Folha de S. Paulo


PT precisa fazer concessões, diz Berzoini, articulador de Dilma

Com um discurso moderado e visando a reduzir a temperatura elevada nas relações entre o Palácio do Planalto e o Congresso, o novo ministro das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, declara que seu partido, o PT, "tem que fazer concessões" para as outras agremiações que compõem a aliança de sustentação à presidente Dilma Rousseff.

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Em entrevista ao programa Poder e Política, da Folha e do "UOL", ele disse: "Sou daqueles que defende que o PT aproxime a sua estratégia política em todo o Brasil com o PMDB. Também com o PP, PSD, PC do B. Com todos os partidos que fazem parte da base, no sentido de buscar uma maior harmonia na convivência. Não dá para a gente ter um foco de tensão muito forte nos Estados e ter uma aliança nacional. Quero ter harmonia nos Estados, nos municípios e no Parlamento".

A estratégia descrita por Berzoini é a mesma defendida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o indicou para o cargo de ministro de Dilma Rousseff. A chegada do novo articulador político ao Planalto tem como objetivo reagrupar a aliança vitoriosa na disputa de 2010.

Como o PT já tem a maior bancada na Câmara e avança também para ampliar sua presença no Senado, há um temor de outras siglas governistas de que possam ser canibalizadas nas urnas pelos petistas. Berzoini nega essa intenção.

"Comandamos uma aliança de centro-esquerda que é responsável hoje por grandes avanços. Queremos que o PMDB, o PP, o PSD, o PC do B, o PDT e outros aliados se apropriem desses bons resultados também junto com o PT para disputar a política nacional. Não queremos uma hegemonia só do PT. Queremos uma hegemonia do conjunto da base".

Aos 54 anos, ministro duas vezes durante o governo Lula (Previdência Social e Trabalho) e presidente nacional do PT logo depois do escândalo do mensalão, em 2005, Berzoini é hoje um político moderado nas suas respostas. "Precisamos construir no Brasil uma estratégia que vá muito além dos limites do PT. Isso significa dialogar de uma maneira muito ampla com os demais partidos".

Na prática, o trabalho de Berzoini vai consistir de duas tarefas principais. Honrar a liberação de emendas ao Orçamento que ficaram pendentes de 2013 e assim acalmar deputados e senadores aliados. Em segundo lugar, mas não menos importante, tentará evitar que o Congresso se ocupe de votar projetos que possam ter repercussão negativa nos cofres do governo. Assim espera repetir a partir de junho uma coalizão eleitoral para sustentar a reeleição de Dilma com um número de partidos semelhante ao de 2010.

Disposto a debelar de uma vez o foco de insatisfação do PMDB na Câmara dos Deputados, Berzoini faz elogios ao acordo entre esse partido e o PT para se revezarem no comando da Casa. "Não temos qualquer tipo de dificuldade de fazer uma discussão sobre essa questão da composição do Parlamento, da composição da Mesa", declara.

Uma das principais críticas recentes de congressistas sobre a articulação política do Planalto era a falta de poder da ex-ministra Ideli Salvatti, a quem Berzoini sucedeu. A partir de agora, diz ele, haverá "clareza e transparência nos acordos". Promete "não fazer nenhum tipo de compromisso que não possa ser cumprido" entre o governo e o Congresso.

A fala diplomática se esvai quando o assunto é a CPI da Petrobras proposta por adversários do Planalto. A iniciativa seria só "fato político" para "encobrir o vazio programático da oposição". Nesse contexto, "é fundamental que haja uma espécie de CPI para todos", com investigação que atinja PSDB e PSB.

O sinal de "volatilidade" na popularidade do governo Dilma em pesquisas deve ser creditado a "um noticiário muito intenso, negativo". Essa dúvida sobre o projeto reeleitoral dilmista reacenderá o movimento "volta, Lula"? O ministro nega: "A imensa maioria da bancada do PT não tem qualquer cogitação em relação a isso. Se tiver dois, três ou quatro pessoas que tenham essa perspectiva, não falam abertamente".

