Folha de S. Paulo


Leia a transcrição da entrevista de José Dirceu à Folha e ao UOL - parte 2

José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil e condenado pelo STF no julgamento do mensalão, participou do "Poder e Política", projeto do UOL e da Folha conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 9.abr.2013 no estúdio do UOL em São Paulo.

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José Dirceu - 9/4/2013

Folha/UOL: Ministro, outra campanha que o PT resolveu abraçar de forma mais efetiva é uma campanha para a regulamentação da mídia. O ministro Paulo Bernardo, do governo da presidente Dilma e um militante histórico do PT, deu uma declaração recentemente dizendo o seguinte: "Toda vez que sai uma capa de revista que um companheiro não gosta, ele vem aqui e quer que eu regule a mídia". Isso se confunde com censura? Nas palavras dele, é um pouco isso.

José Dirceu: Acho que ele fez uma caricatura, mas, depois, ele até disse que é a favor da regulamentação da mídia. Eu fico estarrecido com a relação de alguns setores da mídia com relação à regulação. É uma mistura de ou burrice, ou defesa intransigente do monopólio e de interesses comerciais, de reserva de mercado. Por que o PT quer censurar a imprensa? Mesmo que quisesse, não tem força para isso. O PT tem oitenta e tantos deputa dos. A maioria não vai concordar com isso, a imensa maioria. O PT tem 13, 14 senadores. Todos não concordar com isso.

Folha/UOL: Disse o ministro Paulo Bernardo que alguns querem.

José Dirceu: 90% do PT jamais aceitaria qualquer ideia de censura à imprensa até porque a nossa vida é uma prova da luta pela liberdade de expressão. Essa é a primeira impressão. Outra coisa é regular mídia. Veja bem, querem regular a mídia. Tanto é que regularam a TV a cabo contra o capital estrangeiro, conteúdo nacional, fundo de financiamento, que vai para R$1 bilhão e 200, depois para R$3 [bilhões]. Regularam. Puseram uma agência reguladora. Aquele fantasma da Ancinav [Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual], está aí a Ancine [Agência Nacional do Cinema] regulando. Na Inglaterra estão regulando a imprensa escrita, que nós nunca, no Brasil, nem auto-regulação pedimos.

Folha/UOL: Claramente, o que é a regulação da mídia que o PT está defendendo?

José Dirceu: Por exemplo, basta você ler o editorial do O Globo que eles dizem que pode ter regulação sim. Por causa do site estrangeiro. Por causa do capital estrangeiro. Por causa da propriedade de parlamentar, de igrejas. Levanta vários casos da regulação. A regulação pode ser da propriedade cruzada. A regulação por causa da cultura, da etnia, das minorias nacionais. A regulação pode ser para o pluralismo para acabar com o monopólio. Todos os países tem regulação. O México acabou de fazer regulação.

Folha/UOL: No Brasil, o sr. pode dar algum exemplo concreto? O que seria regulação da propriedade cruzada? Concretamente em um exemplo. Com nome e sobrenome.

José Dirceu: Você pode por limites. O que não é possível é alguém, além de deter 70%, 80% de toda a publicidade do país nas suas organizações, ter uma propriedade cruzada quase que fantástica de rádios e televisões e jornais.

Folha/UOL: O sr. está se referindo a quem?

José Dirceu: As organizações Globo. Porque tem, por exemplo, os seus associados nos estados. Por exemplo, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, a RBS controla os jornais praticamente. Controla os jornais. Tanto é que o Ministério Público entrou... O Ministério Público Federal entrou com uma ação contra o monopólio no sul do país dos meios impressos.

Folha/UOL: Acha que deveria acontecer o que? Essas empresas...

José Dirceu: Eu não quero dizer o que deveria acontecer. Eu quero dizer o seguinte: Que é preciso tirar esse espantalho, a camiseta 13 do PT, e discutir, seriamente, a regulação da mídia no Brasil. Interessa à cultura brasileira. Interessa ao pluralismo que está na Constituição Brasileira. A Constituição diz para você ter pluralismo. A Constituição diz que o interesse público tem que ter. Mas, a Constituição diz que tem que ter televisão pública. É bom para o Brasil ter mais vozes, mais antenas. Vamos estimular isso pela concorrência comercial, que depende da competência, de você ter capital. Eu, pelo menos, há muito tempo perdi um pouco a ilusão em ter jornal de sindicato, ainda de ter que ter jornal de esquerda, ainda que tem que ter... E sempre trabalhei para ter mais competição comercial. Agora, a legislação tem que favorecer e não proteger o monopólio porque a Constituição diz que não pode ter monopólio. Ninguém está discutindo controle de conteúdo e censura. Nunca... Como é que eu vou controlar o conteúdo? Se não, poderiam dizer que quem controla o conteúdo são os donos do meio de comunicação. Porque, aí, a discussão se radicaliza, entendeu? Eles falam: "Não, mas quem controla o conteúdo é quem controla o capital".

Folha/UOL: Não foi o próprio PT que acabou envenenando esse debate?

