Folha de S. Paulo


Jovem cria guia gastronômico para avaliar restaurantes da periferia de SP

"Aqui vocês vão ver que a gente consegue fazer comida boa, fina", diz Matheus Oliveira, 21.

É do Ateliê Sustenta CaPão que ele está falando. O restaurante, instalado num quintal do morro do Piolho, na zona sul da cidade, ganhou rasgados elogios de Matheus, que faz um roteiro gastronômico on-line só com pontos para comer e beber nas favelas paulistanas.

Em sua versão popular do "Michelin", o famoso guia francês, o rapaz definiu como "gostosa e exclusiva" a CaPão, que serve refeições inteiras por encomenda (só com reserva).

A sãopaulo o acompanhou nessa visita. Na mesa, farto café da manhã: pão italiano 50% integral ("crocante por fora, macio por dentro, quentinho e leve: um dos melhores que já comi"), patê de ricota com hortelã, creme de soja com azeite, bolo de cenoura com chocolate, bolo formigueiro, chá de melissa plantada no jardim, café recém-passado e água aromatizada.

A conta foi doce como os bolos servidos: R$ 50 divididos por seis pessoas. Ponto para o chef Zé Carlos, ex-funcionário da P.A.O., badalada padaria nos Jardins.

CHEF MATHEUS

Há um ano, Matheus achou o projeto Énois, que dá oficinas de jornalismo para jovens da periferia e propõe "notícias da comunidade feitas pela comunidade". Fã de bacon, com 130 kg, é um confesso apaixonado por comida. Foi um pulo para começar a se aventurar em reportagens sobre gastronomia.

Ele abandonou outra empreitada (tinha uma marca de camisetas personalizadas) para se dedicar inteiramente à área. Hoje, estuda por meio da Gastromotiva, projeto que forma profissionais do ramo gratuitamente, em parceira com a universidade Anhembi Morumbi.

Foto Davi Ribeiro/Folhapress

Antes ou depois das aulas, ele visita os restaurantes (desde PFs, o famoso prato-feito, até barraquinhas de espetos) e escreve suas críticas para o blog do Énóis, republicado no blog Prato Firmeza, do site Catraca Livre.

Suas avaliações são objetivas e sem floreios. Sobre o Rodo Açaí, lanchonete do Capão Redondo, atestou: "Você sempre encontra um garçom diferente por lá, mas como todos carregam a mesma cara mal-humorada, quase não se percebe a diferença". Já a respeito das porções do Feijão de Corda, no Jardim São Luís (também zona sul), declarou: "Que me perdoem os pratos minimalistas, mas quantidade é fundamental!".

Matheus, que mora com os pais no Parque Santo Antônio (zona sul), pensa em continuar como jornalista de comida por um tempo.Tem, contudo, um peixe maior no horizonte: "Quando decidi focar na gastronomia, valorizava muito o título de chef e queria me especializar em cozinha internacional. Hoje quero ser cozinheiro e trabalhar com pratos brasileiros". De preferência num restaurante próprio, na periferia. Mas são planos a longo prazo.

Por hora, está a fim de aprender com os mestres: "Quero estagiar em algum lugar. O D.O.M. seria um sonho". O 6º melhor restaurante do mundo, segundo a revista britânica "Restaurant", inspira. "Não é porque está do outro lado da cidade que não podemos valorizar. A ideia é espalhar comida boa, não separar as regiões."


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