Folha de S. Paulo


Gilberto Carvalho me ameaçou, diz candidato a governador do DF Arruda

O ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda, 60, está de volta à política. Filiado ao PR, pretende reconquistar nas urnas neste ano a cadeira que perdeu em 2010 após o escândalo conhecido como mensalão do DEM –sua legenda à época.

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Ele não está vetado pela Lei da Ficha Limpa porque não foi condenado por um órgão colegiado. Ao explicar seu envolvimento no mensalão do DEM, quando apareceu em um vídeo recebendo dinheiro em espécie, Arruda diz ter sido vítima de um "golpe" engendrado pelo PT, cujo "artífice" foi o atual governador de Brasília, o petista Agnelo Queiroz.

Em entrevista ao programa Poder e Política, da Folha e do "UOL", sua narrativa inclui uma suposta ameaça recebida de Gilberto Carvalho, com quem esteve em setembro de 2009, um pouco antes da eclosão do escândalo. Naquele período, Carvalho era chefe do Gabinete Pessoal do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Ele foi me pressionar: 'Ou você muda de partido ou você vai cair'. Foi um recado muito claro que recebi", diz Arruda. "O que ele fez de maneira velada foi uma ameaça".

Também nessa época, antes do escândalo, Arruda recebeu em almoço Dilma Rousseff e Erenice Guerra. Dilma era ministra da Casa Civil. Erenice, a secretária-executiva (a número dois do Ministério). Ambas também teriam sugerido a Arruda que abandonasse o DEM e que se filiasse a alguma legenda da base governista federal, preferencialmente o PMDB.

O que disse Dilma nessa ocasião? "A mesma coisa: 'Olha, você não quer mudar de partido para me apoiar?' ", relata.

Dias depois desses encontros, Arruda viu sua carreira desmoronar com o surgimento de gravações em vídeo mostrando políticos de Brasília, inclusive ele, recebendo dinheiro em espécie.

Sua explicação para o seu vídeo tem duas partes. Primeiro, responde que a gravação é de 2005, quando era deputado federal, e não governador. Segundo, afirma que pegou o dinheiro, mas que não ficou com os recursos. "Não há na gravação nenhuma cena que mostra eu levando o dinheiro. Eu não levei. Eu devolvi". Onde está essa cena da devolução? Segundo Arruda, foi cortada numa edição.

Quando esteve preso por dois meses, em 2010, declara ter sido procurado pelo então diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa. Qual foi o conteúdo da conversa? "Ele me propõe: 'Fale o nome de políticos do DEM e do PSDB que você, por ventura, tenha ajudado e você sai daqui amanhã. Não precisa dizer muita gente, diz só o nome do Arthur Virgílio, do Marconi Perillo e do José Agripino.

Líder na disputa pelo governo de Brasília segundo pesquisas locais realizadas em junho, Arruda tem de 25% a 30%, conforme o instituto. Para presidente, ele votará em Aécio Neves (PSDB). "Contra o PT", explica.

OUTRO LADO

O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) classificou de "absoluta invenção" as declarações de Arruda.

Por meio de sua assessoria, Carvalho afirmou: "Jamais discuti questões partidárias com esse cidadão. Seu relato é uma absoluta invenção. É tão verdadeiro quanto a honestidade dele".

O governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, declarou, via assessoria, que Arruda "tenta, num golpe teatral, manipular a informação e enganar a população mais uma vez".

"Arruda é conhecido como um mentiroso contumaz. Não entendo porque Arruda insiste em mentir tanto. Isso me parece doentio, incorrigível", afirmou Agnelo.

Procurada, a assessoria da presidente Dilma Rousseff afirmou que ela não iria comentar. A Folha não conseguiu contato com o ex-diretor da Polícia Federal Luiz Fernando Corrêa, nem com a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra.