A seguir, trechos da entrevista:

*

Folha/UOL - Há um processo rumoroso entre o governo e o Congresso a respeito da criação de uma CPI para investigar a Petrobras. O que o governo espera desse episódio?
Ricardo Berzoini - A CPI é um instrumento muito valioso do Poder Legislativo para ser banalizado. Lamentavelmente, tem sido banalizado em muitas situações pela falta de conteúdo real. Muitas vezes chega-se ao final da CPI com a sensação que o povo descreve como pizza. Não tem consequências reais do processo que possam melhorar a gestão pública ou apontar caminhos para o combate efetivo à corrupção.
A oposição tenta estabelecer no caso da Petrobras um processo de investigação meramente político-eleitoral: 180 dias para o final da CPI coincidir com o processo eleitoral. Não é o melhor caminho. Os fatos estão todos sob investigação de CGU, Ministério Público, TCU e todos os órgãos de apuração.

Esse prazo de 180 dias é padrão das CPIs, não é?
Justamente. Quando você estabelece o início em abril ou maio, vai ter que passar pela Copa do Mundo e por toda campanha eleitoral. Todos sabemos que o Congresso Nacional em campanha eleitoral tem um funcionamento, digamos, atípico. Então, é criar fato político. Talvez para encobrir o vazio programático da oposição.

No entender do governo, a CPI da Petrobras é desnecessária?
Já há investigação. Não é uma investigação do Poder Executivo. Há investigação da Polícia Federal, investigação do Ministério Público. Temos hoje um procedimento que não tem qualquer restrição à investigação. Seja qual for o resultado, as consequências terão o seu curso normal.

Já que a CPI da Petrobras não é necessária, o sr. acha então também que não é necessária uma CPI sobre outros casos que afetam os partidos de oposição?
Diante desse procedimento da oposição, se é para investigar, vamos investigar todos os fatos rumorosos dos quais temos notícia recentemente. Quem não tem medo de investigação, não tem medo de ser investigado.
É fundamental que haja uma espécie de CPI para todos. Nós temos investigações que têm a ver com o processo do metrô de São Paulo, o caso Siemens-Alstom. Investigações referentes a questões ocorridas em Pernambuco, em Minas Gerais. E também a investigação da Petrobras, da qual nós não temos nenhum receio, até porque há total convicção de que as decisões tomadas no âmbito do Poder Executivo foram decisões corretas e que têm a ver com o ciclo normal de administração e a conjuntura do mercado de petróleo.

Essa estratégia é para embolar o meio de campo? Uma CPI para investigar tudo... e acabar não investigando nada?
Não. Acho que se for para investigar, tem que investigar tudo.

Mas o sr. não disse que uma CPI tem dificuldades para trabalhar em ano eleitoral e de Copa do Mundo?
Exatamente. Em ano eleitoral, CPI tem funcionamento muito contaminado. É claro que uma CPI com três assuntos, três ou quatro, ou cinco, terá o mesmo problema que uma CPI com um assunto só.

O sr. acha possível negociar com a oposição para que nenhuma CPI seja instalada?
É uma questão que tem que ser tratada no âmbito do Parlamento.

O assunto foi remetido à Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Haverá uma semana de prazo. Nesse tempo, pode-se chegar a um acordo para nenhuma CPI ser instalada?
Possível sempre é, mas eu não creio que haja um ambiente propício para isso hoje. Na verdade, haverá muita disputa de mídia nesse processo. Sempre há aquele jogo: quem é a favor da CPI, quem é contra. Quem está com medo, quem não está.
A melhor maneira de travar esse debate é efetivamente no próprio âmbito da Comissão de Constituição e Justiça.

O presidente do Senado, Renan Calheiros, atuou a favor do governo ao postergar a decisão sobre instalação da CPI?
Não creio. Ele tinha duas questões de ordem bem fundamentadas. Têm que ser examinadas do ponto de vista jurídico. A CCJ do Senado examina o aspecto jurídico. Não creio que tenha sido uma manobra do presidente do Senado a favor do governo. Acho que foi uma decisão ponderada. Qualquer decisão diferente que ele tomasse seria muito mais contestada.

