, era possível ver Luciano Huck anunciando um produto, hoje o mesmo acontece com Neymar e youtubers como Kéfera Buchmann, do canal 5incominutos.

Souza explica que, se um influenciador faz campanha para muitas marcas, acaba não ajudando marca nenhuma. "Pontualmente pode fazer um boom, mas depois se esquece qual marca ele estava apoiando", diz. Recorrer apenas aos mais famosos é também ignorar a comunicação segmentada que a web possibilita.

Massificar a comunicação, como acontece em mídias de pouca segmentação, é como atingir um buraco de rato com bala de canhão. Antes era assim porque só tinha o canhão, agora tem um arsenal inteiro.

Empresas nativas digitais, como o Netflix, são apontadas por Souza como modelos de uso de marketing segmentado. Um bom exemplo foi a campanha que contou com Inês Brasil para promover a série Orange is the new black, gastaram o mínimo para ter maior impacto.

FAÇA O QUE EU DIGO

Seja no meio que for, a comunicação tem que estar alinhada à prática. No entanto, Gica aponta que muitas marcas 'surfam na onda' de causas que estão em voga, sem realmente acreditar. Um exemplo disso, para os especialistas, foram duas campanhas recentes da rede de lojas C&A. Na primeira, a empresa promovia a ideia de que não há roupas específicas para homens e mulheres. Já na mais recente, a imagem de uma modelo plus size vinha acompanhada da frase "Sou gorda, sou sexy".

"Não adianta propaganda descoladinha se na loja os produtos ainda são separados por gênero, as roupas não são feitas em modelagens que vão servir em qualquer um, os vendedores ainda te olham estranho se você pegar uma peça do gênero que 'não é o seu'", argumenta Gica. Sobre a segunda campanha, Souza diz que "as pessoas que têm problemas reais pra encontrar peças do número delas continuaram não se sentindo representadas porque na prática essa dificuldade persiste".

Para a consultora, a solução seria que as empresas procurassem sua 'essência'. "Assim como as pessoas fazem terapia em busca de autoconhecimento, as marcas também precisam fazer esse trabalho, buscar sua verdade". Segundo ela, uma marca que só visa o lucro é como alguém que tem como único objetivo ficar rico. E se você não seria amigo de alguém interesseiro, porque seria cliente de uma marca assim?


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