José Dirceu: Não. O PT não envenenou o debate. O PT se defende. Eu, pelo menos, todos são testemunha, que vou para imprensa, peço para escrever. Eu fico alguns momentos sem dar entrevista porque os meus advogados não permitem que eu dê. Porque, por mim, eu daria sempre entrevistas.

Folha/UOL: [risos] O sr. está dizendo os seus advogados mandam em no sr.? E controlam o seu conteúdo?

José Dirceu: Evidente, eu tenho juízo, não é? Eu tenho que ouvir os meus advogados. Eu tenho que ter uma relação de confiança com o meu advogado, que é o dr. José Luís de Oliveira Lima, o Juca. Com ele e com os meus amigos que são advogados: O Kakay, o Márcio Thomaz Bastos... Todos eles que sempre me apoiaram e me ajudaram. Vários deles, que eu não quero citar todos aqui.

Folha/UOL: José Dirceu, por que o sr. acha... O ex-presidente Lula avançou um pouco nessa discussão, lançou esse debate. No entanto, a presidente Dilma recuou. O sr. acha que ela acredita que essa proposta de regulação dos negócios da comunicação é antidemocrática ou ela teme esse debate?

José Dirceu: Não. Eu acho que ela tem os pés no chão. Ela tem que governar o país. Ela tem problemas. Ela estabelecer prioridades. Ela conhece a relação de forças no Congresso e na sociedade. Ela não pode se jogar de corpo e alma nessa questão. Cabe ao PT... Ao presidente Lula, ao PT, aos movimentos sociais, aos jornalistas, aqueles setores da sociedade que acreditam eu a regulação é um bem para o Brasil, não um mal, que não é censura, certo? Que é ampliar, pelo contrário.

Folha/UOL: Como esse debate avança se o governo, a todo momento, fala "o governo não vai fazer absolutamente nada"?

José Dirceu: É assim muitas vezes. Quantos anos nós levamos para ter a Comissão da Verdade? O governo do presidente Lula não tinha isso na agenda. A presidente Dilma colocou na agenda e nós conseguimos. Isso é um processo político. Eu não censuro a presidente e nem a coloco sob suspensão porque ela, dentro das atribuições dela como presidente da República, algumas questões ela não coloca na agenda. O PT coloca na agenda. Ela nunca disse para o PT não colocar. Ela nunca censurou o PT ou tentou impedir o PT de colocar na agenda. Cabe ao PT colocar como, aliás, o presidente Rui Falcão fez. Ele tem sido um defensor e tem colocado, até com transparência porque ele é um jornalista, porque o PT está defendendo isso. Eu estou disposto a discutir essa questão sempre.

Folha/UOL: Por que o ex-presidente Lula decidiu lançar tão cedo, agora em fevereiro, a candidatura a reeleição da presidente Dilma?

José Dirceu: Porque queriam jogar xadrez só com as brancas ou com as pretas. Acharam que nós não existimos. Quer dizer, o presidente Fernando Henrique Cardoso assume o papel de coordenador, conselheiro e agitador da campanha de Aécio Neves presidente da República. O governador Eduardo Campo se lança candidato à presidência da República. E nós vamos fizer esperando 2014? Não fomos nós que antecipamos. Mas começa-se a criar um clima, um ambiente que o Lula vai ser candidato e que a presidente Dilma não vai ser candidata a reeleição. Evidente que só tinha uma coisa para fazer. Então, vamos jogar também xadrez. Entramos no jogo de xadrez. A Dilma é candidata. Eu não sou candidato. É evidente que, no PT, a unanimidade é pela a candidatura dela à reeleição. Agora, a única coisa que nós não deixamos de governar para fazer isso, como o Eduardo Campos não deixou de governar. Como Alckmin não está deixando de governar. O Aécio é senador da República e não está deixando de ir ao Senado. Agora, foi antecipado a sucessão mas não entrou na agenda o governo isso, entrou na agenda do PT e do presidente Lula.

Folha/UOL: Há quem critique e há quem ache bom. O sr. acha bom ou ruim que acabe essa hipocrisia de não ter campanha tão antecipadamente?

José Dirceu: Acho ruim ter campanha antecipada. Mas, se a realidade nos impõe isso, nós temos que fazê-lo com menor prejuízo possível ao país porque o país tem muitos problemas para resolver. O país tem dilemas para enfrentar esses próximos anos. Alguns fáceis de resolver, como é o da estrutura.

Folha/UOL: Eu vou entrar nesse assunto, mas antes na política. Quem o sr. acha que são os candidatos que devem acabar, realmente, concorrendo no ano que vem à Presidência da República?

José Dirceu: A ex-ministra, ex-senadora Marina Silva com o partido dela, que é bem-vindo, porque eu acho que é muito importante ter um partido no Brasil com o perfil que vai ter, com o caráter que vai ter. Concordemos ou não, tenhamos discordância ou não. Eu acho que ela tem um lugar no Brasil. Faz bem para o Brasil, para a democracia, que ela ocupe esse lugar. Eu vejo com bons olhos isso. Outra questão é se eu concordo ou não. O governador Eduardo Campos eu acho que é candidato.*

Folha/UOL: É irreversível?