Sua antecessora, Ideli Salvatti, era crucificada pelo fato de firmar compromissos com o Congresso e depois não ter poder o suficiente para honrá-los. Como será no seu caso?
Convivi com vários ministros de Relações Institucionais. Aldo Rebelo, Jaques Wagner, Tarso Genro, Walfrido [Mares Guia], José Múcio, Luiz Sérgio, [Alexandre] Padilha e a própria Ideli. Todos tinham essa contradição. A Secretaria de Relações Institucionais não é um espaço decisório do governo. É o de um articulador político.
Quem tem que cumprir os acordos políticos –as questões de ocupação de espaço e os projetos estratégicos– é o conjunto do governo.
Nós temos uma base muito heterogênea. Não é uma base homogênea ideologicamente. Não tem história comum passada. É uma base construída a partir de acordos políticos programáticos de curto e meio prazo, não de longo prazo. Nós temos que fazer sempre esse debate, sobre a participação no poder e sobre a participação nos grandes projetos.
Nós aprovamos no ano passado na LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias] um conceito de orçamento de emendas individuais impositivas. Isso afasta esse problema de discutir sempre: "Ah, vai liberar emenda, não vai?". As emendas vão ser liberadas. A questão fundamental agora passa a ser projetos estratégicos em cada Estado e Regiões do país e a questão da ocupação dos espaços administrativos do governo, o que é legítimo em qualquer democracia. É praticado no Japão, nos Estados Unidos, na Europa e da América do Sul toda.
É um processo de coparticipação e sentimento de pertencimento por parte dos parlamentares. Muitas vezes o parlamentar não se sente tão pertencente ao acordo político. A maneira de ele se sentir pertencente efetivamente é através da integração dele nas discussões estratégicas do governo.

O que vai mudar na administração da Secretaria de Relações Institucionais a partir de agora?
A ministra Ideli fez um trabalho muito importante. Conseguiu aprovar praticamente tudo o que o governo queria nesse período.
Uma ou outra derrota é da natureza do Congresso Nacional. O presidente Lula também sofreu, o presidente Fernando Henrique e outros presidentes antes.
O que precisamos agora é ter clareza e transparência nos acordos. Não fazer nenhum tipo de compromisso que não possa ser cumprido. Estabelecer uma relação de proximidade maior do Palácio do Planalto com o Congresso Nacional e buscar esse entendimento de que não adianta ter uma visão meramente ideológica do processo político.
Temos que ter uma visão que a nossa base, por ser heterogênea, comporta contradições que permitem ao governo, muitas vezes, fazer um trabalho, discutir projetos de infraestrutura, projetos de investimentos que sejam capazes de melhorar a vida do povo, independentemente da visão ideológica de cada partido.

O sr. usa a expressão "uma proximidade maior do Palácio do Planalto com o Congresso". Ou seja, até agora essa proximidade era insuficiente?
É o sentimento real do Congresso Nacional, de uma certa dificuldade de relacionamento. Essa dificuldade não é um problema da Secretaria de Relações Institucionais. É algo que tem a ver com todo o governo. Um dos debates que nós estamos preparando para apresentar para o conjunto do governo é justamente uma agenda mais integrada.
Vou dar meu exemplo como parlamentar. Muitas vezes questões da área em que atuo –área tributária, de sistema financeiro, democratização de acesso ao crédito–, vinham para o Congresso Nacional sem um debate prévio com os parlamentares que têm relação com esse tipo de tema.
Você facilita muito a tramitação dos projetos se na fase de preparação da medida discutir previamente com um grupo de parlamentares. Por exemplo, evitar mandar uma medida provisória ou um projeto de lei sem antes consultar o que existe no Congresso tramitando e pode ser aproveitado de um deputado da situação ou da oposição.
Vamos trabalhar com a ideia de valorizar o Poder Legislativo na elaboração e na preparação dos projetos, antes da tramitação.

Neste ano, quais são os dois ou três itens prioritários para discutir com o Congresso?
A questão fundamental agora é evitar qualquer tipo de impacto fiscal danoso. Nós temos um cenário internacional muito complexo na economia. Isso afeta todos os indicadores econômicos do Brasil. O governo da presidente Dilma tem trabalhado com a seguinte lógica: a conta não deve ser apresentada para o povo. Nós temos que trabalhar para que o impacto da crise não atinja o emprego, a renda, fatores fundamentais para manter o otimismo e a perspectiva de futuro.

Mas aí estamos falando mais sobre aquilo que não deve ser feito. Tem alguma coisa que o governo vai buscar a partir de agora dentro do Congresso?
A maior vitória que nós conseguimos recentemente foi a aprovação do Marco Civil da Internet. Não vejo, no curto prazo, nenhuma questão decisiva para ser aprovada. Evidentemente pode surgir em função da conjuntura.
O presidente da Câmara inclusive preparou uma pauta extensa, com mais de 20 projetos que podem ser examinados e que têm essas características: zero impacto fiscal e grande impacto na vida das pessoas.

