Folha de S. Paulo


Bill Gates apoia solicitação do FBI para hackear iPhone de terrorista

REUTERS/Shannon Stapleton
Microsoft co-founder listens to a question during an interview in New York February 22, 2016. The Bill and Melinda Gates Foundation has turned its attention to the Zika virus outbreak, and its founders said the response to the crisis, which may be linked to devastating birth defects in South America, has been better than for the 2014 Ebola outbreak in Africa.REUTERS/Shannon Stapleton ORG XMIT: SHN111
Bill Gates, fundador da Microsoft, durante entrevista em Nova York nesta terça (23)

Bill Gates se dissociou do Vale do Silício no impasse entre a Apple e o governo dos Estados Unidos, afirmando que as empresas de tecnologia deveriam ser forçadas a cooperar com as autoridades em investigações sobre terrorismo.

O fundador da Microsoft discordou de Tim Cook, presidente-executivo da Apple, para quem a liminar obtida pelo governo –ordenando que a Apple ajude a desbloquear o iPhone do responsável por múltiplos homicídios em San Bernardino– significa a criação de uma "porta dos fundos" para acesso a aparelhos. Gates não considera que ela esteja estabelecendo um precedente mais amplo.

"Esse é um caso específico no qual o governo está solicitando acesso a informações. Não estão solicitando algo de geral, estão pedindo esse acesso em um caso específico", disse Gates ao "Financial Times".

"Não vejo diferença ante alguém ter direito a solicitar informações da companhia telefônica, ou solicitar dados bancários. Seria como se um banco amarrasse um laço de fita em torno de um drive e dissesse 'não me façam cortar essa fita, porque isso vai querer dizer que vou ter de cortá-la muitas outras vezes'".

A Apple se viu envolvida em uma guerra verbal com as autoridades dos Estados Unidos, na semana passada, depois que um juiz ordenou que a companhia desenvolva um software que permitiria que os investigadores do FBI destravem o acesso ao iPhone de Syed Rizwan Farook.

Cook definiu a liminar como exemplo "assustador" de "abuso de poder" pelo governo dos Estados Unidos, e afirmou que isso poderia estabelecer "um precedente perigoso que ameaçaria as liberdades civis de todos".

PONTOS DE VISTA

A postura de Gates o distancia do resto do setor de tecnologia, o que inclui a empresa que ele fundou. Satya Nadella, o presidente-executivo da Microsoft, não comentou publicamente sobre o assunto, mas um porta-voz da empresa sediada em Seattle apontou para um comunicado da organização Reform Government Surveillance [reforma da vigilância governamental], da qual ela é integrante, em oposição à liminar.

Executivos do Vale do Silício, entre os quais Mark Zuckerberg, fundador do Facebook; Jack Dorsey, fundador do Twitter; e Sundar Pichai, presidente-executivo do Google, expressaram apoio unânime a Cook.

Edward Snowden, que denunciou as operações de vigilância da Agência Nacional de Segurança (NSA) norte-americana, definiu esse duelo como "o mais importante caso da tecnologia em uma década". Mas James Comey, diretor do Serviço Federal de Investigações (FBI), insistiu em que o caso é "bastante estreito".

"Não queremos violar os dados cifrados de pessoa alguma ou criar uma chave mestra de acesso que poderia se espalhar pelo país", escreveu Comey em post do blog do FBI na noite de domingo (21).

Gates disse ao "Financial Times" que haveria benefícios de o governo poder impor tributação, deter crimes e investigar ameaças terroristas, mas acrescentou que é preciso haver regras sobre quando esse tipo de informação poderia ser obtido.

"Espero que tenhamos esse debate, para que salvaguardas sejam criadas e as pessoas não escolham –e isso será decidido país a país– dizer que é melhor que o governo não tenha acesso a esse tipo de informação", ele afirmou.

Gates falou durante o lançamento da carta anual de sua fundação de caridade, a Fundação Bill e Melinda Gates, na qual ele argumenta que um "milagre da energia" será necessário para levar eletricidade aos 20% da população mundial que no momento não dispõem dela, e ao mesmo tempo reduzir a zero as emissões de carbono.

"Vamos deixar que a ciência resolva essa (palavrão duplo)", ele disse, citando o personagem de Matt Damon no filme "Perdido em Marte". "Não sei quais são os palavrões."

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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