José Dirceu: Não. Irreversível nenhuma candidatura é. Mas eu diria que ele é candidato legítimo, com todo o direito. Aliás, o governador [Anthony] Garotinho foi candidato em 2002. Ninguém ouviu um "a" nosso tentando tirar a legitimidade dele ou impedindo ele de ser candidato em 2002. Vai ser candidato, faz parte da disputa política. É um candidato, vamos dizer assim, no nosso campo. Depende, evidentemente, das alianças que ele vai fazer, mas está no nosso campo.

E o senador Aécio Neves, pelo PSDB, acho que está consolidado. Há que ver o que fará o nosso José Serra, que já foi candidato duas vezes, que foi senador, prefeito, governador de São Paulo, deputado federal, secretário, tem todos os méritos e condições de ser candidato a presidente da República. Se ele fará um novo partido com o PPS e o PMN... Se vai tentar compor com o Eduardo Campos ou não, se vai apoiar o Aécio ou não e se será candidato. Porque também essa hipótese eu acho que não deve ser afastada. Eu acho que ele sempre, legitimamente, quis ser presidente [da República]. Aliás, ele se preparou e sonhou a vida toda, legitimamente, em ser presidente da República. Se tem um homem no Brasil que lutou por isso, foi o Serra.

Folha/UOL: O sr. está dizendo, então, que a presidente Dilma [será candidata] à reeleição. Aécio Neves, Eduardo Campos, Marina Silva... José Serra, uma incógnita. E Joaquim Barbosa?

José Dirceu: É muito difícil prever isso. Porque está na Presidência do Supremo. O mandato dele termina em novembro de 2014, se eu não me engano. É novembro de 2014. Eu acho que é muito difícil. Nas pesquisas ele já aparece, nas pesquisas estimuladas com uma votação que ele pode [alcançar]. Se ele quiser, ele pode se filiar. A legislação até beneficia quem é magistrado, não é? E pode se filiar a um partido e ser candidato. Mas eu não vejo, hoje, pelo menos, ele nunca deu nenhum sinal que queira ser candidato da República.

Folha/UOL: O Eduardo Campos, que é governador de Pernambuco, pertence ao PSB. O sr. disse "do nosso campo político". Ele, hoje, com o partido dele, participa do governo da presidente Dilma Rousseff. Em que momento, se ele vier a ser candidato à presidente, ele deve retirar o PSB do governo ou não deve?

José Dirceu: Essa é uma questão que ele e a presidente Dilma devem avaliar.

Folha/UOL: Mas o sr., o que acha?

José Dirceu: Eu acho que ele tem que encontrar o ponto de inflexão que ele e os companheiros ministros que estão no governo e os governadores, as principais lideranças do PSB, considerem irreversível e que devem sair do governo. Não há nenhum problema, até agora, de ele ter essa possibilidade, que eu acho mais provável, de ser candidato [a presidente da República] e continuar no governo. Isso não está... Os ministros dele não estão deixando de ser leais à presidente e nem deixando de cumprir o programa de governo da Presidência. Eu, pelo menos, não colocaria aí nenhum óbice nesse momento.

E cada um tem o seu prazo. Para alguns é abril agora. Para outros é outubro [de 2013]. E para alguns é abril de 2014. Aí depende da correlação de forças, da sua força eleitoral. Eu sou de opinião que alguns deveriam sair agora do governo e começar a fazer a pré-campanha nos Estados.

Folha/UOL: Ah, é?

José Dirceu: É porque Estado em que você precisa... Entende?

Folha/UOL: Como assim? Por exemplo?

José Dirceu: Tem governador... Tem senador que já está fazendo campanha de governador nos Estados.

Folha/UOL: Mas quem está no governo, digamos, que deveria [sair para começar a fazer campanha]?

José Dirceu: Eu não vou dar nenhum exemplo particular porque vai parecer que eu estou propondo que ele saia do governo. Os deputados do Estado já estão cobrando de alguns pré-candidatos que fiquem mais no estado, que são ministros [os pré-candidatos].

Folha/UOL: Até que ponto a Ação Penal 470 inibiu uma candidatura do presidente Lula que, depois de todo esse tempo de governo Dilma, ele ainda mantém uma votação? Segundo o Datafolha, 60% dos brasileiros votariam nele para presidente da República. Mais até do que nela [Dilma], que é de 59%, né? Um pontinho a mais. Mas até que ponto essa Ação Penal 470 inibiu não necessariamente o presidente Lula, mas o movimento de lulistas que gostariam de vê-lo de volta à Presidência [da República]?

José Dirceu: Mas esse movimento sempre foi muito pequeno. Nunca ganhou uma dimensão grande. Nunca senti na direção nacional do PT, na bancada de deputados federais, de senadores... Um ou outro sim... [Nunca senti] um sentimento majoritário de que o Lula deveria voltar em 2014.

Folha/UOL: Ele pode se candidatar ao governo de São Paulo ou ao Senado?