Por exemplo.
São projetos como o Código Civil. São mais de 20 projetos, dos quais a maioria o governo concorda em aprovar.

O sr. citou o Marco Civil da Internet. Acabou de ser aprovado pela Câmara e agora está no Senado. Há algumas dúvidas sobre trechos a respeito da retirada de conteúdo da internet. O sr. tem alguma opinião sobre isso?
Toda lei comporta interpretação. Nesse caso especificamente foi exaustivamente discutido. Essa visão do que pode ser retirado ou não, na maior parte das hipóteses da lei é sempre submetido ao crivo do Poder Judiciário –aliás, como a Constituição assegura de qualquer maneira.

A expectativa do governo é que o Senado aprove o texto do Marco Civil tal qual veio da Câmara?
A ideia seria isso. Mas evidentemente o Senado tem total soberania para decidir. Agora, foi muito discutido antes. Foi discutido também com alguns senadores durante a tramitação na Câmara. Acho que podemos apostar em poucas mudanças –e um debate muito profundo no sentido de apurar aquilo que você falou: "Será que tem alguma coisa ali que foi mal processada na Câmara"? E se precisar voltar para a Câmara, a Câmara tem o compromisso de apreciar rapidamente.

O sr. mencionou o conceito de orçamento impositivo na LDO, que é a liberação automática de emendas. Vai realmente valer a partir de agora?
Já está valendo. Publicado o decreto de contingenciamento do Orçamento, você tem uma parcela liberada para todos igualmente. Há uma série de regras, de prazos para apresentar os projetos, para liberar o empenho e depois liberar o financeiro.
O governo era contra esse modelo. Mas, tomada a decisão, está cumprindo rigorosamente para assegurar que todos tenham acesso a essas emendas no prazo correto. Obviamente o que pode acontecer são as prefeituras, ou entidades beneficiadas, não apresentarem os projetos. Ou apresentarem projetos que não têm consistência técnica. Mas é uma decisão rigorosamente técnica. Não haverá nenhuma influência política nesse processo.

Mas o governo sempre poderá enxergar imperfeições em um projeto de um congressista de oposição e não liberar a emenda...
O governo tem que fundamentar muito claramente. Imagine que aconteça a situação de um deputado do partido A apresentar um tipo de projeto similar ao do partido B? E que se negue para esse primeiro deputado? Esse deputado vai perceber que foi discriminado.

Se esse discriminado for de oposição, não faz diferença para o governo.
Acho que faz diferença do ponto de vista do compromisso que o governo assumiu. O governo assumiu, mesmo sendo contra. Nós estamos seguindo o comando da LDO. O objetivo nosso qual é? Já que o Congresso decidiu, é fazer da maneira que não haja contestação. Queremos fazer o processo de maneira absolutamente correta para todos os partidos e para todos os parlamentares.

A que o sr. atribui nos últimos meses essa certa insatisfação generalizada, sobretudo na Câmara dos Deputados, de congressistas aliados ao Palácio do Planalto?
Tivemos três procedimentos simultâneos que geraram alguns atritos, incompreensões e divergências entre o palácio e partidos.

Quais?
A questão da reforma ministerial. A questão dos palanques, que ainda não está resolvida nos Estados. E a questão das próprias emendas de 2013 –havia uma série de compromissos firmados e não plenamente cumpridos.

Qual o valor dessas emendas que ficaram pendentes?
Uns 10% ou 15% do remanescente de 2013. Havia uma tensão porque algumas coisas foram anunciadas e não conseguiram ser processadas administrativamente a tempo. Não foi um problema de ineficiência da SRI ou de ineficiência do governo no sentido de não querer fazer.
Já recebi vários deputados que vieram se queixar. Em alguns casos, mostrei claramente. Falei assim: "Olha, na verdade o projeto que foi apresentado não estava adequado ao objeto da emenda". Isso acontece muito. Já aconteceu comigo várias vezes.

Dos outros dois pontos que o sr. citou, a reforma ministerial já passou.
Encerrou.

