Folha de S. Paulo


Tiete de Dilma, aposentada de SP caça assinaturas para anular impeachment

"Você já assinou?"

"E você, consegue colher assinaturas no seu bairro?"

Pé na rua e um sonho na cabeça. São assim os dias da enfermeira aposentada Edva Aguilar, 60, que monta barraca na rua e, de megafone na mão, se mete em manifestações para conseguir adesões a um abaixo-assinado que pede ao STF (Supremo Tribunal Federal) a anulação do impeachment de Dilma Rousseff.

Assim como a paulista, outras pessoas, em grupos como o Movimento Nacional pela Anulação do Impeachment (14 mil seguidores no Facebook), pedem canetadas pró-Dilma. Contabilizam 25 mil assinaturas, longe das 1,5 milhão necessárias na Câmara para um projeto de iniciativa popular (mecanismo inexistente no caso do Supremo).

"Mas não temos essa meta", diz Edva, com pranchetas a tiracolo, em um ato em São Paulo contra a gestão João Doria (PSDB). "É mais um gesto simbólico, para pressionar os ministros. Mas o número ainda vai crescer. Tem muita gente coletando e mandando."

O professor Antonio Fernandes, 57, chega perto e lhe entrega um envelope com 350 nomes. "A gente sente que não é uma luta solitária", festeja ela, que dá até pulinhos. "Não perco o pique. A volta da Dilma é a única forma de reinstalar a democracia."

Alguém na multidão questiona: "Mas o erro não foi ter feito aliança com [Michel] Temer? Ele foi lá e deu o golpe".

Edva, que é filiada ao PT, reage rápido, arregalando os olhos verdes: "Mas e a governabilidade?". Com sorriso e jeito firme de falar, desfia argumentos para conquistar mais apoios. "Acho que não vai resolver", responde a aposentada Aparecida Valeis, 61. "Mas assino... Porque fazer o quê?", diz, dando de ombros.

"Eu poderia estar viajando o mundo", relata a ativista, que trabalhou 22 anos no hospital Sírio-Libanês e assume ter "cara de coxinha". "Mas estou na rua porque acho que a Dilma foi injustiçada."

Edva estava entre as mulheres contra o impeachment que se acorrentaram ao Palácio do Planalto em 2016.

Ela só não ousou pedir assinaturas aos vizinhos de seu prédio, na Vila Nova Conceição, área nobre da capital. "Mas de funcionários consegui." Um adesivo no seu carro ("Nem Temer nem eleição #voltadilma") já é motivo de olhares tortos dos moradores.

No ano passado, aproveitou uma viagem a Nova York, onde vive um dos dois filhos, para participar de ato "contra o golpe que deram na Dilma" —e, claro, angariar apoios.

PROTAGONISMO

Persistente, Edva já conseguiu a assinatura do ex-presidente Lula, da presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), de João Pedro Stédile (líder do MST) e de Guilherme Boulos (do Movimento dos Trabalhadores sem Teto). Foi recebida em julho pela própria Dilma, que agradeceu pela iniciativa. Mas "óbvio que não assinou", diz a militante. "Ela é muito democrata, né?"

O próprio PT evitou até agora se engajar com empenho na mobilização, por ver poucas chances de que o gesto pese numa eventual anulação. Advogados da petista movem ação no STF com esse fim.

Dias atrás, representantes dos grupos se reuniram em Brasília com parlamentares da sigla. "É uma das vias [para Dilma voltar]. O Supremo foi omisso", diz o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP).

Militantes do partido, segundo Edva, já a repreenderam em manifestações. "Eu gritava 'volta, Dilma' e diziam: a pauta é outra. É 'fora, Temer', é 'diretas já'. Tem muito anti-dilmismo dentro do PT."

Apesar de ter feito da coleta uma missão, ela diz não querer atrair protagonismo. Com mania de liderar, despertou ciumeira no movimento e hoje se declara independente.


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