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Perda de usuários diminui, mas custos altos desafiam convênios

Bruno Santos/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 15-11-2017: A analista comercial Juliana Lima (36), esta sem plano de saude no momento e tem todo um historico de entrada e saida de planos por conta de mudancas de emprego. (Foto: Bruno Santos/ Folhapress) *** FSP-ESPECIAIS *** EXCLUSIVO FOLHA***
A analista comercial Juliana Lima, 36, em sua casa, na zona sul de São Paulo

Dependente do mercado de trabalho formal, o setor de saúde suplementar viu sua base de beneficiários encolher 6% do fim de 2014 até setembro deste ano. Ao todo, 3 milhões de pessoas deixaram de contar com um plano de saúde. Não por acaso, o país eliminou 3,5 milhões de postos de trabalho no mesmo período, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Apenas em 2016, o saldo de empregos formais foi negativo em 1,32 milhão, de acordo com dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). Enquanto isso, 1,5 milhão de pessoas ficou sem plano de saúde, segundo a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Desse total, 1 milhão (68,2%) era de planos coletivos empresariais, aqueles fornecidos pelas empresas a seus funcionários.

Em 2017, o cenário é um pouco diferente, afirma Luiz Augusto Carneiro, superintendente-executivo do Iess (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar). O instituto aponta que foram rompidos 624,6 mil vínculos com planos médico-hospitalares entre setembro de 2017 e o mesmo mês do ano passado.

Ainda que represente uma retração de 1,3% no total de beneficiários, o número mostra redução no ritmo de rompimentos de vínculos, que estava em 3,1% em dezembro de 2016. Além disso, o saldo de empregos está positivo em 208,8 mil postos entre janeiro e setembro deste ano.

Juliana Lima, 36, faz parte do contingente de pessoas que perderam o emprego e se viram sem plano de saúde. Formada em publicidade e com duas pós-graduações, trabalhava como analista comercial numa empresa que oferecia um plano de saúde de primeira linha. Com a crise econômica, ela foi demitida no ano passado. Sofreu uma queda na rua e rompeu os ligamentos. Sem plano de saúde, teve que arcar com os custos do tratamento.

Agora está num trabalho no qual ganha menos e que não oferece plano. Sofre de depressão, e seu pai pagará um convênio para ela. "Não tenho dinheiro para consulta nem para remédio", diz.

RETOMADA
Para que o cenário de saúde suplementar seja mais positivo, diz Carneiro, do Iess, a retomada da economia deve estar apoiada em setores que historicamente oferecem plano de saúde a seus funcionários, como a indústria.

"Há um crescimento do mercado informal, o que não contribui para o setor de saúde suplementar, já que um trabalhador sem carteira assinada não recebe benefícios e, sem a segurança do vínculo empregatício, as famílias demoram mais para retomar o contrato com o plano, por medo de não conseguir manter os pagamentos", afirma.

Os desafios do setor não se limitam, porém, ao enfraquecimento da economia.

Pedro Ramos, diretor da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), afirma que pesam também os altos custos. São eles: a inflação médica, mais alta do que a inflação geral; a inclusão de novos procedimentos no rol de cobertura obrigatória; os ressarcimentos cobrados pela ANS de clientes de planos que usam o SUS; as fraudes contra os planos; a mudança na forma de remuneração de médicos e hospitais, que paga por procedimento e estimula excessos; e as regras para os planos coletivos, que proíbem o reajuste para quem tem acima dos 59 anos.

Ramos afirma que a inflação médica é mais alta do que a inflação geral no mundo todo. Na Europa, por exemplo, a inflação médica subiu 5,9% no ano passado, enquanto a inflação geral foi 1,6%, segundo a consultoria Aon.

No Brasil, a variação dos custos Médico-Hospitalares em 2016 foi 20,4%, já o IPCA (índice usado como medida de inflação) subiu 6,3%.

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GASTOS
Os custos da saúde estão, portanto, no foco do debate. Para Ramos, a forma de remuneração do setor, que hoje é por atendimento ou procedimento, estimula abusos.

"A OMS [Organização Mundial da Saúde] diz que são necessários 52 exames de tomografia para cada grupo de mil habitantes. No Brasil são feitos 132 exames na mesma comparação. Isso faz mal não só para a indústria, como para o ser humano", afirma.

Em janeiro de 2018 entrará em vigor a nova cobertura mínima dos planos de saúde determinada pela ANS. Serão 18 novos procedimentos obrigatórios. Ramos defende que a inclusão de novos procedimentos seja discutida de forma mais profunda. "Quando se passa a ter direito a mais alguma coisa, alguém vai pagar, e quem vai pagar é o consumidor", afirma. "Por isso, um direito a mais às vezes é um direito a menos."


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