Folha de S. Paulo


Extrativismo na Amazônia ainda está longe do potencial, dizem debatedores

Açaí, peixe, madeira. O extrativismo é parte essencial da história e da economia amazônicas, mas a atividade está longe do seu potencial e precisa de políticas públicas para se aperfeiçoar.

Esse foi o consenso do painel que discutiu o assunto durante o seminário O Futuro da Amazônia, que acontece nesta segunda-feira (27), em Manaus. O evento é organizado pela Folha, com o patrocínio da Manaus Ambiental e Manaus Luz e apoio do Banco da Amazônia.

Para Helder Lima de Queiroz, diretor do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, o extrativismo feito de forma precária, ilegal e sem valor agregado é apenas uma parte da história. "Existe uma série de preconceitos. É como se tivéssemos vergonha das nossas identidades, da nossa relação com o meio rural, com a natureza."

Queiroz citou o manejo do pirarucu implantado em 1999 pelo Instituto Mamirauá na região de Tefé (520 km a oeste de Manaus) como um exemplo de extrativismo que vem dando certo. Ao longo desse período, além do aumento na renda dos pescadores da região, houve uma recuperação de 447% o estoque natural da espécie.

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O representante do órgão de pesquisa federal afirma que, atualmente, o extrativismo gera R$ 74 bilhões ao ano, o que representa apenas 0,1% do PIB nacional, embora, nos Estados da região amazônica, esse percentual suba para 10%, em média.

Para ilustrar o potencial, Queiroz afirmou que, na Europa, o quilo da trufa coletada chega a US$ 11 mil. Para ele, alguns cogumelos encontrados na Amazônia poderiam ter o potencial de preços altos, mas é preciso ter planejamento para o aprimoramento das cadeias.

O secretário-adjunto de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia do Pará, Eduardo Leão, citou o açaí como um exemplo de cadeia produtiva que vem dando certo no seu Estado.

"Só o Pará produziu 1 milhão de toneladas de açaí no ano passado, é maior produtor nacional de açaí", afirmou.

Leão disse que um dos gargalos para o crescimento do extrativismo é que "a marca Amazônia está muito deturpada".

"O mercado europeu está boicotando a madeira do Pará porque estão com medo de associar a madeira da Amazônia com desmatamento, com trabalho infantil, escravo. Isso é um conceito errado. Se você tirar o emprego desse cara, aí que vai ser muito mais difícil segurar o desmatamento ilegal."

Segundo o Ibama, o Pará e o Mato Grosso são os únicos Estados não integrados ao Sinaflor (Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais), o que dificulta a fiscalização. O órgão federal afirma que, em ambas as unidades federativas, há uma emissão excessiva de créditos, que terminam usados para "esquentar" madeira roubada em áreas de proteção, como terras indígenas.

Segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o Pará foi o Estado que mais desmatou neste ano, com 36% dos 6.624 km2 de floresta amazônica destruída entre agosto de 2016 e julho de 2017.

Em sua fala, o secretário-executivo de Estratégia Organizacional do Banco da Amazônia, Antonio Carlos de Lima Borges, afirmou que o incentivo ao extrativismo é uma das prioridades da instituição, mas que os projetos precisam demonstrar viabilidade.

"A sustentabilidade não é só social e ambiental, precisa ser econômica", afirmou. "O banco trabalha com fluxos futuros."

Questionado sobre o acesso ao crédito, Borges disse que mesmo posseiros podem procurar o banco, mas admitiu que há vários obstáculos burocráticos por exigência de órgãos de fiscalização, como a Receita Federal e o Tribunal de Contas da União.


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