Folha de S. Paulo


Em cidade campeã de limpeza urbana, só lixo separado corretamente é levado

Os lixeiros da cidade campeã de limpeza urbana no país só recolhem o lixo descartado corretamente. Quando os materiais estão misturados, a ordem em Nova Esperança (a 475 quilômetros de Curitiba) é que seja colado na lixeira o adesivo com o aviso: "Este lixo não foi recolhido porque não está separado".

Com medo do acúmulo de lixo na rua, os vizinhos informam à prefeitura se alguém descumpre a separação. Um fiscal é enviado ao local e notifica o morador.

"Tem gente que só aprende se aborrecendo", afirma Amarildo Ardenghi, secretário de Meio Ambiente da cidade, no noroeste do Paraná, sobre a medida adotada há oito anos pela prefeitura.

Cerca de 80% das moradias, em média, separam os resíduos. Se esse percentual baixa, carros de som começam a circular pelo município, de 28 mil habitantes, alertando para a queda.

A prefeitura cogita, agora, enviar à Câmara um projeto de lei para multar quem desrespeitar a norma no Ecoponto –local onde são descartados móveis e eletrodomésticos– e, no futuro, aplicar a cobrança no caso de qualquer tipo de descarte errado. Não há definição de valores.

"Não é uma questão de punir o cidadão, mas de forçar a reeducação", diz o secretário.

EM PRIMEIRO LUGAR

A cidade recebeu a nota 0,9 num ranking que vai de 0 a 1, a maior entre 3.000 municípios no país analisados no Islu (Índice de Sustentabilidade de Limpeza Urbana), elaborado pela ABLP (Associação Brasileira de Resíduos Sólidos e Limpeza Pública), pelo Selur (Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana) e pela consultoria PWC.

Só outras nove cidades tiraram nota maior que 0,8 no ranking, todas na região Sul. Curitiba recebeu nota 0,7.

O índice, de 2016, analisa questões como destinação do lixo e reaproveitamento de materiais descartados.

Neste ano foi lançado um novo estudo, mas sem ranking. A nota de Nova Esperança caiu para 0,7, ainda acima da média do Sul, de 0,6. Ardenghi alega que a avaliação baixou por divergências no preenchimento de dados e que não houve alterações na gestão do lixo.

O relatório apontou que mais de 50% dos municípios analisados têm destinação incorreta dos resíduos, a maioria no Norte e no Nordeste.

"Isso significa que, atualmente, há um grande impacto ambiental gerado por causa da existência de lixões que deveriam ter sido extintos em 2014, fato que coloca esses municípios e seus respectivos gestores como infratores ambientais", afirma o estudo.

SOLUÇÕES

Em Nova Esperança, o caminhão de lixo circula diariamente com uma carreta acoplada -os sacos de material orgânico vão para o caminhão e os recicláveis, para a carreta, que depois é levada para a Cocamare, cooperativa de recicláveis da cidade.

Até as folhas, as flores e as vagens das árvores da espécie Sibipuruna, espalhadas pela cidade, viram adubo em um viveiro municipal.

"A gente recolhe sacos e sacos dessa florzinha", diz a moradora Antônia Fragati, 74.

As mudas do viveiro, cultivadas em embalagens de leite descartadas, são distribuídas gratuitamente.

Com os bons resultados, a gestão do lixo passou de assunto árido para motivo de orgulho da cidade, que destina R$ 2 milhões dos R$ 54 milhões do seu orçamento à política de resíduos sólidos.

O tema ultrapassou diferenças ideológicas entre políticos de situação e oposição. "Virou uma questão política, dá voto", diz o secretário.

Hoje, são recolhidas 450 toneladas de lixo por mês. Um quarto desse total é de materiais recicláveis. Os dejetos orgânicos são levados a um aterro certificado em Maringá, a 45 km de distância.

A Cocamare, que já chegou a ficar com falta de trabalhadores por causa do volume de materiais, ampliou o espaço, dobrou o número de cooperados (de 15 para 31) e agora pretende formar consórcio com outras localidades.

No próximo mês, a prefeitura vai distribuir a moradores galões para acondicionamento do óleo de cozinha usado. A cooperativa transformará o material em sabão e matéria-prima de óleo diesel.

E, para os moradores, ainda há espaço para melhorar a coleta na cidade. "Quando morei no Japão, a gente separava vidro, plástico, alumínio. Aqui em Nova Esperança tinha que ser assim", diz o marceneiro Francis Momesso, 36.


Endereço da página:

Links no texto: