Folha de S. Paulo


Guia feito por artistas dá o caminho das pedras para comer bem e barato no Pari

O cheiro de comida vem até a calçada. Do lado de dentro, pessoas batem papo num idioma complicado.

Elas comem nas salas e nos quartos do sobrado, em meio a roupas, móveis e objetos pessoais.

No banheiro estão os cosméticos e acessórios de dona Sônia, a proprietária da casa. Do lado de fora, nenhuma placa ou indicação de que ali funciona um dos restaurantes coreanos mais autênticos da cidade.

A Casa da Sônia está entre os achados do novo "Guia San Pablo", que constrói um mapa gastronômico alternativo de um dos bairros mais antigos (e esquecidos) da cidade: o Pari, na zona leste.

Criado por três amigos --o ilustrador paulistano Fabrizio Lenci, 25, o fotógrafo argentino Pablo Saborido, 33, e o publicitário colombiano Nicolas Llano, 30--, o projeto surgiu para celebrar a diversidade da cidade.

Daí vem a escolha do Pari, colônia de imigração italiana do início do século passado --e que recebeu árabes durante a Segunda Guerra, coreanos nos anos 1980 e, mais recentemente, caravanas de bolivianos (atualmente, a segunda maior população de imigrantes da cidade).

A riqueza desses sotaques traduz-se em sabores, segundo os autores.

Bom exemplo é o shawarma (tipo de sanduíche árabe) do restaurante turco Zellaya, que custa R$ 8. Os turcos também são donos do açougue de onde vêm as carnes. "É o mais barato e o melhor que já comi em São Paulo", diz Saborido, o fotógrafo.

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TORTA NA CARA

Preço, aliás, também é um dos critérios de curadoria do guia.

"Vivemos uma hiperinflação no mercado alimentício em SP. Uma tortinha pode custar R$ 40. Nossa ideia é questionar isso: vale a pena pagar só para ver e ser visto?", diz Lenci.

No total, dez restaurantes (um deles só abre aos domingos), duas mercearias e um café compõem o cardápio gastronômico da publicação de bolso, com 80 páginas.

O guia revela as fachadas dos estabelecimentos com ilustrações feitas em nanquim. As fotografias mostram seus donos, quitutes e os principais ingredientes.

Os textos dão dicas sobre o que comer --e do que se deve ficar longe.

"Não adianta o lugar ser superoriginal, mas com comida ruim. Num restaurante, o quibe cru era horrível, mas a costela no bafo era fantástica. A dica está no guia", diz Lenci.

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O processo de pesquisa e produção do impresso durou mais ou menos seis meses. Boa parte desse tempo foi usada para conquistar a atenção dos donos e garantir sua confiança --um processo nem sempre fácil para o trio.

"Em um dos locais, chegaram a pegar um facão quando chegamos. No fim deu tudo certo, e o facão saiu incrível nas fotos", conta Saborido.

Com tiragem de apenas 200 unidades, a publicação será lançada na Feira de Arte Impressa Tijuana (sábado e domingo que vem, na Casa do Povo, região central). O preço ainda não foi decidido.

Todo o "Guia San Pablo" é mesmo encarado como objeto de arte: além das ilustrações, das fotografias e da baixa tiragem, ele foi costurado manualmente por pacientes com dificuldades psiquiátricas de um projeto de saúde mental em Guarulhos.

Feira de Arte Impressa Tijuana
Sábado (27) e domingo (28)
Casa do Povo: Rua Três Rios, 252, Bom Retiro, São Paulo


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