A montagem de palanques ainda vai até junho. Até lá vai haver uma certa tensão?
Acho que é natural. Há uma série de indefinições sobre quem será aliado de quem nas campanhas estaduais. Mesmo na campanha nacional não temos um palanque fechado. Isso vai levar a ansiedade.
Acompanhei nos últimos 20 anos inúmeras campanhas. Sempre digo o seguinte: quem faz bem o processo político é quem não tem ansiedade. Muitas decisões são tomadas dois dias antes de fechar o prazo. As decisões são retardadas não porque se queira retardar. É porque de fato tem que consultar prefeitos, governadores, bases sindicais. Alianças entre partidos muitas vezes são quebradas por razões que têm a ver com a eleição nacional. É natural que isso aconteça. Vamos ter paciência: são três meses de tensão.

Um dos focos de tensão na relação Palácio do Planalto-Congresso foi o PMDB. Há um temor dos peemedebistas a respeito de nesta eleição ficarem ainda mais atrás do PT em número de deputados. Isso está acontecendo?
Não. Há muita conversa sobre isso, mas se você olhar os números e os dados não há nenhuma perspectiva de que o PT faça uma bancada superior ou muito superior à atual. Não vejo essa perspectiva.

Qual é a perspectiva do PT para a Câmara dos Deputados na eleição deste ano?
A bancada do PT deve se reproduzir. É muito difícil crescer.
Acho que a do PMDB também está na mesma situação. Pode crescer um pouco, pode se manter. Não vejo uma grande alteração de correlação de forças no Congresso Nacional na próxima eleição.
Sou daqueles que defende que o PT aproxime a sua estratégia política em todo o Brasil com o PMDB. Também com o PP, PSD, PC do B. Com todos os partidos que fazem parte da base, no sentido de buscar uma maior harmonia na convivência. Não dá para a gente ter um foco de tensão muito forte nos Estados e ter uma aliança nacional. Quero ter harmonia nos Estados, nos municípios e no Parlamento.

Mas por que ouvimos de deputados e de senadores aliados ao governo que o PT é muito fominha, que o PT quer tudo: ganhar no Congresso, ganhar nos Estados etc.?
Não é uma imagem, é uma trajetória. O PT de fato se afirmou politicamente lançando candidato para tudo. Só que quando você chega a um patamar de responsabilidade de governar Estados importantes, de governar a República, num cenário político-partidário brasileiro que é muito fragmentado e heterogêneo, você tem que fazer de maneira tranquila e serena concessões equilibradas. É claro que você não pode matar o partido na base impondo situações para todos, mas você pode fazer uma seleção, como fizemos em 2006, em 2010, em 2002. Dizer o seguinte: "Teremos candidato em tais Estados e queremos o apoio dos aliados em tais Estados e apoiaremos em outros".
Temos no Congresso Nacional o maior partido da Câmara, [mas] hoje o PT não tem 18% da Câmara. Então não podemos ter a visão de que vamos hegemonizar a política nacional. Nós comandamos uma aliança de centro-esquerda e que é responsável hoje por grandes avanços no país. E queremos que o PMDB, o PP, o PSD, o PC do B o PDT e outros se apropriem desses bons resultados também junto com o PT para disputar a política nacional. Não queremos uma hegemonia só do PT. Queremos uma hegemonia do conjunto da base.

Uma hegemonia da aliança formada em torno do governo?
Exatamente. O que nos Estados nem sempre se reproduz. É uma característica da política brasileira. A cultura política de cada Estado é diferente. Se você examinar em cada Estado existe uma trajetória diferente dos partidos que estão na base do governo hoje.

O PT tende a ficar com a maior bancada na Câmara dos Deputados?
É difícil prever.
Como previsão acho que é razoável dizer isso, mas

Até hoje vigorou um acordo que prevê o rodízio entre o PT e o PMDB para ocupar a presidência da Câmara dos Deputados. Na lógica da aliança que o sr. propõe, mesmo que o PT fique com a maior bancada em 2015, deveria ceder ao modelo de alternância com o PMDB na presidência da Câmara?
Eu ajudei a fazer o acordo, em 2007, que elegeu Arlindo Chinaglia [PT-SP]. Com apoio do PMDB e que depois redundou na eleição de Michel Temer [PMDB] no período seguinte. E também apoiei de maneira entusiasmada a renovação do acordo que redundou em Marco Maia [PT-RS] e depois Henrique Eduardo Alves [PMDB-RN].