A seguir, trechos da entrevista concedida em 4 de julho de 2014:

*

Folha/UOL - Por que o sr. deseja voltar a ser governador de Brasília?
José Roberto Arruda - Só tinha dois caminhos na minha vida. Considerar que o golpe que o PT me deu para me tirar do governo tinha fundo de verdade e que, portanto, sou culpado do que eles me acusam. Ou a segunda opção: voltar, botar a cara a tapa, dar as explicações que eu considero que são da minha obrigação. Tenho que dar essas explicações à sociedade e pedir para a população comparar o que foram os três anos do meu governo com o que foram os quatro anos do governo que me sucedeu.
Aqueles que me tiraram do poder sorrateiramente em um golpe midiático muito bem dado não se prepararam para governar. Mergulharam Brasília em um caos. Essa é a chance da minha vida, de passar a limpo essa página triste da política brasileira.

O sr. diz que foi um golpe. Mas havia elementos concretos, evidências de algum comprometimento seu no escândalo que ficou conhecido como Operação Caixa de Pandora. Como o sr. responde a isso?
É muito simples. Para você fazer um escândalo midiático basta você pegar fitas gravadas maldosamente. Quem grava conversa com alguém sorrateiramente já o faz prevendo alguma chantagem, algum tipo de coisa escusa. Para você fazer um golpe midiático basta você editar essas fitas, mexer nas datas e como visualmente elas são fortes, eles tiveram êxito.

O sr. falou visualmente. De fato, há um dos vídeos em que o sr. aparece recebendo dinheiro em espécie. Não é suficientemente forte para comprovar o seu envolvimento e sua culpa no episódio?
Vamos imaginar que aqui agora eu lhe entregasse um dinheiro. Você recebe e grava. Em seguida você diz: "Não, Arruda, eu não quero esse dinheiro", e me devolve. Essa parte da fita foi cortada. Quem diz isso não sou, é o laudo da Polícia Federal que consta dos autos.

Mas o sr. não devolveu aquele dinheiro.
Devolvi o dinheiro. Agora a doação...

Tem a fita? Tem a gravação em vídeo do sr. devolvendo?
Claro que não. Ele cortou. Mas tem o laudo da Polícia Federal dizendo que ele cortou. E agora tem mais. Tem a declaração dele próprio, o delator, em juízo, assumindo que editou maldosamente. Mas tem mais. Me permita explicar. Tinha os vídeos também de vários deputados recebendo dinheiro do mesmo triste personagem.

Alguns apareceram...
Vários. Muitos não apareceram, é verdade. Esses vídeos foram periciados pela Polícia Federal. E o que as perícias da Polícia Federal mostram é que todos os vídeos, de todos os deputados, são anteriores ao meu governo. E tem mais: a doação que a empresa Dot Paper, ligada à então esposa desse cidadão, fez a minha pré-campanha...

Esse cidadão é o que gravou, Durval Barbosa?
Isso. A doação que a esposa dele fez à pré-campanha, campanhas que fazíamos em todos os Natais, está registrada no TRE. Levamos muito tempo para conseguir esse registro no TRE e resgatá-lo, mas hoje já faz parte dos autos jurídicos.
Durante quatro anos, depois de toda a tragédia que me tirou do governo, fui preso, humilhado, execrado na opinião pública. Estou conseguindo provar na Justiça que tudo aquilo foi uma montagem e foi um golpe.

Em resumo o sr. está dizendo que aquela gravação em que o sr. aparece recebendo dinheiro é de antes do seu governo, de 2005, e que o sr. recebeu dinheiro e devolveu o dinheiro?
No mesmo ato em que ele me dá R$ 30 mil e diz que é uma doação da empresa da mulher, Dot Paper, eu digo: "Olha, não me sinto confortável com isso. Faça a doação na conta certa com os recibos". Muito bem. Ele pega o dinheiro de volta, sai de cena. Ele sabia que estava sendo gravado. Ele sai da cena da gravação e depois maquiavelicamente deixa sobre a mesa um brinde da empresa que ele dirigia que eu acabei levando. Não há na gravação nenhuma cena que mostra eu levando o dinheiro. Eu não levei. Eu devolvi a ele.
Esse dinheiro, de qualquer maneira, ele acabou doando em outro em outro momento. E essa doação que ele fez está registrada no TRE. Em resumo, não recebi nenhum dinheiro nem na campanha, nem na pré-campanha, que não tenha sido registrado de acordo com a lei no TRE.

Onde foi esse episódio?
Era no escritório dele.

