Folha de S. Paulo


Bolsonaro condiciona filiação ao PEN a retirada de ação do partido no STF

Ricardo Borges/Folhapress
Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 10/08/2017; O deputado Federal, Jair Bolsonaro convoca coletiva de imprensa para pronunciamente na tarde desta Quinta-Feira no Rio. ( Foto: Ricardo Borges/Folhapress)
Deputado Federal Jair Bolsonaro dá entrevista no Rio durante evento do PEN

O deputado federal e pré-candidato à Presidência do país Jair Bolsonaro (PSC-RJ) causou saia justa em evento promovido pelo PEN (Partido Ecológico Nacional), ocorrido nesta quinta-feira (10), no Rio. O objetivo do encontro seria selar a intenção de que o político se filie ao partido com vistas à disputa de 2018.

O evento foi transmitido ao vivo nas redes sociais e chegou a ter pico de audiência de cerca de 20 mil espectadores simultâneos.

Bolsonaro iniciou o discurso dizendo que aquele evento marcaria o início de um relacionamento com o partido, mas não significaria um acerto definitivo ainda. A intenção é que o PEN passe a se chamar Patriotas.

"Hoje não será um casamento e nem vamos marcar a data para esse casamento. O que está em jogo é o futuro do país. Perco a eleição, mas não perco o caráter, não perco as calças. Não estou no meio de santos, mas não farei conchavo com o diabo", disse Bolsonaro.

O pré-candidato surpreendeu plateia e assessores ao condicionar sua entrada no partido à retirada de ação movida pelo PEN no STF (Supremo Tribunal Federal) contra o entendimento da corte de permitir prisões de pessoas condenadas em segunda instância.

O PEN entrou em setembro do ano passado no STF contra a decisão, em uma ação declaratória de inconstitucionalidade. O partido foi assistido pelo advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, conhecido por representar políticos em ações criminais.

Bolsonaro disse que o projeto de derrubar o entendimento do STF tinha como objetivo liberar presos em primeira instância na Lava Jato, em decisões proferidas na justiças dos Estados. O deputado disse que a ação na prática significaria o fim da operação. Criticou ainda a iniciativa que teria sido "patrocinada" por Kakay, que Bolsonaro disse ter sido advogado de José Dirceu.

O pré-candidato disse que só tomou conhecimento da ação há dez dias, quando a negociação de sua filiação já estava avançada. "É um noivado. Pode aparecer um problema, que será contornado ou não. Estamos buscando maneira de contorná-lo", afirmou.

LAVA JATO

"Com o fim da Lava Jato, essa verdade terá um pai. E esse pai se chamará PEN", disse Bolsonaro. "Ou o partido descobre uma maneira de desistir da ação... A gente não pode entrar numa possível campanha presidencial sendo atacado como o partido que enterrou a Lava Jato", disse.

Neste momento, a transmissão ao vivo tinha atingido o auge de espectadores, com 21,5 mil pessoas simultaneamente. "Aguardo a decisão do partido sobre a desistência dessa questão", finalizou Bolsonaro.

No fim do discurso, Bolsonaro pediu desculpas se "desapontei alguém". O presidente do PEN, Adilson Barroso, prontamente se justificou.

Ele disse que decidiu pela ação por ter lido relatório que mostrava que mais de mil pessoas poderiam ir para a cadeia com a medida aprovada pelo STF. E que pensava nos mais pobres que, sem recursos para bancar advogados de renome, teriam seu direito a ampla defesa cassados.

"A possibilidade de um cidadão comum, que não tem dinheiro, ser preso antes de chegar à última defesa é injusta. A Constituição é muito clara: todo cidadão tem direito à defesa. Eu entrei [com a ação] para soltar aqueles que são menos favorecidos, porque sabemos que em cinco anos na cadeia acabou a sua vida. Meu entendimento foi dessa forma", disse.

Bolsonaro rebateu o argumento: "Kakay não é advogado de pobre". Barroso, por fim, recuou e disse que o partido abriria mão da ação pelo interesse da aliança com o presidenciável. Com relação à viabilidade jurídica, Barroso disse que "nenhum dos dois é advogado", e que "vão tentar resolver".

