Folha de S. Paulo


Movimentos têm de se unir para não serem engolidos, diz líder do Brasil 21

Zanone Fraissat/Folhapress
SAO PAULO/SP-BRASIL, 13/12/2017 - Retrato de Pedro de Cristo, do movimento Brasil 21.Foto: Zanone Fraissat - Folhapress / PODER)***EXCLUSIVO***
Pedro Henrique de Cristo, presidente do Instituto Brasil 21, que incentiva a renovação política

"Se os movimentos que estão surgindo por iniciativa da sociedade não se unirem, essa renovação política que todos pregam não vai dar em nada —vão ser três, cinco, dez gatos pingados lá no Congresso engolidos pela máquina", diz o arquiteto Pedro Henrique de Cristo, 34, presidente do Instituto Brasil 21, uma das chamadas "start-ups políticas" que vêm se articulando nos bastidores da crise brasileira.

A história de Pedro Henrique começa na Paraíba, onde nasceu, passa por estudos na Inglaterra e na universidade Harvard, nos EUA, desembarca na favela do Vidigal, no Rio, e chega à cidade de São Paulo, onde passou a morar desde o final do ano passado, após se ver ameaçado pelo poder paralelo carioca.

Em Harvard, onde matriculou-se com bolsa integral das fundações Lemann e Estudar, dedicou-se a pesquisas interdisciplinares que procuravam unir o desenho de políticas públicas ao de espaços públicos e ao uso de tecnologia para criar redes comunitárias.

Obteve apoio da universidade para estudos de campo no Rio e em favelas da América Latina e chegou a trabalhar na ONU-Habitat, programa para assentamentos humanos das Nações Unidas, que atuava em parceria com a Prefeitura do Rio de Janeiro para estruturar as UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) sociais, antes da Olimpíada de 2016.

Ficou pouco tempo. "Vi que as pessoas das comunidades não confiavam nos policiais, apesar de gostarem da ideia das UPPs, e não iam confiar nos agentes da UPP social; e percebi também que havia um jogo de cena político", diz ele, que defendia a ideia de usar as escolas públicas como base dessas ações.

Depois de desistir das UPPs, decidiu morar na favela do Vidigal, na zona sul, para testar na prática seus aprendizados.

Aos poucos ganhou a confiança de lideranças locais e engajou-se num projeto que reunia o que desejava. Era o parque Sitiê, uma área usada como depósito de lixo que começou a ser transformada em 2006, por iniciativa do músico Mauro Quintanilha e de Paulo Cesar de Almeida, ligados ao Vidigal.

A partir dessa articulação comunitária em torno da criação de um espaço público, Pedro lançou o projeto Ágora Digital. A ideia era estimular a "democracia participativa" em decisões sobre o território da favela.

Baseava-se numa praça física, dentro do parque, com coleta de lixo e tratamento de água, que oferecia acesso grátis à internet e se estendia, por meio de um aplicativo de celular e de uma plataforma, ao espaço virtual.

O projeto atraiu investidores, o parque foi encampado como política pública pela Fundação Parques e Jardins da Prefeitura do Rio e a administração passou a ser feita por intermédio de uma Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). O trabalho coletivo no Vidigal foi um dos destaques do Brasil na Bienal de Arquitetura de Veneza, em 2016.

Mas o êxito cobrou um preço. Representantes das milícias e do tráfico começaram a fazer exigências e ameaças. Pressionado por não aceitar as demandas, decidiu transferir-se para São Paulo, onde tem replicado no centro e em bairros da periferia a experiência da Ágora Digital —premiada no mês passado na Vigésima Bienal de Arquitetura do Chile.

CRIAÇÃO

O Brasil 21 surgiu em 2011 na fase carioca, com o incentivo, entre outros, do empresário Guilherme Leal —acionista da Natura e candidato a vice de Marina Silva, em 2010, pelo Partido Verde. Contou também com o suporte de Lucia Cabral, liderança do Complexo do Alemão, e de Marcia Castro, professora de saúde pública em Harvard.

Nos últimos anos o movimento atraiu mais acadêmicos, instituições públicas e lideranças de base aliando-se recentemente em São Paulo ao MSTC (Movimento de Sem-Teto do Centro), liderado por Carmen Silva, famosa pela ocupação do hotel Cambridge —que virou filme— no centro e em bairros periféricos da cidade.

Pedro —que tem seu escritório de arquitetura e desenho de políticas públicas, o +D, e dá aulas na Universidade Urbam-Eafit de Medellin— aposta na aproximação entre "grupos de renovação" e alianças com movimentos de base como forma de aumentar o alcance dessas organizações, que por ora têm algum brilho à luz do interesse pela novidade, mas estão longe de mostrar ao que vieram.

"Brasil 21, Agora, Bancada Ativista, Acredito, Renova Brasil, Muitx e outros são muito bacanas, só que são todos de classe média e classe média alta para cima. Existem muitos movimentos de base como Pastoral das Favelas, Pastoral Carcerária e Movimento Sem-Teto do Centro que fazem um trabalho de impacto há muito tempo. Se a gente quer fazer uma coisa séria, temos que nos unir entre nós e com esses movimentos de base", diz.

Em comum, todos esses movimentos pretendem incentivar nomes novos para as eleições de 2018 —e para isso terão de se valer de legendas já existentes, o que é um complicador. "Gostaríamos de institucionalizar as candidaturas independentes, adotando o modelo do Chile. Mas até lá, o Brasil 21 vai trabalhando principalmente com a Rede, o Novo e o PSOL", diz.

À diferença dos que tendem a dar mais importância às eleições legislativas, o Brasil 21 vê mais oportunidade nos pleitos majoritários estaduais e na disputa pelo Senado. "São menos candidatos e o voto é mais ideológico do que territorial."


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