Pois bem. O sr. era deputado federal e era pré-candidato ao Governo do Distrito Federal. Houve esse episódio. Havia suspeita sobre essa pessoa. No seu governo, essa pessoa continuou na sua administração. Como o sr. explica isso?
Isso é um erro. Na verdade foi um assessor de nada. Era um assessor sem gestão orçamentária...

Por que o sr. foi dar cargo de assessor para essa pessoa?
Porque o irmão era deputado. Considero que esse foi um erro. A diferença é que esse é um erro político de deixar uma pessoa desse perfil com um cargo no governo por mais insignificante que seja. Na verdade, quando o irmão dele se elegeu deputado, o irmão desejava que ele, Durval, continuasse presidindo a estatal de informática. Eu não permiti.
Mais do que isso. No meu primeiro ano de governo, reduzi de R$ 530 milhões o gasto anual médio com informática para apenas R$ 34 milhões. Eu o retirei da presidência da Codeplan [Companhia de Planejamento do Distrito Federal]. Não deixei que voltasse. Veio o irmão e pediu que ele, pelo menos, tivesse uma assessoria. Falando português claro: esse erro eu cometi. Um erro de avaliação. Não deveria ter permitido. Da mesma forma que a presidente Dilma, o presidente Lula, o presidente Fernando Henrique, atendendo pedidos políticos, podem ter deixado nos seus respectivos governos pessoas que não deveriam. Paguei um preço muito alto por isso, mas o que estou dizendo é que não cometi os crimes dos quais fui acusado.

Essa narrativa que o sr. apresenta terá acolhida na opinião pública, na sua opinião?
Esse é o meu desafio. Tenho de responder a todas as perguntas que serão feitas. Comprová-las com documentos. Coloquei no ar um site, o www.golpede2009.com.br. Lá estão os laudos da Polícia Federal que mostram que aquelas fitas de deputados recebendo dinheiro eram todas anteriores ao meu governo. O site mostra que as doações que recebi, inclusive trazidas por esse triste personagem, foram declaradas ao TRE. Lá nesse site estão as declarações do delator, em juízo, dizendo que eu não tinha conhecimento da ilicitude da origem dos recursos que ele doou.
O que esse sujeito montou? Ele tentou dar dinheiro para tudo que era candidato em Brasília. Quem ganhasse a eleição ele chantagearia. E tentou me chantagear. Agora, o mais incrível, o fez em conluio com membros de alto escalão do Ministério Público local. Quem diz isso não sou eu. Quem diz isso é uma ação penal movida por um procurador do Ministério Público Federal, Ronaldo Albo. É uma ação penal em curso na Justiça Federal na qual afirma que eu, Arruda, fui vítima de uma chantagem feita por procuradores do próprio Ministério Público -que foram afastados- em conluio com o delator que queria o quê? Que no meu governo pudesse continuar roubando. Eu não permiti.
A política brasileira é feita de muitas hipocrisias e muitas vestais. Se não tivesse cortado o propinoduto, se tivesse deixado esse cidadão continuar presidente da estatal de informática, se não tivesse cortado os gastos com informática, nada teria acontecido.

Por que um deputado federal, prestes a ser eleito governador do Distrito Federal, vai ao escritório dessa personagem, Durval Barbosa, é apresentado a um bolo de dinheiro, pega o dinheiro na mão...
E devolve.

O sr. está dizendo que devolveu...
Não, aparece na cena. A cena está aí.

Mas por que um deputado federal vai lá e depois não sente nenhum estranhamento, não faz uma denúncia a respeito?
Como deputado federal, fiz um programa de visita a todos os órgãos de governo, federais e locais.
Quando cheguei à empresa que ele presidia, ele me convida para a sua sala e me oferece um café.
Ele sabia, pelo irmão, que eu fazia campanha sociais no Natal, comprovadas nos processos judiciais. Diz que queria fazer uma doação -e tenta fazê-la em dinheiro. Eu me senti desconfortável, tentei com elegância dizer que eu não receberia. Que ele fizesse a doação pelos meios legais, o que ele acabou fazendo. Essa doação, feita pelos meios legais, foi registrada no TRE.
O que não se pode é julgar a vida de uma pessoa interpretando 20 ou 30 segundos de uma fita que o laudo da Polícia Federal diz "foi editada". Que o laudo da Polícia Federal diz "foi muito antes de ele ser governador" e que o próprio autor da gravação espúria diz "eu editei".

