Folha de S. Paulo


Especialistas criticam papel do Facebook na disseminação de 'fake news'

Luís Macedo/Câmara
Especialistas participam de seminário "Fake News e Democracia" no Senado

Em debate sobre "fake news" nesta terça-feira (12) no Senado, especialistas criticaram o papel de empresas de redes sociais, principalmente o Facebook, na disseminação de notícias falsas.

"Elas ganham dinheiro com isso e não podem se isentar dizendo que são apenas plataformas", afirmou o diretor de Conteúdo do UOL (empresa do Grupo Folha, que edita a Folha), Rodrigo Flores.

Segundo ele, que participou do terceiro painel de discussão do seminário "Fake News e Democracia", as empresas devem ser responsabilizadas, uma vez que têm interferência direta no conteúdo que chega ao usuário, por meio do algoritmo.

O jornalista Manoel Fernandes, da empresa Bites, que presta assessoria em análise de dados digitais para grupos empresariais, também afirmou que as companhias devem ser cobradas pelo conteúdo que é disseminado em suas plataformas. "Acho uma ingenuidade acharem que o Facebook e o Google são bonzinhos", afirmou.

Para o promotor Frederico Ceroy, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Digital, "o grande vitorioso da reforma política foi o Facebook". "Alteramos a legislação para autorizar legalmente o impulsionamento de notícias por meio de plataformas digitais", disse ele, acrescentando que, na prática, a decisão deve funcionar "exclusivamente" para o Facebook.

Segundo a organização do evento, o Facebook chegou a ser convidado para participar, mas não enviou representantes por conflito de agenda.

FACEBOOK

Procurado pela Folha, o Facebook disse, por meio de porta-voz, que tem a "responsabilidade de combater a desinformação"."Sabemos que, em muitos casos, os sites que espalham desinformação têm motivações econômicas, então temos atualizado nossos sistemas para reduzir esses incentivos. Uma de nossas ações foi revisar centenas de milhares de sites vinculados a páginas no Facebook em todo o mundo, inclusive no Brasil, para identificar aqueles que tinham pouco conteúdo e um grande número de anúncios mal-intencionados", afirmou.

"Temos feito uma série de atualizações em nossos sistemas para limitar a propagação de desinformação, por exemplo a partir da identificação de manchetes caça-cliques. Além disso, e igualmente importante, temos lançado produtos para ajudar as pessoas a tomarem decisões mais conscientes sobre o conteúdo que consomem na internet e fora dela", declarou.

A ideia do seminário "Fake News e Democracia", promovido pelo Conselho de Comunicação Social do Congresso Nacional, é reunir ideias de diversos atores políticos para proteger a população de informações mentirosas que podem influenciar no resultado das disputas do ano que vem.

"Vimos nas eleições dos EUA que as fake news alcançaram um nível grave, chegando a influenciar o resultado das urnas. As mídias sociais contribuíram para a produção de informações falsas naquele país", disse o segundo vice-presidente do Senado, João Alberto (PMDB-MA).

Para o senador, as "fake news" "passaram a ser uma das maiores ameaças à democracia, impulsionadas pelas mídias sociais".

INCLUSÃO DIGITAL

"Sem dúvida, a inclusão digital é algo positivo e não vejo possibilidade de retrocesso. Mas existe um lado da inclusão que precisa ser aprimorado. A fabricação de notícias é um crime que tem que ser combatido com responsabilidade e muita firmeza", afirmou João Alberto.

Os palestrantes exibiram exemplos de "fake news", como a "notícia" veiculada durante as eleições americanas de 2016 de que o papa Francisco teria manifestado apoio ao então candidato republicano Donald Trump.

O deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) afirmou já ter apresentado dois projetos para combater a propagação de mentiras na internet.

Sobre 2018, o pesquisador da FGV (Fundação Getúlio Vargas) Marco Aurélio Ruediger afirmou que é necessário criar mecanismos públicos para identificar robôs e verificar a veracidade de sites e aplicativos. "Para o candidato, gera uma tranquilidade, é uma forma de demonstrar que sua campanha é transparente, é aprovada e não é distorcida", afirmou.

Os palestrantes também expressaram preocupação com a "banalização" do termo "fake news". Para Guilherme Alpendre, da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), o termo não deve ser usado para definir conteúdos publicados por veículos de comunicação conhecidos.

"Não é o caso aqui de tratar de noticias de jornal, o grande problema das 'fake news' é o anonimato, não apenas que são falsas ou não", disse. Segundo ele, a associação de todo o noticiário com as "fake news" pode acabar se tornando pretexto para censura judicial durante as eleições.

"É perigoso a gente deixar que a Justiça Eleitoral muito rapidamente decida o que vai ser retirado do ar", disse.

MANUAL

O ministro do Tribunal Superior Eleitoral Tarcísio Vieira de Carvalho Neto disse que o TSE está estudando a legislação e práticas internacionais sobre "fake news" para desenvolver uma espécie de manual de comportamento para os atores eleitorais em 2018.

A primeira reunião do Conselho Consultivo sobre Internet e Eleiçoes, que envolve TSE, Abin e Exército aconteceu nesta segunda-feira (11).

O grupo tem como atribuição desenvolver pesquisas e estudos sobre as regras eleitorais e a influência da internet nas eleições, em especial o risco das "fake news" e o uso de robôs na disseminação das informações. O conselho também deve opinar sobre as matérias que lhe sejam submetidas pela presidência do TSE e propor ações e metas voltadas ao aperfeiçoamento das normas.

"Fake news promovem debates e consensos artificiais e, por isso, é um desserviço à democracia", afirmou Carvalho Neto.

"O Estado deve atuar para proteger o eleitor. Não tutelando excessivamente sua inteligência ou sua capacidade de discernimento, mas prestando esclarecimentos que se fazem necessários para formação de juízo de valor", afirmou o ministro.


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