Folha de S. Paulo


Leia a transcrição da entrevista de Aécio Neves à Folha e ao UOL - Parte 2

Aécio Neves, senador e pré-candidato do PSDB à Presidência da República, participou do Poder e Política , programa da Folha e do "UOL" conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues . A gravação ocorreu no dia 20 de maio de 2014 no estúdio do Grupo Folha em Brasília.

http://www3.uol.com.br/module/playlist-videos/2014/aecio-neves-no-poder-e-politica-1400713554027.js

Deixa eu fazer um desvio, de novo, para a economia. A atual política de reajuste do salário mínimo, que tem dado reajustes acima da inflação para o salário mínimo, é a ideal para o Brasil e deve ser mantida?
O ganho real do salário mínimo será mantido. Essa é a política que nós temos aí. E para impedir que ela fosse mais um vez utilizada irresponsavelmente de forma eleitoreira, eu autorizei que o líder do meu partido na Câmara Federal, Antônio Imbassahy [PSDB-BA], assinasse uma proposta que prorroga para até 2019 essa política...

Essa fórmula.
Essa fórmula que está aí. Ganho real é uma conquista, e é uma conquista que não começa no governo do presidente Lula. Vou, talvez, vou-lhe fazer uma única pergunta: no governo do presidente Lula o ganho real do salário mínimo chegou a alguma coisa em torno de 54%, os oitos anos do presidente Lula. Sabe quanto foi no governo do presidente Fernando Henrique? 45,5%. Não é tão diferente assim, e em um momento em que nós debelávamos a hiperinflação e tínhamos um ambiente econômico muito menos favorável do que o que teve o presidente Lula, com crises sucessivas, enfim. O aumento do salário mínimo no governo da presidente Dilma não chega a 12%. Então querer trazer isso como uma conquista política e não como uma conquista dos trabalhadores é um grande equívoco. O aumento real do salário mínimo é uma conquista da classe trabalhadora e será mantida, só que no nosso governo, como nós vamos trabalhar efetivamente com tolerância zero em relação à inflação, esse ganho vai ser mais expressivo porque se ganha por um lado hoje e se perde com a inflação. Porque a inflação, Fernando, não é essa inflação que está aí, nós sabemos. Inflação de alimentos, há mais de quatro anos ela já ultrapassou os dois dígitos. Eu vi há pouco tempo uma análise nas regiões metropolitanas, de 14 capitais, a menor era 10%, região metropolitana de Salvador, e chegava a 17%. E alimentos, para quem ganha até três salários mínimos, corresponde a 30% da sua renda, da sua receita.

Sobre salário mínimo, é raro encontrar alguém que diga que vai parar com a política de reajuste real do salário mínimo. Agora, tem uma dúvida grande na cabeça das pessoas que acompanham a economia, que vem a ser o vínculo do salário mínimo com outros reajustes que ocorrem na economia, sobretudo no caso da Previdência. Como resolver isso?
Olha, é um desafio. Nós temos hoje uma caixa preta no Brasil, Fernando, uma caixa preta na previdência. Você se lembra, você acompanha muito de perto a economia, no começo do ano o ministro da Previdência disse que o déficit da Previdência era de R$ 50 bilhões. O ministro da Fazenda chamou atenção, que era de R$ 40 [bilhões] e demitiram o funcionário, o técnico que tinha apontado esse outro número. Não dá para você hoje entrar em detalhes, não pelo menos responsavelmente, estabelecer números ou medidas pontuais sem conhecer efetivamente a herança que nós vamos receber desse governo. Não há nada mais inconfiável hoje no Brasil do que dados desse governo, Fernando.

Mas a vinculação do reajuste do salário mínimo, que hoje existe, com as contribuições, os benefícios da Previdência é um fato real. Sem saber o rombo total. Isso é um fato. Isso deve ser mantido essa veiculação?
Não está no nosso norte, não está na nossa bússola hoje mexer nisso. Até porque nós temos...

