Folha de S. Paulo


Desistentes do Mais Médicos apontam motivos pessoais e profissionais

Bruno foi chamado para uma cidade mais longe do que a que preferia. Armando teve problemas familiares que o impediram de continuar. Solange diz não ter ganho parte do salário ao voltar de um congresso e desistiu.

Motivos pessoais, proposta de emprego em outra cidade, aprovação na residência médica e falha de comunicação são as explicações comuns dos profissionais que desistem do programa Mais Médicos.

Segundo o Ministério da Saúde, 361 pessoas abandonaram o programa federal, um número considerado pelo governo bastante inferior comparado aos atuais 14.462 profissionais. Assim, ao todo, a taxa de desistência é de 2,5%, sendo que a maioria dos desistentes são médicos brasileiros.

Anunciado em 2013 como principal vitrine social do governo Dilma Rousseff, o Mais Médicos previa alocar profissionais principalmente na rede básica de saúde em locais prioritários, como cidades mais remotas e periferias.

A vinda de médicos de Cuba garantiu que a meta fosse atingida (o governo queria chegar à marca de 13 mil profissionais em 2014). Hoje, os cubanos representam 79% do total de médicos em atuação.

Karime Xavier/Folhapress
O venezuelano Alvaro Cordona trabalha em posto no bairro da Vila Pirituba (SP) pelo programa Mais Médicos, em que predominam profissionais vindos de outros países
O venezuelano Alvaro Cordona trabalha em posto no bairro da Vila Pirituba (SP) pelo Mais Médicos

PROBLEMAS

O otorrinolaringologista Armando Lahera Padron, 59, atuou por duas semanas em Ariquemes, Rondônia (160 quilômetros da capital Porto Velho), pelo Mais Médicos, até deixar o posto, no ano passado.

Há 15 anos no Brasil, o cubano já trabalhava na rede municipal concursado como plantonista, quando se inscreveu no programa federal. "Tive problemas familiares fora do país, viajava praticamente a cada 15 dias e não pude continuar".

O pediatra Bruno Ferreira Miguel, 26, queixa-se de não ter sido convocado para atuar em sua cidade, Miguelópolis, no interior de São Paulo (cerca de 380 quilômetros da capital paulista).

O pediatra se inscreveu no Mais Médicos no ano passado, mas foi chamado para assumir em Ribeirão Preto, a 132 quilômetros de distância de sua cidade.

Como trabalha em plantões na Santa Casa de seu município, preferiu desistir da oferta. Para o edital deste ano do Mais Médicos, ele diz que houve uma falha no sistema para sua inscrição e que a vaga continua aberta.

"Eu assumiria aqui, sim, seria até mais fácil. Só assumiu aqui na cidade um médico [do programa]. Nossa demanda é grande. Só no pronto-socorro são quase 200 a 300 pessoas em um plantão, fico morto depois", disse ele.

Em Rio Branco, no Acre, a médica Solange da Cruz Chaves reclama por não ter recebido ajuda de custo para refeição e moradia, por já morar na capital. Ela afirma que os outros intercambistas receberam os valores.

A médica conta que trabalhou por dois ou três meses no programa, mas que, ao voltar de um congresso médico, previamente avisado, deixou de receber salário e, por isso, decidiu se desligar.

Já a prefeitura de Rio Branco diz que alertou o governo federal que a profissional "não estava comparecendo ao serviço". Por isso ela teria sido desligada, completa o município.

'MAIS BRASILEIROS'

Segundo Hêider Aurélio Pinto, secretário de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do ministério, um motivo comum de desistência entre os médicos, principalmente os mais jovens, é a entrada na residência médica.

Muitas vezes os pedidos de desligamento ocorrem logo após os profissionais serem aprovados na residência, afirma ele -conciliar as duas funções é impossível, pela carga horária.

Se os cubanos ainda predominam, na nova etapa do Mais Médicos, lançada neste ano, os brasileiros lideraram as inscrições. Como chamariz aos recém-formados, um dos atrativos foi a oferta de um bônus de 10%para a prova de residência -é necessário que o médico fique pelo menos um ano no programa e seja bem avaliado.

A médio e longo prazos, segundo o secretário, o ministério pretende ampliar o número de vagas em cursos de medicina e também de residência. O objetivo é alcançar a meta de 2,7 médicos por mil habitantes até 2026.


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