Mas por que ao sair do local, ao se sentir incomodado, não tomou alguma providência? Foi uma tentativa de constranger um político dando dinheiro. Por que o sr. não reagiu e não fez uma denúncia?
Depois que passa é muito fácil. Como se pode ver pelo próprio processo, ele fez doações desse tipo a "n" políticos de praticamente todos os partidos. Não me consta que ninguém tenha tido essa visão.
O atual governador de Brasília, Agnelo Queiroz, quando prepara o golpe contra mim vai ao mesmo escritório do Durval, negocia com ele uma compensação no seu governo caso o Durval fizesse a delação para me derrubar. O Durval também grava essa fita. Essa fita vai ao conhecimento da revista "Veja", que a publica e, inexplicavelmente, essa fita da gravação do Durval com o Agnelo foi arrancada dos autos. Mais grave: uma advogada, dra. Cristiane, que teria sido assessora do Durval e teria ligações muito fortes com autoridades do governo federal, dá um depoimento de oito horas na Polícia Federal contando todo o subterrâneo desse golpe, mostrando como altas autoridades do governo federal agiram para cooptar o delator, dar a ele os prêmios judiciais que ele está tendo e, com isso, me tirar do governo, me tirar da eleição de 2010 para que o Agnelo pudesse ganhar a eleição.
É incrível, mas essas oito horas de depoimento na Polícia Federal, com a confirmação dos delegados e dos membros do Ministério Público Federal, foi arrancado dos autos.

Arrancado, como?
Tirado. As folhas foram tiradas.

Mas existe.
Existe e não aparece. Nossos advogados peticionam porque o meu objetivo de vida é comprovar o golpe. Vou comprovar como que o PT usa o aparelho do Estado para destruir adversários políticos. É assim o jogo deles.

Mas foi só o PT?
Pode ter tido outros aliados.

O sr. era filiado a um partido político, o Democratas, antigo PFL.
Verdade.

O seu ex-partido tem pessoas experientes. E o sr. foi praticamente chutado para fora do seu partido à época. O Democratas, ex-PFL, não me consta que seja aliado ao PT. Se toda essa narrativa que o sr. apresenta de fato é a expressão da verdade, como é possível que naquelas reuniões todas, que houve do sr. com o DEM, ninguém tenha abraçado essa sua narrativa?
O meu principal algoz dos Democratas foi o senador Demóstenes [Torres].

Mas houve outros. O senador José Agripino Maia, que é presidente nacional do Democratas, até hoje repele o sr. Inclusive, o sr. queria o apoio dos Democratas neste ano e ele vetou.
O que há na política brasileira é um jogo de faz de conta. É o jogo da hipocrisia. É um monte de vestais paridas querendo ser os caudatários únicos da ética. Quando aconteceu o episódio comigo e antes mesmo que eu pudesse apresentar as minhas explicações...

O sr. apresentou várias vezes essas explicações na época...
Posso concluir?

Diga.
Antes que eu pudesse apresentar as explicações, ainda naquela execração pública que eu passava, qualquer palavra que dissesse era insignificante perto das fortes imagens que eram apresentadas todos os dias na televisão -políticos recebendo dinheiro em espécie.
Antes de qualquer coisa, o senador Demóstenes pede a minha expulsão do partido. As lideranças do meu partido realmente foram fracas. Quiseram ficar livres do problema. Por quê? Porque sabiam que o PT me pegou para Cristo, para criar uma figura do mensalão do DEM para se contrapor ao mensalão do PT que seria usado na campanha de 2010. E aí tiraram o corpo fora.

O sr. depois foi acusado de enviar um emissário que teria feito uma entrega de R$ 200 mil a uma das testemunhas da Operação Caixa de Pandora...
Fui acusado de cooptar uma testemunha.