"PRO BONO"

Kakay procurou a reportagem para rebater as críticas. Disse que não é advogado de rico e que atua muitas vezes sem receber. A ação no STF com o PEN teria sido feita, disse ele, "pro bono", sem, portanto, cobrança de honorários.

O advogado disse que o ex-ministro José Dirceu é seu amigo pessoal e que nunca o representou juridicamente, nem mesmo no processo do mensalão. Afirmou ainda que a maioria de seus clientes na Lava Jato tem foro privilegiado e não sofreria impacto da decisão do STF.

Terminou por acusar Bolsonaro de tê-lo procurado quando o deputado virou réu no STF por conta de ofensas à deputada Maria do Rosário (PT-RS). "Ele diz que sou advogado de rico porque me procurou para defendê-lo no STF. Não aceitei porque a causa era ruim".

Barroso chamou Bolsonaro de "presidente" a uma plateia formada por dirigentes da sigla que acompanhavam o pronunciamento ao vivo. A menção descumpre a lei eleitoral, que veda campanha antecipada. A lei diz que os candidatos só podem apresentar propostas e pedir votos a partir do dia 15 de agosto do ano eleitoral.

"Os presidentes [estaduais do PEN] não vieram do país todo para discordar de você, presidente. Vou chamá-lo de presidente porque estamos aqui para ajudar fazê-lo presidente. Lutei pela Justiça e estou pronto para retirar a ação se os advogados do presidente acharem necessário".

"O namoro continua", encerrou Bolsonaro.

TEMER

Bolsonaro aproveitou o discurso para fazer críticas ao presidente Michel Temer. Em trecho que criticava o sistema de urnas eletrônicas adotado no país, defendeu o voto impresso e disse que o modelo atual poderia ser fraudado. Acrescentou ao comentário o fato de o presidente ter liberado verba de emendas parlamentares em troca de votos para barrar a denúncia de corrupção passiva na Câmara dos Deputados.

"O Temer mostrou que democracia para ele é voto comprado. Será que em 2018 vamos fazer papel de palhaços comparecendo para votar em um presidente que estará eleito no segundo turno?".

Antes ele havia dito que o Brasil precisa ter um presidente patriota, que "tenha Deus no coração" e honesto. "Ouviu, senhor Michel Temer?", disse.

Bolsonaro criticou a forma como os grandes partidos fazem política e criticou que o PSDB continua no governo. "Esse tipo de política nós temos que combater".

A metralhadora também disparou contra o ministro da Defesa, Raul Jungmann. Bolsonaro disse que se eleito seu governo teria como ministro um general de quatro estrelas das Forças Armadas.

Ele disse que Jungmann era um "desarmamentista". "É a mesma coisa que colocar no centro cirúrgico alguém que fica apavorado ao ver sangue".

ADVERSÁRIO

Sobre a possível candidatura do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), à Presidência, disse que "ele chegou agora na política, é um direito dele [querer ser candidato]. Ou melhor, está sobrando apenas ele como candidato do sistema. Não tem um nome do PT, do PMDB, do PSDB, só o João Doria. Ele é de um partido grande, que tem uns 60 deputados, centenas de prefeituras, dirige um orçamento enorme. Eu só tenho o povo ao meu lado."

Bolsonaro também criticou o "distritão" –na noite de quarta-feira (9), a comissão da Câmara que analisa a reforma política aprovou a adoção do modelo nas eleições de 2018 e 2020, no lugar do modelo eleitoral atual, o "proporcional".

"É um acinte. Os partidos iriam lançar o menor número de candidatos possível para que não houvesse pulverização de votos. Ficaria, então, com toda certeza, na legenda, os atuais mandatários em Brasília e um ou dois em cada legenda. Estaríamos reelegendo, no mínimo, 90% da Câmara e o que é mais grave, com R$ 3,6 bilhões de um fundo democrático eleitoral", afirmou.

A comissão também aprovou, na noite de quarta, o texto-base do relatório que cria mais um fundo público de financiamento das campanhas, de R$ 3,6 bilhões.


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