Folha de S. Paulo


"A música é responsabilidade social", diz Linn da Quebrada, "bicha e preta"

Daryan Dornelles
As cantoras ELZA SOARES & LINN DA QUEBRADA posam para ensaio da Serafina de julho de 2017 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
As cantoras Elza Soares e Linn da Quebrada posam para ensaio da Serafina de julho de 2017

Linn da Quebrada. O trocadilho é o nome de palco de uma cantora que não se considera uma cantora na maior parte do tempo.

Ativista dos direitos LGBT e auto-definida como "bicha, preta, trans e periférica", Linn, 26, se projetou da Zona Leste de São Paulo para todo o país com suas músicas, entre o funk e o rap, com títulos como "Enviadescer" e "Bixa Preta". Acumula milhões de views no YouTube e atualmente angaria fundos para lançar seu primeiro álbum, "Pajubá".

A pedido da Serafina, Elza Soares, uma das maiores cantoras do país, recebeu Linn em seu apartamento em Copacabana para conversar sobre o ofício de cantar.

Leia abaixo a entrevista com Linn.

Em que você está trabalhando neste exato momento?
Estamos fazendo shows, viajando com a "gig" da Quebrada, trocando e formando redes de apoio e troca. E levantando a grana pra realizar o meu primeiro disco, por meio de uma campanha de financiamento coletivo.

Teve alguma música que te levou a querer ser artista? Qual, quando e por quê?
Não me lembro de nenhuma música específica. Mas perceber a música enquanto ferramenta de comunicação e veículo de informação foi fundamental para que criasse em mim a vontade de troca e de diálogo com outras pessoas. Perceber a música como possibilidade de memória.

Qual foi o momento em que você olhou no espelho e pensou: sou cantora?
Acho que até hoje esse momento não aconteceu (risos). Nunca pensei que fosse cantora, antes da música eu já estava experimentando meu corpo em outras plataformas artísticas, como teatro, performance, cinema. Mas quando eu percebi o quanto a música podia acessar outras pessoas e que eu poderia usá-la como resposta, que poderia usá-la para ter voz, então eu o fiz. Sem esperar necessariamente ser cantora. Mas estando cantora.

Tem algum momento em que olhe no espelho e pense: não sou cantora? Quando?
Já houve esse medo de fazer música por não me considerar cantora, por não ter uma voz que fosse considerada "bela", diante do padrão, do esperado. Mas atualmente tenho entendido o espaço que eu ocupo na música. Tenho entendido as várias possibilidades e funções que a música pode ter. E através disso que compreendo que, no que faço, eu não sou a parte essencial. Sou canal, mas o que realmente importa é o que digo através da minha música e o elo crio através dela, e com quem.

Qual é seu conselho para alguém que quer ser cantor(a)?
O que posso dizer é música pra quê? Pra quem? Lembre que música também tem um papel fundamental não só na reprodução do que vivemos, mas na produção dos nossos corpos, afetos, desejos. E com isso é também alvo de responsabilidade social. Pergunte-se: música pra que? Pra quem? E no mais: faça. Experimente. Arrisque. Erre.

Qual foi o melhor conselho que recebeu quanto ao ofício?
Faça por você. Relembre o porque de estar fazendo tudo isso.

Que palavra define sua relação com a arte hoje?
Memória.

Qual definia quando começou?
Corpo.

Se não fosse artista, seria o quê?
Não consigo imaginar minha vida sem a arte. Até porque pra mim ser artista não tem necessariamente a ver com profissão. Mas é uma ação. É atitude. É criar sobre si mesma.

Uma música que todos deveriam ouvir?
"Ponta de lança", do Rincon Sapiência.


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