O que aconteceu?
Sou o único brasileiro que foi preso em flagrante sem estar na cena do flagrante. Não aconteceu nada. Os dois personagens, [Antônio] Bento [da Silva] e [Edson] Sombra, tinham aqui em Brasília um pequeno um blog e dividiam a mesma sala. Montaram uma farsa de um entregar o dinheiro um para o outro.
Imagine dividir a mesma sala com o companheiro de trabalho, onde só vocês dois trabalham. Vai entregar algo e escolhe uma lanchonete. Os dois vão para a lanchonete e avisam a polícia. Montaram um flagrante. Não há nenhuma ligação telefônica pessoal minha com nenhum dos dois.

E de seus assessores à época?
Não há nenhuma ligação de nenhum assessor meu com nenhum dos dois. Ainda assim, fui preso em flagrante.
Cometeu-se ali uma insanidade jurídica. No regime democrático, um governador para ser processado tem que ter autorização do Poder Legislativo. Um presidente da República para ser processado tem que ter autorização do Congresso Nacional. Antes de ser processado eu fui preso, sem autorização do Poder Legislativo. O que significa que se esse precedente for juridicamente válido, amanhã o Supremo Tribunal Federal pode prender um presidente da República sem a autorização do Congresso.
Por isso, afirmo: o que se fez comigo foi um golpe. Tanto é verdade que o ministro Gilberto Carvalho, estou dizendo isto aqui pela primeira vez, 15 dias antes do dia 27 de setembro vai à residência oficial do governador e diz com todas as letras: "Mude de partido".

O que ele disse?
"Mude de partido", "venha para um partido da base do presidente Lula", com quem, aliás, eu me relacionava muito bem.

Ainda era possível mudar de partido porque se estava a mais de um ano antes da eleição de 2010.
Eu me recusei.

Por que ele sugeriu isso ao sr.?
Ele foi me pressionar: "Ou você muda de partido ou você vai cair". Em resumo, é isso. Foi um recado muito claro que recebi.

Quando eclodiu o episódio da delação contra o sr.?
A delação foi no dia 16 de setembro de 2009. Ele me visitou na primeira quinzena de setembro. Almoçou comigo.

E daí?
Eu tinha uma relação pessoal e política muito respeitosa, muito boa com o presidente Lula.

O sr. está dizendo que o então secretário do Gabinete Pessoal do então presidente Lula o visitou na residência oficial do governo do Distrito Federal e sugeriu ao sr. alguns dias antes da apresentação da denúncia que o sr. mudasse de partido? É isso?
Estou afirmando isso. Estou afirmando mais: logo depois desse encontro com o ministro Gilberto Carvalho, que eu disse da minha dificuldade, que eu não mudaria de partido, que eu tinha um compromisso com o DEM, também fui visitado pela então pré-candidata Dilma [Rousseff] na companhia da sra. Erenice [Guerra]. As duas também almoçaram comigo.

Antes da apresentação da denúncia?
Não havia denúncia.

E o que foi dito nesse almoço?
A mesma coisa: "Olha, você não quer mudar de partido para me apoiar?". O que a presidente Dilma me disse foi isso. Eu disse: "Não, não posso". Disse: "Eu me relaciono muito bem com o presidente, gosto muito da sra., mas eu sou de um partido de oposição".

Mas por que eles queriam que o sr. mudasse de partido se já tinham pessoas no PT sendo preparadas para tentar derrotá-lo em Brasília?
Porque a chance de eles ganharem as eleições era zero. Ou eles me derrubavam num golpe, como me derrubaram. Eu tinha 80% de aprovação.

Mas o sr. acha que Gilberto Carvalho, Dilma Rousseff, Erenice Guerra, como o sr. cita, tinham conhecimento disso que o sr. chama de golpe?
Absolutamente. Não tenho nenhuma dúvida.
A verdade vai aparecer.