José Dirceu: Tudo indica que não. Nós temos até candidato demais para o governo de São Paulo, felizmente.

Folha/UOL: Quem são eles? Quem são os pré-candidatos que o sr. citaria?

José Dirceu: O próprio ministro Aloizio Mercadante [da Educação], que já foi candidato duas vezes, tem uma base eleitoral ampla, tem experiência, tem mais do que capacidade, competência, legitimidade para ser candidato. Segundo, uma inovação, o ministro Padilha [Alexandre], ministro da Saúde. Depois, nós temos outros nomes, como o Luiz Marinho [prefeito de São Bernardo do Campo], como o José Eduardo Martins Cardozo [ministro da Justiça], o próprio Emídio de Souza, que foi prefeito reeleito de Osasco e fez o sucessor. O PT tem outras...

Folha/UOL: O ministro Guido Mantega [da Fazenda]?

José Dirceu: Também, o ministro Guido Mantega também. Por que não?
É um nome... Agora, tudo indica que, primeiro, nós temos que ter primeiro uma decisão do próprio Aloizio Mercadante. Acho que a própria ordem dos fatores é essa, né? A presidenta e ele, o partido, as lideranças do partido, o próprio presidente Lula têm que chegar...

Folha/UOL: Se fosse para ganhar não era o caso de o PT escolher alguém realmente bem forte, daí cita-se essa hipótese de o ex-presidente Lula...

José Dirceu: Não. O Lula não será candidato a governador. Não será candidato a presidente [da República]. Porque ele já tinha, pelo menos ele afirmou e reafirmou para mim que [ao] voltar a ser presidente em 2014, [há] o risco de ele jamais fazer um governo como o que ele fez [de 2003 a 2010]. Lula só poderia voltar numa emergência, numa demanda da sociedade para ele voltar. E a demanda da sociedade é para reeleger a presidenta, né? É só ver as pesquisas. Ela tem todas as condições de ser candidata e continuar governando o Brasil.

Folha/UOL: O sr. falou aqui que gostaria de participar desse debate da mídia, de vários debates. Como é que o sr. vai fazer isso se é provável e, vamos dizer, é certo... Como que o sr. vai fazer isso preso?

José Dirceu: É, primeiro precisa ver se eu vou ser preso. Porque eu vou me defender na Justiça para não ser preso. Porque é um direito que eu tenho. E a lei me dá esse direito e o Código Penal me dá o direito dos recursos, dos embargos, infringentes e declaratórios. Da mesma maneira que eu sempre participei da vida política do Brasil de qualquer forma. Eu não me exilei, eu fui banido e a minha nacionalidade foi cassada. Eu fui expulso do Brasil, no sequestro do embaixador americano [Charles Elbrick] e voltei em 1971. Depois voltei de novo no final de 1974. Eu tenho determinação de continuar da vida política e vou encontrar meios de fazê-lo em qualquer circunstância em que eu esteja. Seja em regime fechado, seja em semiaberto, seja em pena alternativa. E o tempo passa rápido, mas rápido do que parece.

Folha/UOL: No Natal, houve ali uma expectativa e um clima de tensão muito forte sobre uma eventual decisão do ministro Joaquim Barbosa de já determinar sua prisão. Como o sr. se sentiu naquele dia?

José Dirceu: Em primeiro lugar, um sentimento de indignação porque era uma arbitrariedade nunca vista. A circunstância que era Natal, fim de ano, era tudo ao contrário do que se poderia imaginar. Ainda que muitos quisessem a nossa prisão.

Folha/UOL: Mas qual foi o seu sentimento? O sr. teve algum medo? Como o sr. definiria...

José Dirceu: Eu não diria que eu tenho medo da prisão. Eu tenho um sentimento de revolta. Sentimento que eu não sei como expressar o sentimento que eu tenho, pela injustiça que está sendo cometida contra mim. É... eu às vezes quase não acredito que esteja sendo processado e tenha sido condenado como corruptor e formador de quadrilha, ter participado de uma quadrilha. Realmente, pela minha vida e pelo que aconteceu com esses fatos, é um processo que merece o nome de "O Processo", como o "Processo" do Kafka [Franz Kafka, escritor tcheco]. Porque é algo... é uma tragédia. Para mim é uma tragédia. Não, para mim, do ponto de vista do que vai significar isso, porque eu vou superar isso, eu vou enfrentar isso, estou me preparando para isso.

Folha/UOL: Preparando-se para quê? Para ser preso?

José Dirceu: Sim. Estou preparado para qualquer circunstância. Como sempre eu me preparei na vida. Não quer dizer que eu não possa fraquejar, que eu não possa... ser incapaz de enfrentar isso. Porque eu não sou nenhum super-homem, eu sou um cidadão como qualquer outro, evidentemente que, para mim, para os meus filhos, para a minha família, para os meus amigos, para a minha história, isso é uma coisa.... Eu às vezes penso que era melhor que eu tivesse morrido, do que ter passado pelo que que estou passando.

Folha/UOL: O sr. já chegou a pensar nisso mesmo [na morte]?

