Folha de S. Paulo


Compartilhar post de violência infantil pode ser ilegal; saiba denunciar

Brian Jackson/Fotolia
Usuários que reproduzem mensagens de pornografia infantil podem receber sanções, diz advogada
Usuários que reproduzem mensagens de pornografia infantil podem receber sanções, diz advogada

Quem compartilha mensagens de teor sexual sobre crianças e adolescentes nas redes sociais -e não apenas quem as publica- pode estar cometendo crime.

A polêmica veio à tona na semana passada, depois de comentários no Twitter a respeito de uma participante de apenas 12 anos do "MasterChef Júnior", da Band.

Para a advogada Alessandra Borelli, diretora da Nethics (escola de educação digital), não é só o responsável pela mensagem que comete crime: "Quem compartilha os conteúdos pode ser responsabilizado, assim como quem fizer um comentário", diz.

Pode haver sanções por incitação à violência e, no caso de mensagens direcionadas a uma pessoa específica, a prática pode ser considerada crime contra a honra.

"Uma menção dessa forma na internet pode significar incentivo a práticas delituosas. Se encontrada, a pessoa pode ser responsabilizada criminalmente", diz o desembargador Antônio Carlos Malheiros, do Tribunal de Justiça de São Paulo, ex-coordenador de Infância e Juventude da corte.

Borelli recomenda que se evite compartilhar as mensagens, mesmo que para condená-las. "Quanto mais a gente dissemina o conteúdo, maior o prejuízo da vítima."

É o mesmo conselho que dá Rodrigo Nejm, diretor de educação da ONG Safernet, que recebe denúncias de crimes on-line. Só no ano passado, foram 51.553 registros sobre pornografia infantil.

"Há um contexto da erotização precoce, que privilegia o corpo das chamadas 'novinhas', termo que está ficando bem famoso. Há estudos americanos que falam em pedofilização da sociedade, a hipervalorização do desejo sexual pelo corpo jovem."

As redes sociais só podem ser responsabilizadas se não tirarem do ar algum conteúdo cuja remoção tenha sido ordenada pela Justiça ou se não repassarem as informações necessárias sobre os autores no período determinado pela lei.

O Twitter, rede na qual boa parte dos comentários em relação à participante do "MasterChef Júnior" foi feita, afirma, em nota, remover todo o conteúdo que possa ser relacionado à pornografia infantil. Procurado, o Facebook disse vetar conteúdo de assédio e violência sexual, principalmente contra menores.

Em alguns casos, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) prevê pena de até três anos de reclusão para quem tentar aliciar, assediar ou constranger uma criança (até 11 anos) a praticar ato libidinoso.

COMO AGIR

Para famílias de crianças vítimas desse crime, Borelli recomenda reunir provas como prints dos comentários e endereços dos sites onde eles foram feitos. Deve-se procurar um advogado especializado e a polícia -e também é possível pedir ajuda a entidades como a SaferNet.

"Quanto mais ágil, maior a chance de diminuir o prejuízo para a vítima. Um minuto na internet representa muito, dada a capacidade de disseminação da web."

De acordo com o Marco Civil da Internet, as redes sociais precisam manter o registro de seus usuários por ao menos seis meses. Assim, mesmo se os autores dos comentários deletarem seus perfis, ainda será possível descobrir suas identidades.

PRIMEIRO ASSÉDIO

Como resposta aos comentários sobre a participante do "MasterChef Júnior", usuárias das redes sociais aderiram à campanha #PrimeiroAssédio, iniciada pela ONG Think Olga, em que relataram episódios de abusos na infância. De acordo com uma análise da Scup, empresa de monitoramento digital, a iniciativa teve 62,6 mil mensagens até as 14h da última sexta-feira (23) no Twitter.

A maior parte delas (81,25%) criticou o assédio sofrido pelas mulheres. A palavra mais comum foi "homem" (ou homens), com 11.994 menções. Feminismo, feminista e feminazi vieram em seguida, usadas 2.318 vezes.

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COMO DENUNCIAR

Como faço para denunciar?
A melhor forma é pelo site da SaferNet; denuncie.org.br. Ele filtra e encaminha casos para autoridades. Redes sociais como Facebook e Twitter também têm botões para denunciar abusos

Como proteger meus filhos?
A SaferNet recomenda monitorar a atividade das crianças na internet. Também é fundamental educá-las sobre até que ponto podem conversar com estranhos

O que fazer se for vítima de assédio digital?
O ideal é preservar as provas, como tirar prints dos comentários e guardar os endereços dos sites da internet onde eles foram feitos

Qual é a idade mínima para participar das redes sociais?
No Facebook, Instagram, Twitter e Snapchat é de 13 anos. O limite do YouTube é de 18, mas adolescentes de 13 a 17 podem se cadastrar com permissão dos pais

O crime é só publicar mensagens de cunho sexual contra crianças?
Postar ou compartilhar textos desse teor pode ser considerado incitação à violência ou crime contra a honra. O ECA prevê até três anos de reclusão para casos de assédio e aliciamento

Colaborou BRUNO SCATENA


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