Folha de S. Paulo


Consumo de 'rebite' ainda desafia a segurança em rodovias brasileiras

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
Tráfego em trecho da rodovia Presidente Dutra, em Guarulhos (SP)
Tráfego em trecho da rodovia Presidente Dutra, em Guarulhos (SP)

O consumo de álcool e drogas é uma das principais causas de acidentes graves nas estradas, mas, se as operações tipo Lei Seca se tornaram corriqueiras contra as bebidas, ações mirando outros tipos de entorpecentes ainda são uma dificuldade para as autoridades por conta de sua logística mais complexa.

Com o objetivo de combater os entorpecentes entre motoristas profissionais, uma lei de março de 2016 tornou obrigatório um exame toxicológico para a obtenção e renovação da habilitação nas categorias C, D e E, que abrangem ônibus e caminhões.

O consumo de drogas nas estradas é uma antiga realidade. Levantamento feito pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais com caminhoneiros no Ceasa Contagem, na Grande Belo Horizonte, revelou que 50,9% dos condutores que se acidentaram usavam "rebites" (anfetaminas e outros estimulantes).

A obrigatoriedade do exame toxicológico da maneira como é divide especialistas.

O Brasil adotou a análise feita a partir de amostras de cabelos, pelos e raspas da unha. O exame, de larga detecção, registra o consumo de cocaína, maconha, anfetaminas e opioides em um período de cerca de três meses.

Em caso de resultado positivo, o condutor é considerado temporariamente inapto. Ele tem direito a realizar uma contraprova ou, passados 90 dias, pode fazer novo exame.

O teste é oferecido por nove laboratórios credenciados pelo Denatran, que agrupam o material enviado por mais de 8.000 postos de coleta espalhados pelo Brasil.

Na avaliação da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego), o teste nessas condições não ajuda a reduzir acidentes. "O exame é feito na hora da obtenção da carteira e da renovação. O sujeito pode estar usando drogas por cinco anos", diz Dirceu Rodrigues Alves, diretor da entidade.

Editoria de Arte/Folhapress

Para ele, o ideal seria a realização de exames-surpresa nas estradas, a exemplo do teste do bafômetro.

A Abramet também diz que o exame com cabelo é menos confiável do que outros métodos. "O ideal é urina ou sangue. Quando um atleta faz um antidoping é o de urina. Ninguém tira cabelo de atleta."

Para o Denatran, porém, o teste é seguro e eficaz. O coordenador de Educação no Trânsito do órgão, Francisco Garonce, diz que dados da Polícia Rodoviária já mostram que "houve redução de acidentes nas estradas federais envolvendo caminhões, ônibus e carretas".

Segundo o Denatran, a quantidade de carteiras de habilitação suspensas por conta de resultados positivos ficou pouco acima de 2,5%.

Garonce também diz que os laboratórios acreditados, assim como seus postos de coleta, passam por rigoroso credenciamento. Já os resultados estariam de acordo com certificações internacionais dos exames toxicológicos.

EXAME

Segundo Márcio Liberbaum, presidente do Instituto de Tecnologias para o Trânsito Seguro, a adoção do exame toxicológico obrigatório teve importância vital na redução de acidentes.

Entre 2014 e 2016, de acordo a Polícia Rodoviária Federal, houve redução de 39% nos acidentes de grandes veículos com mortes ou sequelas.

Liberbaum não atribui a queda diretamente ao exame, mas aponta que, por conta da polêmica gerada na época de sua implantação, muitos caminhoneiros nem pediram a renovação da habilitação, com medo de serem pegos.

Estatísticas do Denatran mostram que mais de 30% das renovações esperadas de carteiras de habilitação C, D ou E não foram requeridas.


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