O acordo foi renovado, mas acaba agora...
Acaba, mas não há razão para a gente imaginar que ele acabe porque nós não queremos mais. Ele extingue a sua validade nesse período, mas PT, PMDB e outros partidos da base são decisivos para uma estratégia de consolidação política desse projeto que nós do Poder Executivo comandamos. Se nós queremos uma coalização governamental e não só um arranjo temporário, e sabendo que o Brasil não é um país que tem uma predominância ideológica de nenhuma corrente, nós queremos fortalecer essa aliança com todos os partidos da base, com o PMDB, que hoje é o segundo maior partido da Câmara e o primeiro do Senado, e tende a ser uma força muito relevante na próxima eleição. E com os demais partidos também. Não temos qualquer tipo de dificuldade de fazer uma discussão sobre essa questão da composição do Parlamento, da composição da Mesa, a partir dessa visão política mais estratégica.
Falo neste momento pela minha visão pessoal. Tem gente no PT que pensa diferente. Tem gente no PMDB que pensa diferente. O que nós queremos é construir um ambiente em que haja esse sentimento de que não há deslealdade entre os partidos.

Mas o sr. acha desejável e exequível renovar esse acordo de revezamento entre o PT e o PMDB na Presidência da Câmara?
É cedo para responder porque quem vai responder no momento adequado é o partido.
Como deputado e hoje com a responsabilidade que tenho, desejo fortalecer a relação com o PMDB e com os demais partidos da base.
O que legitima o PT a ficar no governo até hoje é exatamente o apoio desses partidos e o diálogo com a população sobre programas como Minha Casa Minha Vida, Bolsa Família, o Prouni, a geração de empregos, que são os elementos que dão sustentação política para esse projeto.

O sr. não deseja dizer agora se esse acordo deve ser repetido, o acordo PT-PMDB para comando da Câmara...
Se disser, estou sendo impróprio. Não tenho o comando desse processo. Tenho a participação nas opiniões. Acho que depende das eleições e da campanha. Para responder de maneira mais direta à sua pergunta, faço um balanço positivo do acordo de 2007 e do acordo de 2010. Não sou daqueles que acha que "isso foi errado", "isso foi um equívoco". Reconhecendo a situação política do país e entendendo que ninguém tem hegemonia ampla para poder comandar diretamente o processo sem colaboração com outras siglas, acredito que o acordo amplo é o melhor para o parlamento e o melhor para o Brasil.

Em 2010, Dilma Rousseff foi eleita a presidente da República com uma aliança formal de dez partidos políticos. Que tamanho terá essa coalizão neste ano?
Vai ser uma aliança ampla. Nós tínhamos em 2006, você se lembra, apenas PT, PRB e PC do B, uma aliança estreita, formal, e com apoio dos políticos informais. O tamanho da aliança é importante, não só em tempo de televisão, mas também para fazer o diálogo político da base, onde nós temos vereadores, prefeitos, que têm um papel muito importante na eleição.
Nós estamos trabalhando para fazer uma aliança ampla. Tentar reproduzir ao máximo essa aliança que nós fizemos em 2010.

O PP, antiga Arena, em 2010 já participava do governo, mas ficou neutro. Desta vez, continua no governo, mas ainda não disse se vai apoiar Dilma oficialmente. É uma situação natural?
Em 2010, acompanhei o debate e entendemos a posição do PP. A maioria dos parlamentares do PP apoiava Dilma, mas não havia clima para fazer uma decisão por maioria. Em 2014, creio que há um clima muito positivo para o PP integrar a coalizão. Não está assegurado, mas é uma possibilidade grande.

Apesar desse seu discurso a favor da unidade na aliança pró-governo, por que persiste a ideia de que o PT na hora "H" vai chutar todo mundo e ficará sozinho governando?
Tem gente que propaga essa ideia até como uma forma de desgastar o PT. Não estou dizendo que o PT não quer o poder. Todos os partidos e todos os políticos querem o poder. Isso é normal.
Agora, o partido tem que ter consciência. Quando fui presidente do PT, defendi isso na Comissão Executiva e no Diretório Nacional o tempo todo. Defendi num congresso essa posição: que nós precisamos construir no Brasil uma estratégia que vá muito além dos limites do PT. Isso significa dialogar de uma maneira muito ampla com os demais partidos, reconhecendo aquilo que falei: nós temos diferenças de interesse e divisões ideológicas muito grandes na base do governo. É uma base extremamente heterogênea.
O Brasil não é um país no qual se consolidaram três ou quatro posições ideológicas que se expressem eleitoralmente de maneira nítida para o povo. Nós ainda temos muita diferença e muita imprecisão programática nos partidos.
O PT também tem internamente essas diferenças. Construir esse quadro exige muita habilidade, paciência, e, principalmente, exige que nós possamos combinar o que é a dinâmica política da Federação com os Estados e os municípios.
É muito difícil combinar. Exige muita perseverança para manter aquilo que nós mantemos já há 12 anos: uma aliança ampla, capaz de respeitar as contradições, e governar o Brasil produzindo um resultado positivo para o povo, na renda, no salário, no emprego.