Mas aí fica sustentável?
Fernando, eu espero que sim. Eu não vou aqui avançar em detalhes de, enfim, de políticas que nós vamos tomar sem conhecer efetivamente os números do governo. Seria uma irresponsabilidade da minha parte, até porque o rombo pode ser até maior do que se imagina. Superávit primário, 1,9% superávit anunciado, alcançado no ano passado. Eu tenho muita dúvida se isso aconteceu efetivamente. Metade disso, desse 1,9% foi [leilão do Campo de] Libra, R$ 15 bilhões, Refis, R$ 20 bilhões, 0,3% desse 1,9 bilhões, então já estamos passando para mais da metade, foram os pagamentos que o governo deixou de fazer no ano passado, passou para esse ano, inclusive transferências de saúde para Estados e municípios atrasando inclusive o dinheiro para hospitais e tudo mais. Então, esse foi o superávit que nos entregaram. Isso não é um superávit corrente. Nós não vamos ter por essas mesmas fontes, você concorda comigo, como alcançar o superávit proposto esse ano. Então o grande desafio é nós conhecermos efetivamente qual é o déficit real da Previdência, do ponto de vista fiscal, quais são efetivamente as fontes de receita que vão nos permitir alcançar o superávit desse ano, o efeito das desonerações, o que isso abalou efetivamente o caixa do Tesouro. Hoje você tem o Tesouro devendo ao BNDES. Você sabe disso. Uma fábula, chegou a ser R$ 17 bilhões atrás, fala-se em R$ 400 bilhões, como é que isso vai ser ajustado? Então hoje há uma caixa preta que precisa ser aberta, enquanto ela não estiver, você vai concordar comigo, ela não for aberta eu tenho que ter uma cautela enorme para falar das medidas que nós vamos eventualmente tomar.

Ainda sobre a reestruturação da organização do governo e da redução do número de ministérios. Quando a gente olha o número de ministérios, os suspeitos usuais para serem cortados são alguns muito simpáticos a alguns grupos da sociedade: Secretaria da Pesca, Secretaria da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos, das Mulheres. São secretarias com status de ministério. Posso entender que esses são os mais prováveis a serem cortados?
Fernando, me desculpe aqui dizer o seguinte: de gestão pública eu entendo, e Minas sabe que eu entendo. O que é importante é que tenhamos políticas públicas para inúmeros setores da sociedade que se sintam contemplados pelas políticas públicas, e não necessariamente pelo status ministerial dado a alguém. Os ministérios hoje, a grande verdade é essa, Fernando, não servem à população brasileira. O ministério não serve as pessoas ligadas à pesca, às pessoas que se preocupam com infraestrutura, às pessoas vinculadas às causas das minorias. Eles servem a pessoas individualmente. Os ministérios hoje servem para que o governo construa uma base política, ganha aí alguns segundos de televisão para tentar vencer as eleições. No momento em que nós invertemos essa lógica, e eu se vencer as eleições inverterei essa lógica, os ministérios, seja ministério, secretarias, virão para funcionar, terão metas para serem alcançadas. Eu fiz isso em Minas, Fernando. Em Minas 100% dos servidores têm meta para serem alcançadas. Eu acho que todos esses setores que eventualmente, ou outros, e aqui não tomei nenhuma decisão ainda porque esse estudo, inclusive, ainda não está pronto, deixarem de ter um cargo de ministro para orientar essas políticas, terão políticas muito mais eficazes, políticas com transparência, com metas a serem alcançadas e que atenderam aos interesses da população. Os ministérios atendem a partidos, hoje. Nós queremos, no futuro, que os ministérios atendam à população.

A convenção do seu partido PSDB nacional está marcada para o dia 14 de junho, de acordo com a lei tem que ser do dia 10 ao dia 30 de junho, quando o sr., ao que tudo indica, será indicado candidato a presidente pelo PSDB. Seus principais adversários hoje já têm nomeados, pré-nomeados, os seus candidatos a vice-presidente. A sua expectativa é que no dia 14 de junho o seu partido e o sr. estejam prontos para fazer a chapa completa ou isso não é um problema porque tem mais tempo até o dia 30?
É. Você coloca corretamente, Fernando. Eu poderia até o dia 30 estar definindo isso, mas pretendo definir até o dia 14. O que me deixa feliz, em primeiro lugar, é ter o PSDB completamente unido nessa caminhada, como jamais na sua história tem estado, um conjunto de forças políticas crescentes que se aproxima de nós, nomes extremamente qualificados que surgem até por geração espontânea alguns deles...

A quem o sr. está se referindo?
Temos muitos. Todos esses nomes que você falou que são válidos, que estão sendo apontados, são nomes extremamente qualificados. Se eu citar um eu vou excluir outro. Tem cinco ou seis nomes que recorrentemente citados extremamente qualificados e que poderiam honrar qualquer governo e qualquer trajetória eleitoral. Essa não será uma decisão individual do candidato, é uma decisão desse conjunto de forças que está no nosso entorno e será feito sem traumas. Eu acredito muito nas coisas naturais da política, Fernando, são essas que dão resultado. Então o que me preocuparia se eu não tivesse hoje alternativas. Como eu tenho várias alternativas, é como o Felipão na Seleção, está cheio de alternativas, ruim é quando você não tem nenhum time para escalar. Temos vários e tenho certeza que aquele que for o indicado, ou aquela que for a indicada terá o apoio, o entusiasmo daqueles que querem mudar o Brasil. A minha candidatura, Fernando, não é a candidatura do PSDB apenas, é a candidatura de um segmento de pensamento na sociedade brasileira que está percebendo o mal que esse governo vem fazendo ao país e a necessidade urgente de rompermos com tudo isso que está aí e iniciarmos um novo e virtuoso ciclo no Brasil. Isso é positivo para nós, para as futuras gerações de brasileiros e é isso que me motiva estar aqui hoje e é isso que me motiva estar nessa disputa.