José Dirceu: Não! Eu sou apaixonado pela vida. Eu jamais pensaria em qualquer possibilidade.

Folha/UOL: Qual foi o momento mais difícil nesse processo? Teve algum momento...

José Dirceu: Quando eu sai do governo. Quando eu sai do governo. Porque eu dediquei minha vida para que o Brasil fosse governado por nós, pela minha geração, pela esquerda e pelo Lula. Desde 1988 eu já dizia que o meu sonho era fazer o Lula presidente da República, ou pelo menos participar, sendo mais humilde, participar de um movimento político-partidário, de um movimento de uma geração, de um movimento de um amplo setor da sociedade brasileira para levar um homem como o Lula à Presidência.

Folha/UOL: O sr. se recorda do diálogo que teve com o então presidente Lula no dia em que ficou definida sua saída [do governo]?

José Dirceu: O diálogo foi curto, simples e objetivo. Porque eu e ele tínhamos a mesma opinião de que eu devia sair do governo.

Folha/UOL: E como foi?

José Dirceu: Eu, ele e o Genoíno nos encontramos na Granja do Torto e a conversa foi rápida. Depois, nós ficamos conversando sobre as consequências, o cenário, o que estava acontecendo, entendeu? Mas a conversa foi curta porque eu já tinha firmado convicção de que eu deveria sair [do governo], como eu formei convicção de que eu não deveria renunciar [ao mandato de deputado federal]. Eu tenho posições sempre... Eu tenho experiência de vida suficiente para ter posições bastante claras e objetivas quando chegam momentos de crise.

Folha/UOL: Agora o sr. fala que pode fraquejar, que o sr. não é um super-homem, mas o sr. tem um pouco essa persona, não é? O sr. tem um pouco esse personagem da pessoa que não chora, da pessoa que não se abala, da pessoa que está pronta para enfrentar qualquer coisa. Qual é o momento que o sr. fraquejou? Quando?

José Dirceu: Chorar eu choro. Todo ser humano chora. E ficar triste, ficar abalado, eu fico. Agora mesmo eu fiquei. A morte do Chávez, por exemplo, ou do Marcos Bassi, que era um grande amigo meu que eu conheci na década de 60, ainda, quando ele trabalhava para o pai dele ainda. Quando eu vivia na Liberdade e no Bixiga, ainda, como office boy, meio menino de rua, naquela época. Office boysempre vive um pouco. Tristeza você sempre tem na vida. Então isso aí é natural. Quando chegar a hora, quando chegara hora eu tenho certeza de que eu vou estar à altura de enfrentar o desafio, qualquer que seja ele. Porque, primeiro, eu tenho a consciência dos inocentes. Segundo, eu tenho serenidade e tranquilidade porque eu sou inocente para enfrentar isso. Tenho até mais força para enfrentar isso, porque eu sou inocente. Porque eu vou continuar lutando para provara minha inocência. Não só na Justiça como politicamente no país. Não foi escrito o último capítulo ainda deste julgamento. No que diz respeito a mim, não foi escrito ainda. E nem ao PT. Eu acho que não foi escrito. A história e o tempo vão ter que... Do ponto de vista jurídico, da academia, o debate já é muito intenso. E há um amplo setor que, evidentemente, concorda que o julgamento que mudou o ordenamento jurídico e a jurisprudência para poder me condenar. Porque é evidente que a teoria do domínio do fato, que não precisa atos de ofício, que as provas podem ser tênues, que os indícios tiveram os pesos que tiveram. Uma mudança radical. E muitos ministros jamais votaram assim. Como muitos ministros jamais aceitaram denúncia como a que aceitaram de formação de quadrilha contra nós. Mesmo de corrupção ativa.

Folha/UOL: Ministro, como é a sua vida hoje? A gente percebe que o sr. não tem muita condição de ir a lugares públicos, o sr. não vai mais a restaurantes, o sr. tem sempre encontros reservados. Como é que o sr. vive? De é que vem a sua renda?

José Dirceu: A minha renda vem do meu trabalho, como sempre. Eu sempre trabalhei e declaro meu Imposto de Renda. E tenho a vida que eu sempre tive. Eu não mudei em nada o meu padrão de vida, certo? Eu vivo uma vida de classe média no país. Eu sou advogado e consultor, a mesma coisa.

Eu trabalho, eu faço o blog de manhã cedo, faço academia, trabalho, cuido do processo mais agora, nas últimas semana e meses, trabalho, viajo o país, faço atividades políticas, participo. Ontem mesmo participei de uma reunião de dirigentes...

Folha/UOL: Como o sr. viaja pelo país? O sr. não vai em avião normal.

José Dirceu: EU alugo avião ou tenho avião emprestado. Ou alugo e pago.

Folha/UOL: Agora, esse trabalho é o quê? Um trabalho de lobby, seria isso?

José Dirceu: Não, eu dou consultoria. Na verdade eu estou desativando. A parte jurídica eu, praticamente, já dissolvi o escritório. Até porque, condenado, fica suspensa a minha inscrição na Ordem [dos Advogados do Brasil]. Então eu já dissolvi, já fiz o termo de dissolução do meu escritório de advocacia. E da consultoria, a minha ideia é, praticamente, deixar a empresa funcionando. Porque fechar uma empresa custa mais caro do que deixar uma empresa funcionando.

