Folha de S. Paulo


Angolanos agitam a noite carioca

Copacabana, rua Prado Junior, noite de sábado. À medida que o relógio vence a meia-noite, o epicentro do meretrício carioca é ocupado pelo português trotado falado em Angola.

Rapazes e moças de pele retinta, estilo inventivo, cabelos que desafiam a gravidade e dedos ágeis no enviar e receber de SMS se aglomeram em frente a uma porta guardada por duas estátuas romanas e quatro seguranças. Ao fundo, uma escada cujos degraus levam ao inferninho da boate Erotika.

No subsolo, a dançarina Erika, corpo de jogador de futebol e/ou madrinha de bateria, tira a roupa numa coreografia entre dança árabe e posturas halterofilistas, ao som de "No Ordinary Love", diante dos olhos meia-maré de europeus e de moleques espinhentos.

Daniela Dacorso
Angolanos se divertem em festinhas que agitam a noite carioca
Angolanos se divertem em festinhas que agitam a noite carioca

A juventude angolana começa a entrar no salão por volta da 1h, enquanto no palco "Letícia Delícia" gira o tapa-sexo. Empoleiram-se ao fundo da boate. Elas de braços cruzados, eles espiando os strips. Ninguém reage à música. Poucos bebem. Apenas aguardam o momento em que a mesa com 12 europeus pague a conta e eles possam começar sua festa Afrikana, marcada para 0h30.

Do outro lado do Atlântico, seus pais não imaginam que estejam ali. Sabem que os filhos, enviados ao Brasil atrás de melhor educação, promovem festas esporádicas desde o ano passado.

"Resolvemos organizar uma cena para nos juntarmos ao som dos nossos ritmos: 'kuduro,' 'kizomba', 'semba'. Esse foi o único lugar que conseguimos. E por preço razoável", explica a dublê de hostess e futura psicóloga Dorel, 23, legging dourada e óculos de grau pendurados no nariz.

O palco agora está vazio e o fundo do salão, lotado por mais de 60 jovens. As dançarinas estão aboletadas no colo dos clientes finalizando o serviço, quando, às 2h15, Bruno Nancova, 22, estudante de engenharia e organizador da festa, finalmente assume o som. Lança um "house", mas ninguém que não tenha a saia na altura da calcinha se mexe. Enquanto a cena sexual não entra em irremediável "fade out", as angolanas temem ser confundidas.

São quase 3h quando os gringos pagam a conta e o DJ ataca de "afrohouse". Semelhante à chegada de furacão, nada fica no lugar.

O palco lota. As meninas liberam movimentos de quadril duro, bunda empinada e joelhos arqueados, repletos de graça, mas capazes de corar cristãos.

Os garotos disputam para ver quem mais arrasa na pista, sob o olhar das dançarinas que sobraram.

Brasileiras deslocadas se esforçam a todo custo para ser confundidas ora com pretas, ora com putas.

Embora o bom-mocismo tenha se transformado em veneno, não há angolano que toque no "pole dance".

É dia quando a festa termina e eles emergem à rua. Nas calçadas, babás empurram carrinhos, senhores fazem jogging e famílias se encaminham para o domingo na praia. Se não for semana de prova, no outro sábado tem mais.


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