O sr. está afirmando aqui que houve um golpe preparado para retirá-lo do cargo de governador do Distrito Federal, em 2009 e início de 2010, quando se consumou a sua saída. Que Agnelo Queiroz, que é o atual governador de Brasília, do PT, foi um dos artífices desse golpe?
É isso. Mais do que isso. Como artífice do golpe, ele fez um acordo com o delator. "Você me ajuda a editar as fitas, a mudar as datas delas, derruba o Arruda, eu vou ganhar a eleição, e, quando eu ganhar a eleição, o que o Arruda não te deu, eu vou te dar". Eu fiquei quietinho, esperando. Sabe o que aconteceu? O chefe de gabinete do Durval Barbosa, o delator, no governo do Agnelo foi alçado à condição de presidente da Comissão de Licitação que houve no governo para todo o sistema de transporte coletivo. Ou seja, ele não apenas fez um acordo com o delator para me derrubar, como no governo dele pagou a fatura a este réu confesso.

Mas Gilberto Carvalho e Dilma Rousseff estavam cientes dessa operação? Eles mencionaram para o sr., de maneira direta, que ou o sr. os apoiava ou o sr. seria derrubado?
Não. O Gilberto Carvalho deu a entender isso.

De que forma?
"Olha, vai ser melhor para você, você não corre riscos". Basicamente isso. A presidente Dilma, na época candidata, fez uma visita elegante. A dra. Erenice a acompanhou. E as duas pediram para que eu mudasse de partido e pudesse apoiar a Dilma e não apoiasse o Serra.

Para qual partido?
Sugeriram várias hipóteses.

Quais eram elas?
Não me lembro, mas acho que o PMDB era uma delas. O próprio presidente Lula chegou a me fazer esse convite. Mas isso, dentro de um jogo legítimo da política. O que me assustou foi a conversa com o Gilberto Carvalho. Nessa conversa, uma conversa sorrateira, ele deixou claro: "Vem pra cá enquanto é tempo".

Ele falou essa frase?
Olha, eu não gravo ninguém. Não me lembro também, cinco anos depois, quais as palavras usadas. Seria leviano...

Mas o sentido, qual foi?
O sentido era esse.

Qual era?
"Venha nos apoiar. Venha para a base do governo enquanto é tempo".

Quando o sr. recebeu, em meados de setembro de 2009, Gilberto Carvalho, o sr. já estava sendo chantageado?
Ficou claro para mim também que ele já sabia.

Como que o sr. sabe que ele sabia?
O que ele foi fazer na minha casa?

Não sei.
Dizer para eu mudar. Bom, está aí. Eu adoraria debater esse tema com ele. Seria muito interessante...

O sr. acha que ele foi na sua casa ameaçá-lo, é isso?
Não tenho a menor dúvida. Olhando sob os olhos de hoje, dúvida nenhuma. Não foi a única vez. Depois que eu fui preso, em uma celinha de 2 por 3 metros, sem banheiro, sem janela, com luz acessa 24 horas por dia, quem vai à minha cela?

Quem?
O dr. Luiz Fernando Corrêa, então diretor-geral da Polícia Federal. E o que ele me propõe?

O que ele propõe?
Ele me propõe: "Fale o nome de políticos do DEM e do PSDB que você, por ventura, tenha ajudado e você sai daqui amanhã". E eu respondi: "Vocês não me conhecem. Eu saio daqui morto, mas não perco meu caráter". Ele disse: "Não, não precisa dizer muita gente, diz só o nome do Arthur Virgílio, do Marconi Perillo e do José Agripino".
Quem fez isso não foi um agente, não foi um delegado. Foi o próprio diretor-geral da Polícia Federal à época.

O sr. está acusando o então diretor-geral da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, de ter proposto ao sr. um acordo de delação. É isso?
Estou contando uma visita que ele me fez. Não sou advogado e não vou colocar entre aspas qual nome isso tem.

Quando alguém supostamente participa de algum esquema de corrupção, é natural que seja procurado pelas autoridades, que vão sempre dizer: "Conte o que você sabe, é melhor para você". Não é assim?
Desculpa. Isso seria natural se o delegado responsável pela investigação tivesse ido à minha cela. Isso seria natural se o membro do Ministério Público que me acusasse tivesse ido me interrogar. Não foi. Nenhum dos dois. Nunca me ouviram. Quem foi lá foi o diretor-geral da Polícia Federal. Detalhe: meses antes, a meu pedido, havia indicado o seu próprio chefe de gabinete, dr. Wilmar, como meu secretário de Segurança Pública, que também, inexplicavelmente, quinze dias antes havia deixado o governo.