Folha/UOL: Mas como é que o sr. vive? Quer dizer, o sr. tem uma estrutura, o sr. tem assessor, o sr. tem advogado...

José Dirceu: Eu estou desativando toda a minha estrutura. Paulatinamente eu vou desativar toda a estrutura.

Folha/UOL: Mas o sr. tem reservas para se manter no período seguinte?

José Dirceu: Não, eu vou continuar trabalhando. Eu tenho escritório, eu tenho sócios. Eles vão continuar trabalhando e eu vou ter uma renda mínima, evidentemente, porque eu não estou proibido de trabalhar.

Folha/UOL: Se, eventualmente, como parece que deve acontecer, a sua pena é mantida, o sr. já se informou do aspecto objetivo, prático, como é que vai funcionar, onde o sr. poderia contratar...

José Dirceu: Não, isso não dá para informar porque isso depende da vara de execução criminal. Nem sabemos se a execução vai ser no Supremo ou vai ser na Justiça Federal de São Paulo.

Folha/UOL: E sobre a operacionalidade da vida se houver reclusão, se houver um regime fechado? Comunicação, internet, o sr. tem um blog...

José Dirceu: Isso não tem, não tem.

Folha/UOL: Não tem como?

José Dirceu: Não tem. Preso é preso. Preso faz ginástica, estuda, trabalha.

Folha/UOL: Pode receber visitas.

José Dirceu: Tem as visitas. Do advogado e da família. Isso não tem segredo nenhum, eu já fui preso.

Folha/UOL: O sr. pretende trabalhar para tentar diminuir a pena?

José Dirceu: Eu pretendo trabalhar não só para diminuir a pena, como para trabalhar. Porque eu sempre trabalhei na vida, desde os 14 anos de idade. Eu nunca dependi do governo, do Estado para nada. Nunca. Eu nunca transformei a minha vida parlamentar numa atividade profissional. Tanto é que eu não fui candidato... Depois de ter sido deputado estadual uma vez, eu fui deputado federal e candidato a governador, eu fiquei sem mandato por quatro anos e trabalhei como advogado. Eu sempre me sustentei. Na clandestinidade eu virei empresário, me sustentei e ganhei muito dinheiro. Não é a primeira vez que eu trabalho e tenho uma renda com a qual eu posso me sustentar fazendo atividades. Eu viajava pelo Brasil todo quando eu estava clandestino. Todo mês eu viajava para uma região, para conhecer o Brasil. Eu fiquei cinco anos no Paraná e por cinco anos eu viajei. Por cinco anos eu estudei, trabalhei, fiz patrimônio. Com outro nome e tudo, mas fiz.

Folha/UOL: Agora, o sr. é uma pessoa muito mais jovem. O sr. agora tem essa consciência de que a sua vida política, na verdade, com esse episódio do mensalão, ela está totalmente encerrada?

José Dirceu: Não. A minha vida política não está encerrada. Isso é uma ilusão. Quem acredita nisso não me conhece. Não está encerrada. Eu vou fazer política até o último suspiro. Política não é só política [de] você ser deputado, [de] você participar de um governo. Eu vou fazer política a vida toda. Escrever é fazer política. Vocês fazem muita política, os jornalistas. E como fazem! E os jornais, então, nem se fala. E a televisão, então, noticiário nem se fala! Eu vou fazer política.

Folha/UOL: O sr. mencionou, em uma resposta anterior, a necessidade da presidente Dilma continuar a governar apesar de a campanha já estar aí nas ruas. Falou um pouco sobre melhorar a infraestrutura do país. Há um estranhamento mais ou menos conhecido dentro do governo por parte de alguns ministros. Há [um estranhamento] entre alguns setores da economia a respeito do travamento do governo, da administração da presidente Dilma Rousseff. A presidenta Dilma Rousseff, com esse estilo centralizador, travou o governo mais do que deveria?

José Dirceu: Eu não considero que o governo esteja travado. Mesmo a questão... Por exemplo...

Folha/UOL: Há exemplo, não é ministro?

José Dirceu: Sim. Mas todo governo tem os seus problemas de gestão, tem os seus problemas administrativos.

Folha/UOL: Mas, no caso dela, ela pegou um governo já andando. Ela era ministra. Por que aconteceu isso?