O ex-governador de São Paulo, seu colega de partido, José Serra vem sendo citado, vinha sendo, como um possível colega seu como candidato a vice-presidente. No domingo, publicou uma nota, em um perfil em uma rede social, dizendo que não, não quer ser candidato, nunca pleiteou ser candidato a vice-presidente. Existe a possibilidade ainda de José Serra vir a ser o seu candidato a vice-presidente?
Fernando, eu agradeço até essa pergunta porque você me dá oportunidade de registrar aqui mais um gesto de grandeza de José Serra. José Serra é um dos mais preparados e qualificados homens públicos do Brasil. Quem não gostaria de ter Serra no seu palanque, não gostaria de ter Serra na formulação de um programa de governo e mesmo na execução desse programa de governo? Eu quero muito tê-lo e tenho certeza que ele estará, essa questão não surgiu por uma motivação ou por uma iniciativa dele. Se o nome dele acabou sendo colocado, eu recebi isso com muita honra pela imprensa, e ele fez um gesto para dizer simplesmente o seguinte -é assim que eu entendi, inclusive fez isso publicamente em Cotia [SP], na última sexta-feira, quando estivemos juntos em um grande evento partidário- contem comigo, eu estou aí Aécio para estar ao seu lado para encerrarmos esse ciclo e mudarmos o Brasil, qualquer que seja a posição. Ele disse isso com absoluta clareza e eu recebo esse gesto como um gesto de grandeza política de um grande homem público.

Mas o sr. acha que ele poderia ser o seu candidato a vice-presidente?
Olha, é uma possibilidade colocada. Eu nunca conversei com ele pessoalmente sobre essa possibilidade. Ele acena com a possibilidade de disputar uma cadeira na Câmara ou no Senado. Onde ele estiver, seja vice, seja na Câmara e no Senado, para a tristeza dos nossos adversários ele estará ao nosso lado, e estaremos juntos para ganhar a eleição e para governar, porque não vejo um futuro governo nosso sem a presença importante e decisiva de José Serra.

O sr. ligou para ele ou falou com ele depois que ele publicou a nota no domingo, a respeito desse tema?
Até meus telefonemas privados, meus telefonemas privados você quer saber [risos]. Eu converso muito mais com o Serra do que você imagina. A nossa relação...

Mas ligou?
A nossa relação tem um ponto de convergência: o interesse público, o interesse do país. Isso é muito mais relevante do que qualquer visão diferente do que essa ou aquela. Eu tenho conversado com ele e...

Mas depois de domingo não falou?
No reino tucanato reina a tranquilidade e a paz absoluta.

Mas falou com ele depois de domingo?
Eu tenho falado sempre com ele, Fernando.

Seria desejado que o seu vice-presidente na campanha, candidato, fosse do Estado de São Paulo?
Falo aqui mais uma vez com absoluta franqueza, aliás como tenho falado sempre. É uma possibilidade, existe uma corrente política no nosso entorno que advoga a tese de que São Paulo, pelo contingente eleitoral, pela importância política, seria decisivo nessa campanha. Admito essa como uma alternativa, nós temos alternativa que inclui as outras forças partidárias que já se manifestaram em torno do nosso nome. O Solidariedade apresentou o nome do presidente da Força, o nome do presidente do Democratas sempre é lembrado, que é um grande líder, um grande senador, meu parceiro nessa construção desde o início, o senador Agripino [Maia]. Então eu terei muita serenidade para ouvir o conjunto dessas forças e em um momento que tomarmos a decisão, repito, não há ninguém, a decisão é de todos, não há ninguém impondo, esse é o fato positivo e novo, não há ninguém que condicione o apoio por indicação dessa ou daquela figura para o cargo de vice-presidente da República.