A presidente Dilma Rousseff sofreu um pequeno abalo na popularidade. Segundo o Ibope, ela teria hoje 36% de aprovação para o governo. A que o sr. atribui esse solavanco?
Não faço pouco caso de pesquisa, mas não dou muita importância para pesquisa a tanto tempo das eleições.

Mas no caso é avaliação de governo...
Mesmo avaliação de governo. Há uma volatilidade de acordo com o noticiário. Você tem períodos em que há um noticiário muito intenso, negativo. Noticiário muitas vezes desproporcional à realidade.
As pessoas estão vivendo a sua vida. Estão com desemprego baixíssimo. Têm uma situação de salário mínimo de aumento real. Uma situação de crescimento da atividade econômica, ainda que não no patamar ideal, mas um dos maiores do mundo. E você olha para a pauta da mídia... É uma pauta muito negativa e que tem influência nas pessoas.
Em segundo lugar, de fato nós estamos vivendo uma conjuntura econômica desafiadora. Aquilo que era mais nítido, evolução e crescimento, agora parece conturbado por indicadores externos desfavoráveis que contaminam inclusive a política econômica do governo.
Você tem momentaneamente situação de instabilidade. [No] começo do ano, despesas elevadas com a questão educacional para a classe média. Inflação de hortifrútis em função do clima. Você tem evidentemente algum grau de incerteza.

Há um movimento incansável dentro do seu partido, às vezes até fora dele, que é chamado de "volta, Lula", que pede o retorno do ex-presidente da República como candidato do PT ao Planalto neste ano. O que o sr. acha disso?
Não concordo que haja esse movimento. Convivo com deputados, senadores, dirigentes do partido.

Mas ele existe. O sr. nunca ouviu isso?
Ouvir, pontualmente, é claro que ouvi. Mas não de pessoas que têm a responsabilidade de direção do partido e nem de maioria de bancada ou da maioria de prefeitos e de governadores. O sentimento que há hoje é que nós vamos trabalhar, sim, para fazer Dilma de novo com o apoio do Lula e do povo.
Vamos trabalhar para viabilizar uma eleição onde fique explícita a diferença de perspectivas para o país entre o nosso projeto e o projeto da oposição. E principalmente lembrar que Dilma e Lula são partes do mesmo projeto. Não há dissociação.

Não há hipótese viável para que Lula volte e seja o candidato este ano, ainda, do PT a presidente?
Não, não há essa hipótese. Dilma é nossa candidata. Ela tem o apoio do partido como um todo. Ninguém nunca colocou essa discussão em diretório nacional. Ninguém nunca colocou essa discussão em fóruns do partido. Posso assegurar que a imensa maioria da bancada do PT não tem qualquer cogitação em relação a isso. Se tiver dois, três ou quatro pessoas que tenham essa perspectiva, não falam abertamente. Podem falar nos corredores, mas não falam abertamente. E na base do partido, hoje, há um sentimento muito forte em relação a essa perspectiva de reeleger Dilma como primeira mulher presidenta da República e que cumpriu rigorosamente todos os seus compromissos que assumiu com o povo brasileiro e com o partido. Evidentemente mediado pela conjuntura e pelas circunstâncias. Mas não desonrou em nenhum momento aquilo que nós projetamos em 2010.

O PSB, aliado ao PT em muitas eleições, agora estará separado. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, se tivesse ficado dentro da aliança, teria perspectiva algum dia de ele ser candidato a presidente com apoio do PT?
Nunca cogitei essa discussão dentro do partido. Acho que é uma questão que ficou no campo das hipóteses. É claro que ele, como aliado, que participou ativamente, apoiou todas as medidas que foram tomadas por Lula e por Dilma até o momento em que decidiu sair, ele seria uma das figuras que poderiam ter pretensão.

