Folha de S. Paulo


Congresso quer anistiar a corrupção, diz procurador da Lava Jato

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As tentativas de deputados e senadores de anistiar a prática de caixa dois, na realidade, escondem o objetivo de anistiar a corrupção no país, segundo o procurador da força-tarefa da Lava Jato, Carlos Fernando dos Santos Lima.

"O crime de caixa dois é pouco processado no Brasil, nem sei por que alguém quer anistiá-lo, já que é anistiado de fato. Hoje o que se está em discussão no Congresso é a anistia à corrupção", afirmou Lima nesta terça-feira (11) durante o Fórum Conformidade nos Negócios, promovido em São Paulo pela Folha.

O procurador fez eco às declarações do juiz Sérgio Moro, que disse no sábado (8) que o caixa dois é uma ameaça à democracia.

"Caixa dois subverte a democracia, dá mais poder a quem se aproxima do empresariado. Deveria ser um crime federal, na Justiça comum", afirmou Lima.

O advogado e professor da USP Pierpaolo Bottini também defendeu alterações na lei contra a prática durante o seminário. "Precisamos criminalizar não só quem recebe, mas também que paga o caixa dois."

Bottini também defendeu mudanças no foro privilegiado. "Nenhuma discussão, nenhuma reforma política vai resolver os problemas do país enquanto não discutimos a prerrogativa de foro. Temos que trazer os casos para o primeiro grau", afirmou.

ACORDOS

Durante sua fala de abertura no debate, o procurador Lima também disse que o tempo para empresas que querem fechar acordos com a Lava Jato está acabando.

"Quem chegou primeiro teve um acordo melhor e quem chegar por último não vai ter acordo nenhum", afirmou.

Segundo ele, a operação mostrou quão importante ter funcionando nas empresas todos os mecanismos de controle, o chamado "compliance". "Não adianta ter uma diretoria de 'compliance' no mesmo andar da de pagamentos estruturados", disse em referência ao departamento da Odebrecht responsável pelo pagamento de propina.

Para Luís Inácio Adams, ex-ministro da AGU (Advocacia Geral da União), a Lava Jato mostrou que o mecanismo de controle não deve se ater apenas as empresas privadas.

"Temos que pensar no 'compliance' do Estado. O jeitinho brasileiro é uma forma que a sociedade tem de lidar com um Estado que é incapaz de responder a uma demanda que surge da sociedade", disse ele. "Temos que evoluir do Estado sanção para um que se baseie em serviço e cidadania", afirmou

Adams também falou sobre a dificuldade de organização dos órgãos responsáveis por fazer acordos com as empresas envolvidas em corrupção, como o acordo de leniência assinado pela Odebrecht com o Ministério Público Federal.

"Acho que o sistema contra a corrupção tem que apontar equilíbrio. Essa dificuldade de diálogo gera uma incapacidade de gerar soluções, que são simples. Está evoluindo, mas a passo de tartaruga."

Para o advogado Bottini, a longo prazo, o sistema atual pode desestimular que empresas façam novos acordos na Justiça.

Segundo ele, se uma empresa descobre que cometeu crimes e quer fazer um acordo, não sabe qual órgão procurar. "Há a CGU [Controladoria-Geral da União], o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], a AGU [Advocacia-Geral da União], o TCU [Tribunal de Contas da União] e o Ministério Público. Isso gera uma brutal insegurança jurídica."


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