Nesta semana, o sr. foi questionado pelo fato de, em Minas Gerais, estar junto em um evento da sua pré campanha, em Minas Gerais, o ex-senador Eduardo Azeredo. Isso o incomoda?
Não, de forma alguma. Eu conheço Eduardo há muitos anos. Talvez você o conheça. O Eduardo é um homem de bem. Ele está tendo a oportunidade de se defender. Não vamos ocupar aqui o papel da Justiça. Vamos deixar que ele se defenda. Fizemos um ato, em Minas Gerais, com mais de quatro mil lideranças de todo o Estados, apenas liderança importantes, há um sentimento em Minas contrário ao sentimento que nós colhemos no Brasil. Minas quer o avanço das conquistas que nós trouxemos ao longo desses 12 anos e eu tenho a absoluta convicção que mais uma vez vamos vencer as eleições em Minas Gerais e temos que ter, pelo menos, o respeito de deixar que o ex-deputado Eduardo possa se defender na Justiça. Só que, isso é importante ficar claro, eu não agirei como agiram ou agem a liderança do PT. Se alguém amanhã for condenado pela Justiça, se cometer alguma ilicitude, não estou dizendo que ele cometeu, não conheço a fundo o processo, ele não sera transformado em herói nacional pelo meu partido. Pelo contrário, cumprirá eventualmente a pena se for condenado, mas há hoje no seu entorno, enfim, as pessoas que estão mais próximas ao Eduardo, uma enorme expectativa pela sua absolvição.

E ele deve participar ativamente da sua campanha, pelo menos no Estado de Minas Gerais?
Fernando, da forma que ele quiser. Eu acho que todos...

Ele é bem-vindo?
Olha, ele é. Ele é um homem de bom. Agora, com a forma como participar como, enfim, eu acho que a forma de participar o Pimenta [da Veiga] que vai dar, que é candidato a governador em Minas Gerais, é a nossa aliança. A nossa aliança em Minas, Fernando, é bom deixar isso muito claro, é uma aliança de homens de bem, de pessoas que têm uma história de vida pública respeitada. Olha o governador Anastasia, o próprio Pimenta, enfim, há um conjunto de forças políticas hoje que nos apoiam em Minas Gerais porque, ao longo dos últimos 12 anos, nós fizemos com que Minas tivesse a melhor educação do Brasil, a melhor saúde da região Sudeste, o mais inovador programa de parcerias com o setor privado em execução no Brasil, e eu, depois de oito anos de mandato, posso olhar para trás e ver esse reconhecimento da população de Minas Gerais. Esse é o fato concreto. Nós vamos de novo trabalhar e, eu acredito, vencer as eleições em Minas.

O sr. mencionou Minas Gerais, havia um pré-acordo entre o sr. e o seu, agora, adversário na disputa pelo Planato, Eduardo Campos do PSB. O PSB, em tese, poderia apoiar o candidato do PSDB ao governo de Minas Gerais. Há indicações claras de que isso não vai mais ocorrer. Por que isso aconteceu e isso significa uma mudança de relacionamento entre o sr. e Eduardo Campos?
Da minha parte, não. Eu tenho visto algumas notícias na imprensa, mas para mim vale o entendimento, até hoje pelo menos, os compromissos que nós fizemos, e na verdade, essa aliança do PSB com o PSDB em Minas Gerais, há uma leitura um pouco equivocada de setores da imprensa de que é um troca-troca com Pernambuco, enfim, não, e seria se o PSB viesse agora nos apoiar em Minas Gerais por uma determina troca. O PSB participa do meu governo em Minas Gerais desde a minha primeira eleição e participa de forma importante porque tem quadros muito qualificados. A secretária de Educação que faz um extraordinário trabalho em Minas Gerais, Ana Lúcia Gazzola, é do PSB. O secretário que cuida da Copa, da área de esportes é do PSB. Então é uma coisa natural. O que não seria natural é uma ruptura a partir de um interesse eleitoral, aí eu não sei como seria recebido pela sociedade.

Alguns colegas seus têm dito que há um certo sinal de traição do PSB, em Minas Gerais, o sr. vê assim?
Eu não vi nenhuma movimentação concreta da direção do partido ainda. Terem postulantes discutindo o quadro local é muito natural. As últimas conversas que tive com Eduardo, o sentimento que eu colhi dele, até me disse isso o governador Anastasia há poucos dias que esteve com ele em Belo Horizontes, colheu dele um sentimento de que esse era o caminho natural. Até porque uma ruptura nisso penalizaria fundamentalmente o próprio partido que teria dificuldades, inclusive, de eleger parlamentares. Da minha parte não mudou nada. Fernando, eu estou me dispondo a conduzir algumas forças políticas hoje para enfrentar o governo que está aí porque eu acredito que isso é bom para o Brasil. Vou fazer isso no limite das minhas forças, com todo o meu vigor, e não vou me distrair ao longo do caminho e não vou cair na armadilha do PT e sobretudo essa armadilha de querer dividir as oposições. Esse é um esforço permanente que faz o governo. O foco hoje, o que me move, o que me faz estar andando pelo Brasil, reunindo as figuras mais talentosas, as cabeças mais qualificadas, é podermos construir um projeto alternativo a esse que está aí. E os meus compromissos eu vou honra-los todos.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso deve aparecer nos seus comerciais de televisão ao longo da campanha?
Sim, como já apareceu. Ele próprio vai definir a forma como quer participar. Olha, é um privilégio para o Brasil ter hoje, Fernando, um quadro da qualidade do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso discutindo o Brasil. Quando eu vejo a postura do ex-presidente Fernando Henrique com as declarações de um outro ex-presidente da República aí nós vemos quão tamanha é a diferença de postura, de compromisso para com o Brasil. O presidente Fernando Henrique disse algo curioso recebendo uma homenagem em Nova Déli, onde foi?

