Folha de S. Paulo


'Vejo nos olhos se alguém me aceita ou rejeita', diz garoto com doença de pele

Sidney, 16, o primeiro filho da cozinheira Leila Samara de Souza, 35, nasceu com algumas feridas na pele que logo se tornaram bolhas.

Foi o começo da peregrinação aos médicos de Teresina (Piauí), onde a família morava. "Falavam que era coceira, sarna, e eu fazia tudo o que mandavam para aliviar aquela dor", diz Samara.

Nada adiantava, e a família resolveu se mudar para Sorocaba, onde moravam parentes do então marido de Leila, para tentar achar algum tratamento para o filho.

Sidney chegou à cidade do interior de São Paulo com a pele tão ferida que os médicos acharam que eram queimaduras. "Até chamaram o Conselho Tutelar", conta a mãe. Finalmente, uma médica chegou ao diagnóstico: epidermólise bolhosa.

Editoria de Arte/Folhapress
Especial - Seminários Folha - Fórum Saúde da Pele - Tipo de Pele - Doenças de pele - Como os brasileiros classificam a própria pele

A doença causa bolhas e descolamento da pele por causa de um defeito no gene que produz colágeno, responsável pela adesão das células da epiderme.

Encaminhados para o Hospital das Clínicas de São Paulo, Leila e Sidney passaram anos fazendo bate-e-volta de Sorocaba para a capital, até Leila voltar para a casa de sua mãe, em Teresina, após se separar do marido, em 2012.

Retornou a São Paulo porque a doença do filho piorou. Ela, Sidney e seus irmãos (Sidilene, 15, e Matheus, 9) moram com o tio de Leila em uma casa alugada na zona norte da cidade.

Ali, Sidney, que quer ser cantor, treina teclado ("devagarzinho para não machucar") e dança forró, sozinho. "Minha irmã diz que sou muito rápido para ela", conta.

Ele começou a frequentar a escola do bairro, mas às vezes não aguenta chegar ao local. "Só tem subida no caminho", diz Leila. Ela ainda não conseguiu transporte da prefeitura e não tem como pagar a perua particular -acaba de perder o emprego num bar, onde cozinhava à noite para cuidar do filho durante o dia. "A escola é legal, as crianças gostam de mim. Eu vejo nos olhos se uma pessoa me aceita ou me rejeita, mas não ligo", diz Sidney. Já Leila, às vezes, quer discutir. "As pessoas têm preconceito porque acham que a epidermólise é contagiosa, mas se fosse, eu seria a primeira a pegar."

Foi a mesma resposta que a coreógrafa carioca Deborah Colker deu à tripulação da Gol, quando tentaram impedir seu neto Theo, 8, de embarcar num voo, em 2013.

Theo nasceu com o mesmo problema de Sidney. Em 17 horas, a família recebeu o diagnóstico. "Mais sério do que a doença é o preconceito que leva crianças e suas famílias a se esconderem. Esconder o quê? Como escondiam os homossexuais, os negros, quem mais? Qual é a lista da normalidade?", desafia Colker.

Agora, Theo está com seus pais, irmã e a avó em um hospital de Minnesota (EUA), onde fez transplante de medula, uma esperança de cura para a epidermólise bolhosa.

"Theo é um guerreiro. É até uma contradição ter uma doença que fragiliza tanto e ser tão forte", afirma Colker, que desde o nascimento do neto luta para aumentar o conhecimento sobre o problema, seja brigando contra o preconceito (está até hoje processando a companhia aérea), seja apoiando pesquisas.

Editoria de Arte/Folhapress
Especial - Seminários Folha - Fórum Saúde da Pele - Tipo de Pele - Doenças de pele - O que mais leva as pessoas a procurar um dermatologista

Endereço da página:

Links no texto: