Folha de S. Paulo


'Depredar fast-food tem um significado', diz manifestante 'black bloc'

Sentado num banco da praça da República, Danilo Henrique, 32, mexe no suspensório e deixa à mostra uma cicatriz que começa no cotovelo e termina no ombro. "Foram cinco pinos", conta. "Porrada de cassetete na Marcha da Maconha de 2011."

Naquele ano, foi entrevistado pela Folha por participar de inusitada caminhada de skinheads anti-homofobia. "É como se eu andasse com uma setinha: aqui, anarquista, skinhead e homossexual, bata nele", disse então.

A sãopaulo o reencontrou nas ruas em junho, com lenço escuro no rosto. "Sou passivo, não pacifista", ironiza. Ele defende agir contra a lei e depredar patrimônio privado se as ações tiverem "finalidade". No caso, "derrubar bancos e corporações que exploram gente vulnerável".

Há duas semanas, Danilo saiu do apartamento no centro onde mora com o companheiro há 12 anos para ir à casa do senador Eduardo Suplicy, que queria "entender a tática" dos mascarados. Na última quinta, o petista leu uma carta sua no Senado.

sãopaulo - Como se tornou 'black bloc'?
Danilo Henrique - Quem sempre fez ações diretas na cidade, enfrentando polícia e quebrando patrimônio privado, foi o movimento punk. Comecei assim. Os punks foram a vanguarda do que hoje é o 'black bloc', que só trocou os moicanos por panos na cara.

Está sempre mascarado nos atos?
Não, só quando eu sei que vai ter conflito e que vamos acabar quebrando alguma coisa. Tem dias que saio de cara limpa porque acho que vai ser tranquilo.

Quais são os alvos dessas ações?
Derrubar bancos e corporações que exploram gente vulnerável. Óbvio que não vamos atacar famílias, trabalhadores, apartamentos. As ações não são aleatórias como muita gente quer acreditar.

O quebra-quebra não queima o filme do movimento?
Se quebrar uma loja tem mais importância do que um manifestante perder um olho com um tiro, há algo de errado. Vitrine de vidro não sente dor.

Então a tática é bem-sucedida?
O preço da passagem caiu porque houve depredação. Mas a repressão só cresce. Uma amiga presa em Bangu, no Rio, foi pega num acampamento [no centro carioca] com isqueiro e bombinha de asma.

Mas e a parcela da população que se afastou das manifestações?
Tem muito moleque de máscara fazendo merda, fora os infiltrados. Difícil controlar. E sei que é difícil convencer um pai de família que tem aluguel para pagar a ir às ruas para lutar por seus direitos.

Mora sozinho?
Sou casado. Casado não, moro junto. Não acredito que o Estado tenha que reconhecer quem mora comigo. O Marcos tem 66 anos, estamos juntos há 12.

Então é um 'black bloc' família...
[Gargalha] A gente vive numa sociedade de mercado, né? Tudo é mercadoria. Esse é meu rótulo, então.

Ezyê Moleda/Folhapress
'Depredar fast-food tem um significado', diz o 'black bloc' Danilo Henrique
'Depredar fast-food tem um significado', diz o 'black bloc' Danilo Henrique

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