Acho que foi em Israel.
Foi isso. Foi em Tel Aviv.

Isso.
Nova Déli foi de uma outra viagem, se eu não me engano. Tel Aviv, Israel, e ele dizia que nessa propaganda em que o PT quis vender o medo e a desesperança a sociedade brasileira, que mostra uma falência e um fracasso absoluto de um governo que depois de 12 anos não tem mais esperança, não tem mais legado sequer para apresentar ao país, ele disse algo muito curioso, e eu acho correto, que o PT se esqueceu de dizer que o passado é ele, porque esses últimos 12 anos quem governou o Brasil foi o PT. Não dá mais para terceirizar responsabilidades. E aí eu acho que PT cometeu seu primeiro equívoco grave nessa caminhada. Ninguém vota olhando para trás. As pessoas querem saber de futuro, quem vai melhorar a sua vida, quem vai dar mais segurança as suas famílias, quem vai criar maiores condições de empregabilidade aos seus filhos e o PT ao focar a sua campanha no passado, onde ele próprio é o protagonista, ele abre espaço para que nós sejamos o que somos, nós somos a esperança, nós somos o futuro, nós somos a mudança de verdade que o Brasil precisa viver.

Mas, senador, na comparação dos dois ex-presidentes mais recentes, Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, e Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, pesquisas depois de pesquisas sempre continuam a mostrar que o ex-presidente Lula tem um poder eleitoral sempre muito mais muito superior ao do ex-presidente Fernando Henrique, que, ao contrário, às vezes, até prejudica quando colocado ao lado de algum candidato do ponto de vista eleitoral.
Não questiono isso, é óbvio que isso existe, sobretudo em setores da sociedade que foram beneficiados pelos programas...

Grandes setores porque são...
Pelos programas de transferência de renda que foram iniciados no governo do presidente Fernando Henrique. Será que se o presidente Fernando Henrique fizesse dos programas sociais uma bandeira eleitoral permanente, se apropriasse partidariamente deles como fez o PT, isso seria diferente? Não sei. Eu sempre tive uma relação republicana com o presidente Lula. Nunca prejudicou Minas Gerais, faço aqui esse registro. Durante o nosso governo, porque fomos governantes juntos. Tenho respeito por ele, agora, eu não troco a companhia do presidente Fernando Henrique pela de ninguém hoje do ponto de vista do aconselhamento, sabe, da visão estratégica de país, de uma visão de mundo muito mais adequada, Fernando, sabe? Muito mais contemporânea em relação ao que precisa viver ao Brasil quando o presidente Lula que, infelizmente, o que eu percebo é o seguinte: ele, nesses últimos meses, tirou a bandeira do Brasil da lapela e botou a bandeira do PT. É uma opção, tem que ser respeita, mas eu acho que um ex-presidente da República deveria ter um pouco mais de cuidado com determinadas afirmações ou até o seu nível de envolvimento em disputa eleitoral.

Estou tendo que voar aqui, pedir para o sr. concisão nas respostas se possível. Programas sociais. Quais programas sociais o PSDB, no caso de o sr. ser eleito, seriam mantidos e quais seriam modificados ou eliminados?
Para deixar aqui de forma muito clara, como constatado, eu apresentei há algum tempo um projeto que transforma o Bolsa Família em programa de Estado. O Bolsa Família é a unificação do Bolsa Escola e do Bolsa Alimentação que vieram do PSDB. Hoje, o governo do PT prefere que ele seja um programa coordenado por uma secretaria, dentro de um ministério para poder a toda véspera de eleição praticar o terrorismo usual de que ele vai extinto. Por exemplo, tem um programa que constitucionaliza o Bolsa Família a partir do momento que eu incluo na LOAS [Lei Orgânica da Assistência Social], e a Constituição é a que regula a lei orgânica da assistência social para dizer que ele é permanente, ele será aprimorado, ele será qualificado ao longo do tempo, mas não pode mais ser instrumento de moeda eleitoral. Hoje mesmo assistimos a algo deplorável. Fiquei sabendo no final de semana. Infelizmente, até um senador da República da base governista, na falta de coisa melhor para dizer, faz uma declaração e foi acionado judicialmente para dizer "olha, o candidato fulano de tal -no caso eu- vai acabar com o Bolsa Família". Coisa mais primária da política pequena, da política dos grotões, da política atrasada que o Brasil não merece mais viver, mas é o retrato de que essa é uma estratégia de campanha deles. O Bolsa Família será continuado, será aprimorado, até porque para nós ele é um ponto de partida, para o PT ele é só um ponto de chegada. Essa é a apenas a diferença que nós temos de visão.