Mas chama a atenção o fato de o sr. não ter apresentado nenhum elemento de prova contra alguns políticos que poderiam ter se beneficiado desse esquema -até porque, existiu de fato um esquema...
Por quê?

Por quê?
Muito simples. O processo judicial responde. Esse esquema de desvio de dinheiro público para beneficiar político, está provado nos autos pelas perícias da Polícia Federal, foi anterior ao meu governo.

O sr. acusa o PT de armar um golpe contra o sr. Envolve o nome de Gilberto Carvalho, que é uma pessoa muito ligada ao governo Lula e agora está no governo Dilma. Neste momento eleitoral, não pode parecer que o sr. está apenas encontrando um argumento para usar durante a campanha?
Essa visita eu nunca escondi. A única diferença é que no auge do episódio a única coisa que interessava, e eu entendo isso pela força das imagens, eram as tais fitas.

Mas o sr. acabou de dizer "estou dizendo isto aqui pela primeira vez" ao citar Gilberto Carvalho...
O que eu disse é o seguinte: fiquei quatro anos em silêncio. No episódio eu tentei me defender. Na época do escândalo, isso tudo foi dito. E teve mais. O advogado que me defendia, no momento em que eu estava preso e não aceitei falar mal de ninguém, e não aceitei renunciar ao mandato, ele me deixou. Quem é esse advogado? O dr. [José Gerardo] Grossi, que hoje hospeda no seu escritório o José Dirceu.

O sr. registrou sua candidatura ao governo de Brasília. A sua candidatura não será atingida pela Lei da Ficha Limpa?
É um teste da democracia brasileira.

Qual é a lógica de o sr. não ser atingido pela Lei da Ficha Limpa? Como explicar isso para um eleitor comum?
A Justiça agiu, os processos andaram e eu não tive nenhuma condenação de segunda instância. A única condenação que tive na primeira instância, o juiz foi considerado suspeito pelo STJ. Ninguém pode ser considerado culpado se a Justiça não o faz. Não tenho dúvida que vou vencer todos esses processos.

Para finalizar o caso da acusação que o sr. faz de ter sido alvo de um golpe. Quem no PT tinha conhecimento?
O governador Agnelo declarou em um blog pessoal que realmente fez a visita ao Durval, viu as fitas e ajudou a levá-lo ao Ministério Público para a delação. Então sobre este cidadão não há a menor dúvida.
Inclusive as pessoas que viram a fita [da conversa entre Durval e Agnelo] dizem que quando Durval fala que podia editar as fitas e embaralhar a opinião pública pegando fitas antigas e dizendo que eram do meu governo, ele [Agnelo] comemorou dizendo: "Então eu vou ganhar a eleição". Eu quero ver essa fita. Ela tem que aparecer.

E outros integrantes da direção do PT? Sabiam o quê?
Sobre a visita do dr. Gilberto Carvalho não há dúvidas. Há os apontamentos oficiais que falam da sua visita e o que ele fez de maneira velada foi uma ameaça: "Ou vem para o nosso lado, ou você vai enfrentar muitas dificuldades".
Sobre a visita, também que já saiu na imprensa, da então candidata Dilma acompanhada da dra. Erenice, elas foram me fazer um convite para mudar de partido, que eu não aceitei.

O sr. conta uma história com começo, meio e fim de acordo com o seu entendimento. Mas em 2011 o sr. fez a mesma coisa a ser acusado de participar da violação do painel de votação do Senado. Depois, ficou impossível negar e o sr. admitiu que havia mentido na versão anterior. Esse seu histórico de 2001 compromete a sua narrativa atual?
Ao contrário, fortalece. Você acha que eu fui o único senador em 2001 que vi a lista de votação?

Não, foram vários os senadores.
Inclusive o "Jornal do Brasil" à época publicou a lista. Os outros senadores que resolveram continuar mentindo, dizer que não tinham visto, continuam aí posando de vestais na política brasileira.

O sr. tomou uma decisão difícil porque ficou inevitável...
Se ficou inevitável para mim por que não ficou para eles?

