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Livro mapeia golpes, crises e trapaças na política nacional

Fred Magno/O Tempo/Folhapress
Para autor, o impeachment de Dilma Rousseff, como o de Collor, seguiu o rito previsto na Constituição
Para autor, o impeachment de Dilma Rousseff, como o de Collor, seguiu o rito previsto na Constituição

Períodos de turbulência política são mais a regra do que a exceção na história brasileira. Raros foram os momentos que conjugaram pleno exercício democrático, garantias de liberdade individual e respeito às instituições.

O historiador Rodrigo Trespach percorre alguns dos principais conflitos políticos dos últimos dois séculos e se propõe a narrá-los, de forma didática e sucinta, no livro "Histórias Não (ou Mal Contadas): Revoltas, Golpes e Revoluções no Brasil".

"A ideia era instigar o leitor a querer saber mais sobre pontos fundamentais de nossa história, com abordagens nem sempre contempladas nas salas de aula", diz.

As trapaças políticas estão na base de nossa formação como nação independente, destaca o livro.

Dom Pedro 1º dissolveu a Assembleia Constituinte encarregada de elaborar a primeira legislação brasileira, prendeu e exilou deputados e impôs em 1824 uma Constituição que lhe conferia plenos poderes por meio do Poder Moderador. Foi o primeiro golpe brasileiro, diz o autor.

Em 1840, uma outra burla nas regras, conhecida como o Golpe da Maioridade, declarou dom Pedro 2º maior de idade aos 14 anos e permitiu que fosse coroado imperador.

Quase meio século depois, em 1889, o imperador e a Monarquia cairiam por ação de um novo golpe, desta vez orquestrado por militares.

Sem participação popular, a Proclamação da República levou a um retrocesso em certos direitos, como a liberdade de imprensa.

Sobretudo a partir da década de 1920, com o movimento tenentista, fortaleceu-se a ideia de intervenção militar como remédio moralizador para a política –discurso, como se vê, persistente na cultura brasileira.

Nas quatro décadas seguintes, o desapreço pelas regras democráticas guiou ações de grupos militares e civis, à esquerda ou à direita, contra as leis.

Getúlio Vargas, destaca o autor, personifica melhor que qualquer outra figura histórica os impasses e as contradições da política brasileira no século 20.

Apoiado por forças militares, chegou ao poder em 1930, ao derrubar um presidente eleito. Depois, em 1937, deu um golpe no próprio governo constitucional que havia estabelecido. Caiu em 1945, por pressão militar. Eleito para a Presidência pelo voto popular em 1950, só não foi derrubado novamente pelos militares porque cometeu suicídio em 1954.

O risco de golpe esteve sempre à espeita nos dez anos seguintes, vindo a se concretizar em 1964, com a ditadura militar de duas décadas.

Se a narrativa ágil e compacta torna o livro atraente ao público leigo, contribuiu também, pelo acúmulo de episódios, para aumentar o desalento do leitor com nossa história.

À luz do impasse político dos últimos anos, fica a pergunta: seria a sina tupiniquim nunca experimentar longos períodos de estabilidade institucional?

Otimista, Trespach destaca avanços democráticos desde a Constituição de 1988, a despeito da marca nada abonadora de dois impeachment em menos de 25 anos.

Nos dois casos, os de Fernando Collor (1992) e Dilma Rousseff (2016), o autor avalia que o afastamento seguiu o rito previsto pela Constituição Federal.

"O exercício da democracia sempre foi precário no Brasil. Mas, apesar de tudo, estamos muito bem hoje, tendo em vista nosso passado. Com o amadurecimento de nossa democracia, só temos a melhorar. Por isso é necessária a aposta nas instituições, nas leis e no debate público", concluiu Trespach.

HISTÓRIAS NÃO (OU MAL) CONTADAS: REVOLTAS, GOLPES E REVOLUÇÕES NO BRASIL
autor RODRIGO TRESPACH
editora Harper Collins
quanto R$ 22,90 (256 págs.)


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