Folha de S. Paulo


Vida de médico: cirurgião faz até 15 operações por dia e fica sem almoçar

Logo após às 13h o cirurgião Luiz Paulo Kowalski aproveita uma brecha entre operações para ler e responder e-mails, no centro cirúrgico do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo. Seu dia começou cedo: às 6h já se preparava para a primeira de quatro cirurgias que seriam realizadas naquela fria e chuvosa quarta-feira.

Lalo de Almeida/Folhapress
O médico Luiz Paulo Kowalski aproveita para ler os emails enquanto aguarda os preparativos para uma cirurgia robótica no centro cirúrgico do A.C.Camargo Cancer Center
O médico Luiz Kowalski, em uma pausa, aguarda os preparativos para uma cirurgia com auxílio de robôs

São menos cirurgias que o de costume: em alguns dias, chega a realizar até 15 operações. O que Kowalski não sabia é que a última cirurgia do dia –um intrincado procedimento de retirada de nódulos linfáticos com auxílio de robôs– demoraria mais que o previsto e se prolongaria para além das 20h.

A agenda imprevisível da cirurgia oncológica é uma realidade na vida de Kowalski há mais de 25 anos, desde que ingressou no hospital A. C. Camargo, referência internacional em tratamento de câncer.

Hoje ele dirige o departamento de Cabeça e Pescoço do hospital, uma das áreas em que são feitas cirurgias de altíssima complexidade. A maior especialização dos profissionais da área e a evolução das técnicas cirúrgicas são duas das principais mudanças que ocorreram ao longo dos anos.

"No passado, nós fazíamos a retirada de tumores e, logo em seguida, a reconstrução daquela estrutura. Então podíamos fazer, no máximo, uma ou duas cirurgias desse porte por dia", conta. Hoje, graças ao trabalho em equipe, cirurgiões fazem a remoção dos tumores e depois passam o caso para o time de médicos especializados em reconstrução, explica Kowalski.

Muitos procedimentos que no passado eram longos foram substituídos por técnicas mais eficientes. Além disso, há também o ganho de experiência do próprio médico, que vem com o tempo.

Não ter uma rotina estabelecida é inerente à profissão de cirurgião, mas as longas horas em pé e o estresse exigem preparo físico. Muitas vezes, o corpo só vai sentir o impacto do dia de trabalho puxado horas depois.

Dores nas pernas e nas costas fazem parte do cotidiano do médico, mas ele se ressente mesmo é de não ter um horário de almoço. " Almoço é ficção. Tem dias que até sobra um tempinho, mas é sempre rápido. É raro sair, sentar e comer adequadamente", diz Kowalski, que admite que toda essa correria está longe de ser saudável. "Somos médicos, mas fazemos tudo errado na hora da alimentação." Na sala de apoio aos médicos, não faltam doces, refrigerantes e salgadinhos de padaria.

Mas, para ele, o empenho compensa. Os olhos do médico brilham quando ele comenta que seu departamento realiza em torno de 200 cirurgias por ano, graças ao trabalho incessante da equipe, formada por dez cirurgiões da área de cabeça e pescoço, mais os médicos auxiliares –especializados em cirurgia vascular e patologia, por exemplo.

Ensinar o ofício aos médicos residentes é outra fonte de orgulho para Kowalski. "Preparar um médico residente [para a cirurgia oncológica] é uma das coisas mais prazerosas nessa profissão. Eles chegam crus, muitas vezes só passaram pelo pronto-socorro, e aos poucos vão ganhando experiência; é fascinante", diz.


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