Folha de S. Paulo


Com alambique usado, Olivier Baussan criou a bilionária L'Occitane

Quando decidiu comprar um alambique antigo de destilação, Olivier Baussan tinha 23 anos e era estudante de literatura. Em 1976, começava a produzir, na garagem de casa, óleos, sabonetes e essências para vender em feiras do sul da França.

Ao abrir uma livraria em Paris, em 1996, "para reunir numa mesma prateleira os seus poetas preferidos", ele já era um multimilionário. A distância entre os dois momentos é marcada pela mesma paixão: os odores e sabores de sua terra natal, a Provença. Fez sucesso e fortuna engarrafando os cheiros da região, um misto de alecrim e lavanda.

Meio ao acaso, Olivier encontrou na juventude a chave para o sucesso. A produção caseira ganhou escala industrial no início dos anos 1980, quando fundou a L'Occitane, hoje uma empresa global, com faturamento na casa dos 900 milhões de euros (R$ 2,4 bilhões) e 2.000 lojas em 85 países.

"Eu me sinto um alquimista, não um empresário", diz. Ele, de fato, vendeu a maior parte de suas ações. Em 1990, tornou-se sócio minoritário da companhia e passou a ocupar o cargo de diretor artístico. É responsável pelos desenhos das embalagens "vintage" da marca, que faz de modo artesanal, moldadas em gesso.

Ao se afastar do dia a dia da empresa de cosméticos, Olivier liberou-se para outro tipo de alquimia. O ingrediente da vez foi o azeite de oliva. Nascia, em 1996, a Olive & Co, também umbilicalmente ligada às suas origens provençais. Seguindo o mesmo roteiro, o francês passou o negócio alguns anos depois.

O velho alambique artesanal virou peça de museu. Enfeita a entrada da fábrica moderna da L'Occitane em Manosque, não muito distante de onde começou três décadas atrás.

RÚSTICO

A empresa ainda transpira a aura do seu criador. Aos 57 anos, Olivier Baussan é uma espécie de garoto-propaganda de luxo da marca que criou. Vende seu estilo de vida. Abre a porta pesada de madeira de um prédio majestoso no centro histórico de Forcalquier, cidadezinha típica da Alta Provença. Veste calça e camisa de sarja.

A casa rústica, feita de pedra, sustentada por vigas aparentes de madeira, é um ótimo cartão de visitas: tudo é simples e sofisticado ao mesmo tempo. Os poucos móveis ressaltam o requinte pensado em cada detalhe da decoração dos amplos salões. O grupo é recepcionado em uma sala dedicada a miniaturas.

O jantar será servido no jardim. O menu é peixe, acompanhado de legumes e salada, "tudo orgânico e produzido na região", explica o anfitrião."A Provença é o meu país", diz Olivier à Serafina. "É aquele sentimento de pertencer a uma região, um valor importante." Ele se converteu numa espécie de embaixador local. É uma celebridade nas redondezas. Sua história de "self-made man" é contada pelo taxista, pelo dono da loja de lembrancinhas, pela camareira do hotel.

Divulgação
Olivier Baussan usou um alambique usado para fundar a L´Occitane no sul da França
Olivier Baussan usou um alambique usado para fundar a L´Occitane no sul da França

Gente que fala com o mesmo orgulho de viver na zona mediterrânea da França, tendo como cenário cotidiano as inspiradoras paisagens eternizadas por artistas como Paul Cézanne, Vincent van Gogh e Henri Matisse. "A minha Provença é aquela ainda um pouco selvagem, um pouco rude, que respeita e quer construir um desenvolvimento sustentável. Uma terra na qual se encontra um equilíbrio entre homem e ambiente", define Olivier.

LAVANDA

A produtora de lavanda Martine Rayne, 58, traduz bem tal espírito em sua propriedade familiar, em Lagarde-d'Apt, nas montanhas da Alta Provença. "A história de Olivier é inspiradora, não só pelo sucesso, mas por nos possibilitar também manter um estilo de vida mais natural", diz ela.

Há três gerações, os Rayne assistem, a cada verão, ao florescer de uma tela viva em torno da casa de pedra. São 50 hectares de campos de lavanda, emoldurados por um céu azul, montanhas verdejantes e o mar Mediterrâneo ao longe. "Minha paixão pela lavanda vem da infância, por isso, retomamos o cultivo na antiga propriedade dos meus avós", relata Martine. Ao lado do marido, Richard, e de dois empregados, ela fez renascer a tradição do plantio manual e orgânico do chamado ouro azul da Provença.

Assim como os bons vinhos, a essência dos Rayne conquistou o selo de qualidade e de origem controlada AOC. A cada início da colheita, no começo de julho, os agricultores preparam um piquenique em um cenário digno de uma pintura impressionista: vastos campos de lavanda ao fundo, banhados por luz intensa e impregnados de um perfume natural. "Eu me apaixonei por essa comunhão e por esse ofício", emenda Olivier "E sabia que podia ser feliz fazendo isso."

A Provença dele tem como epicentro a Forcalquier. "A partir daqui, é possível descobrir cidadezinhas magníficas, como Banon. Há lugares incríveis nas redondezas, com restaurantes muito bons, mas não necessariamente chiques."

Foi em um passeio de carro por essas estradinhas confinadas por ciprestes que ele avistou, aos 23 anos, aquele velho alambique de cobre, que deu início à sua saga pelo mundo dos cheiros e sabores.

Estava em uma propriedade à beira do caminho. Olivier fez o retorno, parou para conversar com o velho proprietário e fez uma proposta imediata de compra. E seguiu em frente. "A Provença é sempre o meu ponto de partida e de chegada", divaga.


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