Folha de S. Paulo


Andrade Gutierrez pagou R$ 30 mi em propinas para 'matar' CPI, diz empresário

Sergio Lima - 28.ago.2012/Folhapress
BRASILIA, DF, BRASIL 28-08-2012, 19h00: CPI - Caso Cachoeira - A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPI) que investiga as relações de Carlinhos Cachoeira com agentes públicos e privados ouve o depoimento do empresário Adir Assad, apontado como agente usado pela Delta e outras empresas para lavar dinheiro. (Foto: Sergio Lima/Folhapress PODER)
O empresário Adir Assad presta depoimento à CPI do Cachoeira, em Brasília

O empresário Adir Assad afirmou nesta quarta-feira (9) que empreiteiras pagaram propina para "matar" a CPI do Cachoeira, em 2012, quando seu nome surgiu pela primeira vez como o responsável por gerar dinheiro vivo para a Delta Construções para repasses a políticos.

Assad prestou dois depoimentos ao juiz Marcelo Bretas em processos sobre a geração de "caixa dois" para a Delta e para a Andrade Gutierrez, neste último caso para pagamento de propina a dirigentes da Eletronuclear.

"Gerei R$ 1,7 bilhão de propina", afirmou ele a Bretas. Ele citou o PSDB e o PT como alguns dos partidos destinatários dos recursos, sem contudo especificar todos os políticos que receberam –citou apenas o ex-governador Sérgio Cabral (PMDB). Afirmou ainda que trabalhou com "todas as grandes empreiteiras", citando Odebrecht, Mendes Junior, Camargo Correa, Queiroz Galvão e Galvão Engenharia.

Assad disse que a Andrade Gutierrez pagou R$ 30 milhões em propina para que ele não fosse questionado de forma contundente na CPI do Cachoeira, em 2012. De acordo com o empresário, a informação foi dada por Flávio Barra, ex-executivo da empreiteira, ao seu irmão Samir Assad.

"Ele deve ter passado o chapéu com outras empreiteiras. Cheguei lá, todos os deputados estavam no celular, para não fazer perguntas. Parece que fui lá fazer uma palestra", disse Assad.

O empresário afirmou que o dinheiro vivo era repassado às empreiteiras em malas, com "camadas" de roupa e plástico para esconder o dinheiro. "Tipo lasanha", comparou.

Foi a primeira vez que o empresário confessou os crimes de que é acusado. Ele é réu em quatro ações penais e nos dois primeiros depoimentos que prestou, ao juiz Sergio Moro, permaneceu calado.

Adir e o irmão, Samir Assad, e Marcello Abbud, outro acusado, trocaram de advogado pouco antes da audiência. O advogado Miguel Pereira Neto deixou a causa e foi substituído por Pedro Andrade, que negocia delação premiada do trio. Eles se comprometeram na audiência a entregar documentos que auxiliem nas investigações.

DELTA

De acordo com o empresário, a CPI provocou uma séria crise na Delta, o que satisfez as demais grandes concorrentes, incomodadas com o crescimento dela.

Ele afirma que a exposição de seu relacionamento com a Delta passou a provocar preocupação nas outras empreiteiras.

"Estavam dando um tiro numa formiga e vão achar um elefante. Quando aparecesse o Assad, todas as grandes iriam para o jogo. Se tivesse a coragem de falar lá atrás...", disse ele ao magistrado.

Assad tinha atuação no ramo de entretenimento, tendo viabilizado shows de artistas internacionais no país, tais como U2, Beyoncé, Shakira, entre outros.

"Não sei quando deixei de ser mocinho para virar criminoso. [...] Queríamos ganhar mais dinheiro", declarou.

'DINHEIRO VIVO'

Ele utilizava uma rede de empresas de fachada subcontratadas pelas empreiteiras, tendo como objetivo único a geração de dinheiro vivo.

"Por causa do relacionamento com os bancos, tínhamos facilidade de pegar dinheiro na boca do caixa", disse Assad.

Ele disse que não sabe listar todos os agentes públicos que receberam propina. Mas disse que era sabido que o dinheiro vivo tinha como propósito corrupção. "O Brasil inteiro sabe."

De acordo o empresário, sua empresa de entretenimento sempre precisou de dinheiro vivo para pagar seguranças, garçom, e outros funcionários contratados para os eventos. Isso, segundo ele, ajudou a não levantar suspeitas nas instituições financeiras.

"O discurso era muito maior nos bancos. Dizia para o gerente que ia deixar tanto dinheiro aplicado, comprar consórcio de carro, tudo quanto era produto do banco. Eu tinha recursos, mas precisava em cash", disse o empresário.

Assad relatou ainda que, em muitos casos, oferecia ingressos e até mesmo encontro com os artistas internacionais para se aproximar de pessoas consideradas importantes para o esquema.

A Andrade Gutierrez afirmou em nota "que segue colaborando com as investigações em curso dentro do acordo de leniência firmado pela empresa com o Ministério Público Federal e reforça seu compromisso público de esclarecer e corrigir todos os fatos irregulares ocorridos no passado".

"Além disso, a empresa afirma ainda que continuará realizando auditorias internas no intuito de esclarecer fatos que possam ser do interesse da Justiça e dos órgãos competentes. A Andrade Gutierrez afirma ainda que acredita ser esse o melhor caminho para a construção de uma relação cada vez mais transparente entre os setores público e privado", disse a nota da empreiteira.


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