Folha de S. Paulo


Marcelo Odebrecht mira ex-aliados ao deixar prisão

Rodolfo Burher - 20.jun.2015/Reuters
Marcelo Odebrecht (R), the head of Latin America's largest engineering and construction company Odebrecht SA, and Otavio Marques Azevedo (L), CEO of Brazil's second largest builder Andrade Gutierrez, are escorted by federal police officers as they leave the Institute of Forensic Science in Curitiba, Brazil, June 20, 2015. Brazilian police on Friday arrested Odebrecht and accused his family-run conglomerate of spearheading a $2.1 billion bribery scheme at state-run oil firm Petrobras. Police also apprehended Azevedo as the probe into corruption at Petrobras spread to the highest level of Brazilian business. REUTERS/Rodolfo Burher ORG XMIT: BRA107
Marcelo Odebrecht, preso pela Operação Lava Jato

O empresário Marcelo Odebrecht deixa a prisão nesta terça (19), após ficar dois anos e meio detido em Curitiba, com três ideias fixas, segundo interlocutores dele ouvidos pela Folha: acha que faltam delatores no acordo que o grupo assinou, avalia que seu pai, Emilio Odebrecht, e aliados foram beneficiados nas negociações e está convencido de que foi injustiçado.

Ele deve vir de jato para São Paulo, de onde seguirá para sua casa num condomínio de luxo no Morumbi. Lá, ficará dois anos e meio em prisão domiciliar, usando tornozeleira.

Marcelo não se conforma, ainda de acordo com esses interlocutores, que o ex-presidente do grupo Newton de Souza e que o vice-presidente jurídico, Maurício Ferro, não tenham sido incluídos no rol de 78 delatores da empresa.

Souza e Ferro, que é cunhado de Marcelo, são ligados a Emilio, hoje presidente do conselho de administração do grupo. Marcelo brigou com os três, além de ter se indisposto com sua irmã, a advogada Mônica Bahia Odebrecht (casada com Ferro), e até com a mãe.

Segundo relatos de Marcelo, Souza sabia que a empresa recorria a propina e doações via caixa dois para corromper governos com quem fazia negócios.

Ainda segundo pessoas que estiveram com ele na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, Marcelo acusa Souza de ter se beneficiado com bônus pagos fora do Brasil por meio de caixa dois, o que seria crime fiscal.

Outros delatores que receberam bônus fora do Brasil tiveram que devolver o dinheiro, como estabelecia uma das cláusulas do acordo de delação que assinaram com a Procuradoria Geral da República.

Marcelo tem dito que não é justo que os outros tenham devolvido esses valores e Souza, não.

Souza assumiu a presidência da Odebrecht S/A em dezembro de 2015, quando Marcelo renunciou ao cargo após seis meses de prisão, e deixou o posto em maio deste ano. Foi alçado à vice-presidência do conselho de administração da companhia.

Com a decisão de Emilio de deixar a presidência do conselho em abril de 2018, e não mais em dezembro do ano que vem, como estava previsto, Souza é um dos mais cotados para substituí-lo.

ACUSAÇÕES

Marcelo tem feito acusações pesadas ao cunhado. Segundo ele, Ferro participou de negociações para tentar parar a Operação Lava Jato e atuou em negociatas com ministros do STJ (Superior Tribunal de Justiça) com o objetivo de obter decisões favoráveis para a Odebrecht.

Num depoimento que prestou ao juiz federal Sergio Moro em abril deste ano, Marcelo contou que havia procurado a então presidente, Dilma Rousseff, para tratar de questões da Lava Jato no início de 2015. Dilma teria indicado o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, para ser o interlocutor da empresa.

Na mesma audiência, Marcelo disse que Ferro procurou o advogado Márcio Thomaz Bastos (1935-2014) para que ele ajudasse a Odebrecht a obter informações sigilosas sobre a Lava Jato com o então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Dilma, Mercadante e Cardozo sempre negaram que tenham atuado para ajudar a empresa.

O plano da Odebrecht, segundo Marcelo, era usar o fato de um aparelho que gravava conversas ter sido encontrado na cela do doleiro Alberto Youssef para anular a operação na Justiça.

A estratégia deu errado. O aparelho encontrado na cela de Youssef estava inativo, segundo perícia da PF.

Interlocutores de Marcelo dizem que ele não tem sentimento de vingança, mas que considera o acordo injusto para ele e outros executivos.

Não se sabe bem o que ele fará com as informações sigilosas que detém sobre delatores, mas há um terreno fértil dentro da Odebrecht para qualquer pregação que contenha o binômio injustiça e a ideia de que faltam outros delatores no acordo.

Muito delatores sentem-se pressionados para confirmar crimes que eles julgam não terem cometido. Eles também se sentem abandonados pela companhia.

Segundo três delatores ouvidos pela Folha, há risco de que eventuais revelações de Marcelo funcionem como colocar gasolina na fogueira.

OUTRO LADO

A Odebrecht não quis comentar as questões levantadas pela reportagem da Folha. Em outras ocasiões, a empresa disse que fez uma colaboração robusta e sem omissões e que irá continuar a colaborar com a Justiça.

Editoria de Arte/Folhapress
DOIS ANOS E MEIO DE PRISÃO Herdeiro da Odebrecht é alvo da Lava Jato

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