Porque não havia elementos de prova de que eles estavam mentindo.
Havia todos os elementos de prova. Todos os elementos de prova, inclusive a matéria publicada no "Jornal do Brasil" com gente que tinha votado de um jeito e votou de outro.

Conheço esse episódio. Tenho fundadas suspeitas de que muitos senadores tiveram acesso [aos dados da votação secreta no Senado], só que não tenho como provar. No seu caso havia depoimentos, havia mais elementos comprobatórios. Foi por isso que entendo que o sr. teve que admitir.
Respeito a sua opinião e posso lhe garantir que se eu tivesse me mantido calado o senador...

...O sr. teria sido cassado.
Estou te afirmando que se eu tivesse ficado calado, e o senador Antônio Carlos [Magalhães] também, nada teria acontecido para ninguém. O acordo no Senado estava feito para segurar todo mundo. Rompi com isso porque, restabelecendo a verdade, pedi desculpas por ter entrado no "combinemos" anterior. Falei a verdade e pude ir para as ruas de cara limpa. Por isso, em 2002, fui eleito deputado federal com a maior votação da história da República brasileira, em termos proporcionais.

Quem vai apoiá-lo na sua campanha para governador do Distrito Federal?
Eu espero que a população de Brasília.

E em termos de partido? O seu próprio, o PR...
Sou filiado ao PR. Temos um entendimento com o PTB e no plano local tem mais quatro ou cinco partidos que nos apoiam.

Alguns partidos anunciaram que iam apoiá-lo e as suas direções nacionais vetaram. O que aconteceu?
É uma questão interna de cada partido. Os atos jurídicos foram perfeitos nas respectivas convenções e a legislação eleitoral brasileira é clara: ninguém pode desrespeitar as convenções partidárias.
Terei algo como três minutos de televisão. O atual governador terá algo como 12 minutos de televisão.
Mais uma vez, o governador Agnelo usa para fazer as suas alianças meios ilícitos, espúrios. Os acordos que o governador Agnelo está fazendo com vários partidos políticos para apoiá-lo pressupõem a entrega de milhares e milhares de cargos públicos de livre provimento, pressupõem verbas oficiais de publicidade no período eleitoral, pressupõem ilegalidades flagrantes.

Na campanha pelo governo do Distrito Federal o sr. fará declaração de apoio a algum dos candidatos a presidente da República?
O meu voto é contra o PT. Considero, neste momento, que quem tem as melhores condições de resgatar o Brasil dessa ditadura partidária e de soltar o freio de mão da economia brasileira, de repensar o papel de Estado brasileiro, é o candidato Aécio Neves. É nele que vou votar.

O sr. espera tê-lo no seu palanque fazendo campanha, de mãos dadas, em Brasília?
Não, não espero. O partido dele tem um candidato que está cumprindo o seu papel.

Colaborou AGUIRRE TALENTO, de Brasília

Acesse a transcrição completa da entrevista.

*

A seguir, os vídeos da entrevista (rodam em smartphones e tablets):

1) Principais trechos da entrevista com José Roberto Arruda (11:10)

2) Peguei o dinheiro, mas devolvi, diz Arruda (2:48)

3) Vídeo do dinheiro é anterior a eu ser governador, diz Arruda (1:57)

4) Sou candidato para livrar Brasília e o Brasil do PT, diz Arruda (1:41)

5) Agnelo foi artífice do golpe que me derrubou, diz Arruda (2:36)

6) Gilberto Carvalho me ameaçou e sugeriu-me sair do DEM, diz Arruda (3:02)

7) Dilma e Erenice me visitaram e sabiam da trama, diz Arruda (1:40)

8) Diretor da PF propôs que eu delatasse políticos do PSDB e DEM, diz Arruda (1:40)

9) Fora da Ficha Lima: 'Não tive condenação de 2ª instância', diz Arruda (1:03)

10) Em 2001, admiti violação do painel para ir às ruas de cara limpa, diz Arruda (2:43)

11) Vou votar em Aécio, contra o PT, diz Arruda (1:15)

12) Quem é José Roberto Arruda? (2:50)

13) Íntegra da entrevista com José Roberto Arruda

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