Folha de S. Paulo


Chico César: 'Quando não tinha nada respirava com muito mais calma'

Arquivo Pessoal
Patricia Stavis

1996

Quando não tinha nada, eu
1. Respirava com muito mais calma.

Quando tudo era ausência, esperava
2. Que algo daquilo não me abandonasse nunca.

Quando tinha frio
3. Eu pensava em voltar pra Paraíba mas acendia fogo com álcool numa tigelinha -e ficava.

Quando chegava carta
4. Abria e lia sofregamente. Depois relia, com calma.

Quando ouvia Prince
5. Tudo em mim dançava.

O olho brilhava quando
6. Conhecia um ídolo, alguém que eu admirava, e este se mostrava gentil e humano.

Quando criava asas
7. Subia em meus muros e me atirava. Cada vez num muro mais alto.

Me apaixonava quando via
8. As moças orientais, quando morei numa pensão próxima à estação São Joaquim.

2015

Quando não tenho nada, eu
1. Sossego e agradeço.

Quando tudo é ausência, espero
2. A inspiração chegar e virar música.

Quando tenho frio
3. Me enrosco com a namorada e ligo a TV baixinho.

Quando chega carta
4. Acho que é um milagre pois todo mundo só quer saber de cutucar e enviar torpedos.

Quando ouço Prince
5. Ainda pasmo -e danço.

O olho brilha quando
6. Escuto um artista novo, jovem, explodindo em criatividade e com personalidade.

Quando crio asas
7. Passareio.

Me apaixono quando vejo
8. Minha namorada Bárbara Santos todos os dias ao acordar, de verdade.


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