Folha de S. Paulo


Fórum discutirá desafios da saúde pública e privada; veja alguns pontos

Para os brasileiros, o desejo de ter um plano de saúde só é menor do que o de comprar a casa própria e investir em educação. Os dados são de uma pesquisa encomendada ao Datafolha pelo IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar), divulgada em agosto de 2013.

Entre os entrevistados, 36% responderam que a prioridade é garantir um imóvel, seguidos por 32% que preferem gastar com o ensino e 18% que privilegiam o atendimento em hospitais particulares.

Os motivos apontados para contratar a rede privada foram a qualidade do atendimento, precariedade do serviço público e não querer depender do SUS (Sistema Único de Saúde), além da segurança de ter o plano para se sentir tranquilo em caso de doenças.

Aliada à elevação do poder de consumo nas últimas décadas, a insatisfação com a rede pública tem se traduzido no crescimento da venda de seguros de saúde. Segundo estudo do IBGE realizado em 2012, 50 milhões de brasileiros (25% da população) eram segurados pela rede privada –em 2002, esse percentual era de cerca de 18% da população.

Mais de um quarto de século depois de sua fundação, o SUS ainda tem problemas como superlotação e longas filas de espera para consultas e exames, de acordo com levantamento feito em parceria entre o CFM (Conselho Federal de Medicina), a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e o Ministério Público, apresentado ao Congresso no final do ano passado.

Eduardo Knapp/Biaman Prado/Folhapress
A empresária Taciana Veloso, 30, com o filho na maternidade Pro Mater; pacientes nos corredores do Hospital Dr. Clementino Moura, em São Luís, no Maranhão
A empresária Taciana Veloso, 30, com o filho na maternidade particular Pro Mater, em São Paulo; pacientes nos corredores do hospital público Dr. Clementino Moura, em São Luís, no Maranhão

O SUS

O Sistema Único de Saúde nasceu com três grandes objetivos: acesso universal, sendo um direito do cidadão e uma obrigação do Estado; igualdade de acesso; e integralidade e continuidade dos cuidados.

Alguns números mostram que o sistema se expandiu e hoje chega a uma parcela da população bem maior do que na década de 1980: em 1981, eram 22 mil estabelecimentos de saúde, número que foi a 75 mil em 2009.

O crescimento, no entanto, foi mais intensivo na rede de assistência básica. O número de unidades de serviços ambulatoriais (como postos de saúde) por cada 10 mil habitantes saltou de 1,3 na década de 1980 para 3,6 em 2009.

Já o número de hospitais se manteve estável (de 6.342 para 6.875 no mesmo período) e houve queda no número de leitos oferecidos de 500 mil para cerca de 350 mil em 2013.

Editoria de Arte/Folhapress

Outro dado que evidencia a prioridade dada pelo SUS à atenção básica é o número de equipes do Programa Saúde da Família. Esses grupos são formadas por médicos, enfermeiros e agentes comunitários e são organizados para prestar cuidados primários em unidades de saúde ou nas casas dos pacientes.

Desde 1994, o número de equipes saltou de 4 mil para mais de 33 mil em 2012.

No entanto, a universalização ainda está longe da realidade. Segundo o estudo "20 Anos de Construção do Sistema de Saúde no Brasil" do Banco Mundial, em 2008, apenas 58% da população se declarava usuária regular do SUS.

CUSTO E BENEFÍCIO

Não é só o atendimento na rede pública que enfrenta dificuldades. Na esteira da popularização dos planos de saúde, avança também a insatisfação de seus usuários.

Somente no ano passado, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) registrou 102.232 reclamações contra o setor, número 31% maior do que o de 2012.

A maioria se queixava da negativa de cobertura (72,4%) dos planos, seguida pelo questionamento sobre contratos e regulamentos (19,9%). Por fim, causaram transtornos aos clientes as contestações a respeito da mensalidade e reajustes (6,9%), além de outros motivos (0,8%).

Os problemas no atendimento da rede privada, na avaliação de entidades médicas, se devem ao aumento do número de beneficiários sem que as empresas tenham ampliado, na mesma proporção, a rede credenciada.

Como resultado, as unidades de saúde particulares ficam lotadas e chegam a ter filas de espera de até cinco horas, como reportagem da Folha mostrou em julho de 2012.

CONTROLE

Responsável por regular as empresas que oferecem planos de saúde, a ANS pune os serviços que apresentam os piores índices de reclamação.

O órgão desenvolveu uma fórmula que aponta as deficiências de cada convênio médico. Aqueles que mantêm as deficiências durante dois ciclos de acompanhamento (seis meses) recebem sanções –geralmente, a venda dos planos fica proibida até que os problemas apontados pelos clientes sejam solucionados.

No entanto, a ação da agência nem sempre tem resultado a longo prazo. Na última terça-feira (18), a Folha noticiou a suspensão de 111 planos de 47 operadoras pela ANS. Dessa lista, 31 empresas (66%) estavam na rodada anterior de sanções.

O próprio funcionamento da reguladora enfrenta seus revezes. Em agosto de 2012, reportagem apontou que o órgão chega a levar 12 anos para analisar processos em que operadoras de planos de saúde são acusadas de irregularidades contra seus clientes.

No mesmo mês, a agência anunciou a contratação de 200 funcionários e a realização de mutirão para agilizar essas análises.

MUNICÍPIOS

Além da atenção básica, quem também se destacou nesses 26 anos de Sistema Único de Saúde foram os municípios. A participação das cidades na gestão dos serviços ambulatoriais passou de pouco mais de 20% para 100% entre 1981 e 2009. Nos leitos hospitalares, a parcela controlada pelos municípios que era de 11% chegou a 50%.

Umas das premissas do SUS era a descentralização das responsabilidades pela prestação de serviços de saúde. Porém, metade dos leitos hospitalares continua com Estados e União: Amazonas, Amapá e Acre, por exemplo, dependem quase que exclusivamente de leitos hospitalares geridos pelos Estados.

Como a responsabilidade de gestão foi em parte descentralizada, o financiamento da saúde também sofreu alterações. Logo após a criação do SUS, o financiamento federal representava 85% do total de gastos públicos na saúde.

Desde então, a parcela federal tem recuado, chegando a 45% do total no fim dos anos 2000. Municípios e Estados, por sua vez, aumentam seus gastos ano a ano e atingiram 28% e 27%, respectivamente, de participação no financiamento da saúde no mesmo período.

FÓRUM

Os sistemas de saúde público e privado no Brasil serão o tema do primeiro painel do Fórum A Saúde no Brasil, que a Folha realiza nos dias 26 e 27 de março em São Paulo.

O tema será apresentado nesta quarta-feira, às 9h50, por Mário Scheffer, professor da Faculdade de Medicina da USP, Arlindo de Almeida, presidente da Abramge (Associação Brasileira de Medicina de Grupo), Dirceu Barbano, diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e Eudes de Freitas Aquino, presidente da Unimed do Brasil.

Para participar, é preciso inscrever-se pelo telefone 0800-777-0360. O público poderá reservar quais atividades deseja acompanhar, de acordo com a disponibilidade de vagas –serão 300 por dia.

Veja a programação completa.


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