O programa Mais Médicos será mantido?
O programa Mais Médicos é um programa, vamos chamar, circunstancial, temporal. Nós temos que enfrentar a questão da saúde de forma mais orgânica, de forma mais ampla. Isso passa, obviamente. E você sabe que nesses três últimos anos apenas o governo do PT permitiu que 13 mil leitos hospitalares fossem extintos, fechados no Brasil, apenas para contrabalancear um pouco esse discurso do Mais Médicos. O que eu defendo é mais saúde, nós defendemos progressivamente o aumento da participação do governo federal no financiamento da saúde, que diminuiu em 10% praticamente no período do governo do PT...

Quanto que o governo deve investir do Orçamento em São Paulo?
...Era 54% quando eles assumiram o governo. Hoje é alguma coisa em torno de 45%. A proposta...

Em relação a quê? Ao que tudo se investe no país?
Ao conjunto dos investimentos em saúde pública no Brasil, 54% era da União em 2002, hoje é 45%. A nossa proposta é que possa chegar a 10%.

Do Orçamento?
Do Orçamento. Como você tem os municípios hoje... Empregam pelo menos 15% [do Orçamento]. Você não encontra ninguém empregando menos de 25% [do Orçamento], mas a lei determina 15% [do Orçamento] dos municípios, 12% [do Orçamento] dos Estados. Nós programamos 10% [do Orçamento da União], mesmo que gradualmente, ao longo dos próximos anos.

Não é muito 10% do Orçamento para engessar com um item apenas?
Não, desde que o dinheiro seja aplicado com eficiência. Uma grande questão, Fernando, é que...

Mas com eficiência não dá para dar conta com o dinheiro atual?
Não, eu acho que gestão é muito importante. Não é só saúde. Mas eu acho que precisa ser... Não se justifica essa diminuição da participação da União porque qual que é a contrapartida dela, Fernando? São os municípios, principalmente, compensando esses 9%. Estrangulados. Nós temos municípios hoje, talvez 30%, talvez até 40%, 40% no meu Estado, de municípios que são hoje operadores de folha de pagamento. Então você dá um alívio fiscal, dá um alívio para os municípios, em contrapartida ao incremento dos investimentos da União, é algo razoável, equilibrado. Isso era feito sempre com uma discussão ampla, com transparência. Gestão dos recursos da saúde é absolutamente essencial. Mas eu volto ao Mais Médicos, para não perder a sua pergunta. O Mais Médicos continuará, mas nós não faremos a discriminação que hoje o governo federal faz em relação aos médicos cubanos. Na nossa avaliação, eles têm os mesmos direitos e têm que ter a mesma remuneração do que recebe os médicos de outras partes do mundo.

O sr. alteraria essa parte do convênio?
Isso. Certamente. Até porque não se justifica o Brasil se submeter a uma legislação de uma entidade internacional, latino-americana, que por sua vez segue a legislação cubana. Não tem sentido, isso mostra a fragilização do Brasil. Mas não é só isso. O que nós temos que nos preocupar é em criar mais vagas nas escolas de medicina espalhadas pelo Brasil. Elas vieram diminuindo ao longo desse ano, e o governo do PT não percebeu que elas vinham diminuindo. Eu acho que é importante que nós discutamos uma carreira para os médicos, uma carreira federal acho que seria importante para permitir que eles alcancem esses grotões. E nós estamos com um grupo extremamente qualificado de pessoas discutindo a segunda etapa do programa Mais Médicos. Mais Médicos não é a solução para o problema da saúde brasileira.

Se eleito, como o sr. pretende trabalhar o sistema de nomeação dos diretores das agências reguladoras?
Meritocracia, e ponto. Em Minas Gerais eu fiz isso. Para você ocupar um cargo, Fernando, na área administrativa ou financeira...

Nenhum deputado ou senador vai poder indicar diretor de agência?
Não vai passar nem perto. E nem ministro, e nem diretor de nada. Essa não é a lógica que funciona. Nós temos que inverter isso de forma definitiva, essa lógica perversa onde os espaços públicos são feudos de grupos partidários, de grupos dentro dos próprios partidos.