José Dirceu: Vou te dar um exemplo. Ela lançou as concessões no setor aeroportuário e agora fez no setor rodoviário. Já tinha feito entre o governo Lula e o governo dela. E, agora, está fazendo no setor rodoviário também e tem uma nova legislação para o setor portuário. Esse é um grande avanço para o país. E os investimentos nesse setor cresceram muito nesse país. Se não, o porto de Santos não tinha crescido em 374% e a exportação do país, importação, tinha crescido cinco vezes. O país tinha entrado em colapso. O país não pode ter crescido o que cresceu, 4,5% durante o governo do Lula, e não ter infraestrutura. As ferrovias, hoje, transportam... Se você ver o volume que elas transportavam em 2003 e hoje é assustador a diferença. Então, o país tem dado resposta aos problemas de infraestruturas que são simples, porque é uma questão de você criar as condições para o investimento privado, porque é uma concessão, a partir de uma taxa de retorno que está sendo discutida e negociada, e das condições de segurança institucional e de regulação. Difícil é ciências e tecnologia e educação. Esse é o maior desafio que o Brasil tem. E esses é que resolvem todos os problemas que o Brasil está enfrentando hoje. Por exemplo, nós estamos enfrentando o problema da inflação. Qual é o real problema da inflação? O real problema da inflação é que o mercado de trabalho está super pressionado e os serviços estão super pressionados porque os salários têm aumentado acima da inflação. E se você aumenta o juro, valoriza o real, você valoriza o salário, aumenta a demanda. Se você não aumenta o juro e não toma outras medidas, você pode ter mais inflação no Brasil porque nós temos inflação indexada no Brasil. Ou pela Selic ou pelos preços administrativos. O Brasil ainda tem transporte, educação. Então, não é uma questão simples. Diz bem quem diz que o problema da inflação no Brasil depende muito mais de medidas de política econômica e social do que apenas de política monetária. E, no mundo de hoje, que o Japão faz isso que está fazendo, que o Estados Unidos faz $85 bilhões todo mês, no Estados Unidos. Agora $75 bilhões todo mês no Japão, que o Banco Central vai colocar. Desvaloriza a moeda deles, aumenta a exportação. Então, o Brasil está numa situação que só um grande um salto tecnológico e educacional vai nos colocar em condições de competir no mundo. Enquanto isso não acontece, a presidente está tomando. Ó, desonerar energia, desonerar a folha de pagamento, fazer as desonerações todas que fez na economia, reduzir o juro da economia e reduzir o custo. Porque diz o que? Tem que reduzir o custo da economia. Você não pode reduzir o salário a não ser que estejam propondo para o Brasil que nós façamos uma resseção programada. Porque nós já sabemos o começo, mas nós não sabemos, depois, como retomar. Nós aumentamos o juro entre 2010 e 2011. Depois, nós crescemos pouco. Não pense que esse crescimento pouco começou agora. O crescimento pouco de 2011 e 2012 tem origem lá, quando nós aumentamos... Lembra que nós aumentamos o juro no final de 2010, começo de 2011. Se você ver a inflação.... Hoje, eu tomei cuidado de ver a inflação nos dois mandatos do Fernando Henrique, nos dois do Lula e no da Dilma. Essa inflação de 5,7% é a inflação média do segundo mandato do Fernando Henrique. É maior. O Fernando Henrique nos deixou com 12,5% de inflação e a anterior tinha sido 9,6% no governo dele de 2002, 2001. É só olhar nos dados. O Brasil convive com essa inflação por razões estruturais. Não é nem por choque de oferta. Não é problema de commodities, de alimentos.

Folha/UOL: É porque foi um pouco medo do Lula, não é? Que o dólar aumentou e, aí, teve um impacto ali no final da inflação dele.

José Dirceu: Foi tomada uma decisão pelo Banco Central. Era o Henrique Meirelles ainda [o presidente do Banco Central]. De usar o juro. Eu cada dia estou mais convencido, como outros que tem afirmado isso, que a política monetária tem que ser usada mais com muito cuidado. Porque sabe qual é o problema da política monetária? Vamos supor que aumente 0,25% do juro como o mercado financeiro está gritando. Não vai alterar nada na estrutura que leva a ter inflação no Brasil. Mas vai disparar os juros. Vai disparar os juros para o consumidor. Vai disparar os juros para investidor. Olha, se nós queremos oferta na economia, de serviço, mais oferta de produtos então o problema está no câmbio. Está na defasagem tecnológica e educacional do país. Porque a defasagem tributária, de custo financeiro, de infraestrutura o governo da Dilma enfrentou. Ela teve a coragem, inclusive, de enfrentar a questão dos juros. Então, lógico, todo governo tem os seus problemas, centraliza mais ou menos, tem problemas de gestão, mais ou menos, mas isso é o varejo.

Folha/UOL: Mas a presidente exagera um pouco? O sr. acha?

José Dirceu: Não. Eu acho que no atacado ela acertou e acertou 100%. Outros são os problemas que existem. Não pode cada presidente tocar o governo.

Folha/UOL: O Brasil precisa ter 39 ministérios, por exemplo? Falando de gestão.

José Dirceu: Se nós fizermos a reforma política, nós podemos fazer uma reforma administrativa. Eu sempre defendi, é público e notório. Eu era ministro e já defendia. E quando, esses anos todos, depois que eu saí do governo, eu defendi que o Brasil precisa de uma reforma do Estado. Aliás, começou com o governo do Lula, que restaurou os planos de cargos e salários, os concursos.

Folha/UOL: O sr. está dizendo que 39 ministérios existem para atender as demandas políticas, senão... É isso?