O sr. acredita que algum dia o PT vai apoiar alguém para presidente que não seja do PT?
Se depender de mim, sim. Sempre defendi que o PT não pode ter a ilusão de que vai comandar uma coalizão de forças partidárias sempre "na cabeça". Se tiver uma liderança que se imponha pela sua capacidade, pelo seu discurso, pela sua lealdade, e principalmente pelo alinhamento com esse conjunto de partidos, não há razão para o PT achar que tenha a hegemonia, a primazia, o monopólio de candidaturas. Se nós quisermos que esse projeto continue, nós temos que atrair pessoas que reconheçam no PT um aliado leal e capaz de agregar. Não um aliado que se impõe só por uma eventual posição de força.

Mas está longe esse dia ainda, não está?
Olha, aí é uma opinião sua. Eu pessoalmente...

...Não é opinião. Este ano a candidata é Dilma Rousseff. Em 2018, o ex-presidente Lula vive sugerindo que pode voltar a ser candidato. Vai demorar muito então para que alguém encontre um lugar ao sol na aliança liderada pelo PT...
Na política, qualquer previsão a mais de dois anos do evento é algo absolutamente imponderável. Claro que o presidente Lula é uma figura que tem sempre uma possibilidade de ser candidato. Claro que se for necessário, e ele achar que pode cumprir essa tarefa, ele cumprirá. Mas se surgir uma outra perspectiva que possa agregar e que possa significar inclusive algo projetando para a frente na política do Brasil, por que não trabalhar com isso?
Acho que isso depende da capacidade dos partidos de apresentar alternativas. Liderança não se impõe. Liderança não se estabelece a partir de decreto. Liderança se constrói.
O presidente Lula percorreu uma longa trajetória até que o povo brasileiro se sentisse seguro para depositar nele a confiança em 2002.

O deputado federal e vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), viajou em um jatinho oferecido por um doleiro. Qual a sua avaliação sobre esse caso?
Ele prestou ontem esclarecimentos à tribuna da Câmara. Acho que uma pessoa que vai à tribuna da Câmara rapidamente para apresentar a sua colocação, independentemente do conteúdo, demonstra, no mínimo, que tem compromisso com a sua base, com o seu partido, com o Parlamento. Não tenho nenhuma razão para fazer um comentário específico sobre o mérito dessa questão.

Deputados e senadores reclamam que a presidente recebe poucos congressistas. A presidente está disposta a mudar esse hábito?
Acho que essa convivência é um dos objetos dessa visão de futuro que acho que é fundamental, que é combinar aquilo que é a agenda administrativa, a agenda do dia-a-dia da campanha. Com a interação com os parlamentares. Muitas vezes um deputado tem uma boa ideia, uma boa opinião a dar, e não tem a oportunidade nem de dar ao ministro ou à presidente da República. Então você, criando uma interação maior, viabiliza muitas vezes entendimentos.

A presidente está disposta a entrar numa fase de receber mais os congressistas?
Não tenha dúvida. A presidenta tem recebido bastante gente. Intensificado a sua agenda de visita aos Estados. Acho que vamos ter mais interação. Nós vamos construir uma dinâmica mais agregada, para viabilizar uma base que tenha mais entendimento e menos motivo para ter divergência.

Acesse a transcrição completa da entrevista

A seguir, os vídeos da entrevista (rodam em smartphones e tablets):

1) Principais trechos da entrevista com Ricardo Berzoini (8:34)

2) PT precisa fazer concessões, diz Berzoini, articulador de Dilma (2:35)

3) Revezamento PT-PMDB na Câmara é positivo, diz Berzoini (1:49)

4) Queremos aliança ampla para Dilma semelhante à de 2010, diz Berzoini (1:13)

5) Berzoini: Conjunto do governo tem de cumprir acordos com o Congresso (1:28)

6) Liberação de emendas não terá influência política, diz Berzoini (2:18)

7) CPI da Petrobras encobre vazio programático da oposição, diz Berzoini (2:08)

8)'Volta Lula' não é movimento majoritário no PT, diz Berzoini (1:07)

9) Quem é Ricardo Berzoini? (1:31)

10) Íntegra da entrevista com Ricardo Berzoini (62 min.)

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