Ou grupos econômicos também, né?
Também, o que é mais grave. Ou tão grave. E grupos dentro dos próprios partidos políticos. Eu criei uma regra, que alguns outros... São Paulo inclusive depois, felizmente, a seguiu, de forma muito positiva. Para você ocupar um cargo na área financeira ou administrativa, na administração direta do Estado, você tem que passar por uma certificação feita por um órgão externo ao Estado. No nosso caso, a Universidade Federal de Minas Gerais. Todos os nomes indicados para as agências terão que passar por essa qualificação. Por essa avaliação, para estarem disponíveis. Nós vamos substituir, Fernando -e acredite nisso, você vai comprovar lá na frente-, esse aparelhamento absurdo da máquina pública, pela meritocracia. É gente qualificada, que tem essa satisfação a dar à sociedade e à sua própria história de vida. E não a um padrinho, e não a partidos políticos. O que o governo do PT fez com as agências reguladoras foi um crime. Elas geraram um balcão de negócios, muitas vezes negócios escusos, e instrumento para composição de base parlamentar. Isso não vai acontecer no nosso governo.

Zona Franca de Manaus. Até quando deve existir a Zona Franca de Manaus? Quantos anos?
Eu acho que ela é definitiva, esse projeto de extensão por 30 anos é algo hoje consensual, Fernando. Eu estive na Zona Franca recentemente. Ela já faz parte da paisagem econômica e social daquela região. O que nós temos é que ir além, transformá-la numa grande plataforma de exportação. Ela pode dar um grande salto, sobretudo em relação aos nossos vizinhos. Mas ela está consolidada, ela é uma realidade, e essa realidade não pode ser alterada.

O economista francês Thomas Piketty, que está sendo muito falado ultimamente, escreveu um livro chamado "O Capital no século 21", no qual ele argumenta que só o aumento do tamanho das economias, do PIB, não resolve a desigualdade na sociedade. E ele propõe fórmulas para dividir a riqueza. Uma delas é a criação de um imposto sobre a herança e uma coordenação até mundial para isso. O que o sr. acha dessa proposta?
Ela é instigante. Porque ela permite, em determinado momento, que haja usufruto daquele patrimônio, mas num momento em que você, enfim, morre, aquele patrimônio passa a ser um patrimônio, ou parte dele, possa ser um patrimônio coletivo. É um bom tema para discussão. Obviamente ainda não me detive sobre ele. Esse tema já existia lá atrás, Fernando, quando se falava...

E um imposto sobre grandes fortunas...
Imposto sobre grandes fortunas. Que vinha mais ou menos na mesma lógica. Taí. É um tema que eu estou aberto a discutir.

Mas o sr. não tem posição, a favor ou contra?
Não tenho, até porque essa proposta é algo absolutamente novo, incipiente. Mas é uma discussão que vai vir. Eu estou aberto, Fernando, para todas as discussões. Agora, acredite numa coisa, eu vou assumir os compromissos que eu tiver convencimento, num primeiro momento, e condições efetivas de cumprir. Mas eu acho que essa é uma boa discussão para os economistas, para a sociedade. É uma discussão inclusive para a classe política fazer.

O sr. é a favor ou contra a manter as atuais regras e a legislação a respeito da prática do aborto?
As regras atuais, já respondi isso mais de uma vez. Não acho...

Se o Congresso decidir flexibilizar as regras atuais e dar mais o direito à mulher de decidir, o sr., como presidente da República, se eleito, seria contra?
Essa é uma decisão do Congresso Nacional. Na minha concepção, já respondi isso mais de uma vez, as regras atuais são adequadas e elas suprem as nossas necessidades no momento.

No Brasil, a Justiça já decidiu que é legal o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. Casamento gay. O que o sr. acha de casais gays terem o direito consolidado de adotar e educar uma criança?
Olha, Fernando, eu me dediquei muito no Congresso a esse tema da adoção. E é hoje arrepiante, constrangedor, você ver o cadastro nacional de adoção, você tem hoje cerca de 30 mil famílias cadastradas para adoção e apenas 5 mil crianças -esse número é recente-, 5.200 crianças em condições de adoção. Mais de 80% dessas crianças são acima de 7 anos de idade, onde já não há um interesse nessa adoção. Portanto, tudo que envolver afeto e condições adequadas e, obviamente, assistentes sociais, profissionais do setor, vão fazer essa avaliação, eu não me oporia. O que eu defendo é uma facilitação do processo de adoção no Brasil, inclusive no que diz respeito ao poder pátrio, que é o que engessa, impede que as crianças sejam colocadas mais cedo para adoção. O último dado que eu tive, 84% dessas famílias que querem adotar, querem adotar crianças até 3 anos de idade, no máximo. E mais da metade até um ano de idade. Meninas, brancas. Então, enfrentar essa questão da adoção com maior agilidade, permitindo que as crianças que efetivamente não tenham condições de ser criadas nos seus lares, eu acho que é algo que mereceria uma atenção especial nossa. E essa é uma questão...