José Dirceu: Existe parte. Porque não se faz uma reforma do Estado brasileiro. Porque o que precisa fazer é no Congresso Nacional. Não é o governo que vai fazer. Você tem que ter consenso para mudar a forma de governar o Brasil. Para mudar a forma de governar, precisa mudar o presidencialismo parlamentarista que nós criamos na Constituição de 88. Porque, para você fazer uma coalisão, como nós temos no Brasil... Tem problemas federativos que levam a isso também. Tem problemas antigos do Brasil que o Brasil não tratou antes. Porque, na verdade, um terço dos ministérios são secretarias. Mas ganharam status de ministério porque era importante trazer o problema da mulher, do negro, da pesca, o problema regional do Brasil, o problema nordeste, politizá-lo, trazer à demanda pública. É uma exigência da política. Mas não é esse o problema de o Brasil ter 39 ministérios. Não é esse o problema do país. Até porque o custo desses 39 ministérios não é o principal problema do país. Não tem aumentado tanto o custo de pessoal com relação ao PIB nesses últimos anos. O que aumentou muito e agora está diminuindo, e diminuiu bastante... Aliás, o Aloísio Mercadante falou isso, o ministro, numa entrevista. [O que diminuiu bastante] era o custo da dívida interna do país, que era de quase 8,5% do PIB, está reduzindo para 4,5%. Isso vai ajudar muito o país. Se reduzir mais ainda, vai ajudar muito o país. Porque, pelo contrário, nós temos melhorado a gestão pública, constituído uma burocracia civil. Tanto é que os concursos públicos é só olhar, não é? Que está se criando uma burocracia civil no Brasil. Vai chegar um momento em que nós vamos ter que fazer uma reforma ministerial no país, na composição dos 39 ministérios, como é que você agrupa ministérios, como é que você reduz. Mas a funcionalidade política desses 39 ministérios é possível porque, inclusive, eu fui ministro-chefe da Casa Civil, não eram 39, mas eram 34, 35 e não era esse o problema para gerir a política do governo, a política administrativa de gestão do governo. A governança do país. Acho que a governança do país é muito mais um problema político do que um problema administrativo.

Folha/UOL: O sr. conversa sobre isso com a presidente Dilma? Como é o seu contato com ela? Ela é solidária com o sr. quando sr. encontra com ela?

José Dirceu: Ela é absolutamente solidária comigo, mas eu não converso com a presidenta desde o final de 2011. A não ser quando a encontro em atividades políticas e a cumprimento. Mas não converso com a presidente.

Folha/UOL: Como ela manifesta essa solidariedade?

José Dirceu: Ela sempre foi solidária comigo. Eu posso dar esse testemunho aqui. Como, eu não vou dizer, porque cabe a ela dizer. O que eu posso dizer é que eu não tenho nenhuma, zero, nunca tive [mágoa] com relação ao comportamento do Lula, e do PT e do governo em relação a mim nesses anos. Até porque eu sempre parti do princípio que eu que tinha que fazer essa luta porque eu não posso ficar na expectativa, entendeu? Eu tenho apoio mais do que o suficiente para fazer essa luta. Eu não tenho um empresário, um político que deu as costas para mim. Não só porque eu fui acusado, que eu fui processado, mesmo depois de condenado. Pelo contrário. Depois que eu fui condenado, muitos que eu jamais imaginei me procuraram para se colocar a disposição, para serem solidários porque consideram minha condenação completamente injusta. Eu não tenho e também não sou de ter mágoa, ressentimento. Mesmo daqueles que me decepcionaram. Mesmo daqueles que faltaram comigo, que são pouquíssimos. Eu nunca tive. Muitos, inclusive, voltaram a ter relação comigo. Passaram a me apoiar depois. Eu pude fazer esse caminho de volta porque não manifestei ressentimento ou condenação a eles. Eu entendi o comportamento de muitos que nos condenaram naquele momento porque, realmente, nós erramos e pagamos muito caro por esse erro que o PT cometeu. E pagamos caríssimo. A nossa imagem, etc. Estamos pagando do ponto de vista do processo que houve porque acabou virando um processo por corrupção e formação de quadrilha, peculato, lavagem de dinheiro. Então, não é que nós não tenhamos errado, entendeu? Mas as pessoas são solidárias porque compreendem. No meu caso particular, eu sinto uma solidariedade muito ampla porque a injustiça que está sendo cometida comigo é quase que inacreditável. Eu, às vezes, acho que estou vivendo um pesadelo, que não é verdade o que eu estou vivendo. Porque se eu tivesse feito, eu teria dito. Porque todo mundo me conhece. Eu nunca deixei de assumir as minhas responsabilidades. Nunca. Toda a minha vida. Nunca, nunca, nunca.

Folha/UOL: Ex-deputado federal, ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, Mônica Bergamo, jornalista da Folha de S.Paulo, muito obrigado a ambos por essa entrevista à Folha e ao UOL.

José Dirceu: Eu que agradeço. Agradeço à Mônica e agradeço a você, à Folha e ao UOL por essa oportunidade.

Folha/UOL: Muito obrigado.


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