Casais homoafetivos, o sr. acha que poderiam adotar?
Se houver, por parte dos profissionais da área, avaliação de que há condições adequadas desses casais criarem criança, talvez ela fique ali melhor do que nos abrigos em nos albergues hoje.

Financiamento público de campanha. O Supremo já decidiu, por maioria, mas ainda não terminou de julgar. Que deve ser banido do país. Financiamento público não, financiamento privado, de empresas privadas. O sr. tem posição sobre isso?
Acho que o fim do financiamento privado teria que ter uma relação com o fortalecimento dos partidos. Era importante que nós avançássemos pelo menos na lista partidária, ou pelo menos uma parcela dos parlamentares eleitos pela lista partidária. Porque isso significa o quê? Que nós vamos estar fortalecendo o financiamento público. E não pode ser individualizado. E nós temos que tomar cuidado para a contrapartida disso não ser o recrudescimento do caixa 2. Eu acho que essa discussão tem que caminhar de forma conjunta. Acho que não valerá, segundo estou informado, para essas eleições. Mas é uma discussão que nós temos que nos aprofundar sem viés ideológico, sem buscar saber quem é o esperto da vez, o beneficiário imediato dessa modificação. Eu acho, por exemplo, que limitar o financiamento privado seria extremamente adequado, mas eu acho extremamente curioso que o partido político mais financiado hoje pelo setor privado, pelas elites brasileiras, como foi o PT, num ano não eleitoral... O PT, num ano não eleitoral, que foi no ano passado, recebeu mais que nós recebemos no ano eleitoral anterior. Cerca de R$ 80 milhões. Seja aquele que promova hoje o financiamento público. Acho que uma coisa tem que vir casada com outra. Financiamento público puro, sem que haja pelo menos uma parcela eleita por lista partidária, eu temo que vá haver um descontrole na distribuição desses recursos. E, obviamente, descontrole nunca é bom em questões dessa ordem.

O Brasil deve regulamentar a prática da eutanásia?
É uma discussão que eu não sou especialista para, talvez, ter uma decisão aqui. Mas eu te diria que eu sou e sempre fui a favor da vida. Da dignidade. Nós temos que tratar é da dignidade das crianças ao nascer, da dignidade das pessoas para viver, e também da dignidade para morrer. Mas eu não me colocaria a favor, isso é uma questão que envolve uma questão religiosa, de crenças, mas é uma discussão que a sociedade vai enfrentar. Eu nunca me detive sobre ela. E quero me deter, até porque essa tem sido a minha história de vida, em dar dignidade às pessoas para nascer e para viver.

Vizinho do Brasil, o Uruguai legalizou a produção e o consumo de maconha, que é proibida no Brasil. O Brasil deve olhar essa experiência e eventualmente segui-la?
Deve olhar essa experiência, como outras, em outras partes do mundo, mas não acredito que segui-la.

Por quê?
Eu não gostaria de ver o Brasil como cobaia de uma experiência que não se sabe qual é o resultado. Já me manifestei sobre essa questão mais de uma vez. Não acho que essa seja uma agenda para o Brasil. Não sou a favor, para ficar claro, da descriminalização.

O sr. sabe que um quarto da população carcerária no Brasil, que é mais de meio milhão [de pessoas], é por conta de algum tráfico de drogas. Pequenas quantidades, às vezes. E vão para a prisão. É bom isso?
Não, claro que não é bom, por isso eu estou propondo uma inflexão profunda na reforma do Código Penal, do Código de Processo Penal, onde nós possamos dar vigor, agravar as penas dos traficantes, é esses que nós temos que buscar. E, obviamente, compreender que esse tipo de pequeno delito pode ter punição e deve ter, sim, mas punições paliativas, trabalhos comunitários. Nós não falamos sobre sistema prisional, que é hoje uma tragédia no Brasil, mas é preciso dizer que o Brasil não tem só Pedrinhas, como nós assistimos. Tem sistemas prisionais, como o de Minas Gerais, feitos com parcerias com o setor privado, absolutamente adequados, e é um modelo que eu gostaria de levar para o Brasil.

O sr. tem 54 anos, em outra época da vida já consumiu algum tipo de droga considerada ilícita no Brasil?
Já respondi isso mais de uma vez, quando tinha 18 anos experimentei maconha e ficou por aí. E não recomendo que ninguém faça.

O sr. é convicto quando diz a respeito de o Brasil não adotar alguma flexibilização para drogas leves? Acha que isso não poderia ajudar a diminuir a população carcerária e dar um tratamento mais correto para essas pessoas?
Quando eu falo na discussão de um novo Código Penal, essa questão tem que estar inserida. E vamos discuti-la. Agora, eu não tomaria nenhuma medida que viesse na direção oposta, do estímulo ao consumo de drogas.

Senador Aécio Neves, muito obrigado por sua entrevista.
Eu que agradeço


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