Folha de S. Paulo


No interior, Funaro intimidava inimigo até com rasante de helicóptero

Lula Marques - 28.abr.2010/Folhapress
BRASÍLIA, DF, BRASIL 28-04-2010 11h40: ONGs - A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs, no Senado Federal, ouve Lúcio Bolonha Funaro, corretor de câmbio que intermediou operações para dirigentes da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop). Local: Sala 2 da Ala Nilo Coelho. Politica. Foto: Lula Marques / Folha imagem.
Na cidade da mãe, Lúcio Funaro comprou imóvel só para desalojar desafeto que mais tarde o processou

"Funarinho saiu na' Veja'." Esse era o assunto na tarde de sábado, em 2007, no bar do Paulo Martins, tradicional ponto de encontro de Vargem Grande do Sul, cidade paulista com cerca de 40 mil habitantes.

Tratado pelo sobrenome no diminutivo pelos amigos do interior, Lúcio Bolonha Funaro hoje está preso pela Operação Lava Jato e negocia acordo de delação premiada que tem causado insônia em parlamentares e integrantes do governo, incluindo o presidente Michel Temer.

Em 2007, a Lava Jato ainda não estava no horizonte, mas Funaro já protagonizava escândalos. No botequim lotado, os clientes comentavam sobre uma reportagem que dizia que o doleiro havia declarado ao Ministério Público que o ex-ministro José Dirceu ou o PT havia recebido R$ 500 mil de propina pela indicação de diretores para o fundo de pensão dos funcionários das Companhias Docas.

Entre os frequentadores do lugar havia um infiltrado que tratou de alertar Funaro. Não demorou para o doleiro entrar bufando de raiva no bar. Perguntou quem estava ali falando besteiras sobre ele. Chutou uma cadeira e empurrou o advogado José Pedro Cavalheiro, que iniciara a conversa sobre a reportagem.

Ao ver Funaro intimidando os clientes, o dono do bar atravessou o balcão e, de porrete em punho, expulsou Funaro do lugar. "Quem ele pensa que é para arrumar confusão em meu bar?", disse à Folha Paulo Martins. "Toquei ele para fora".

Na segunda-feira, dois dias depois da rixa, veio o troco. Funaro foi até o proprietário do prédio onde estava instalado o bar e comprou o imóvel por R$ 300 mil. Despejou Martins do local e colocou o antigo botequim abaixo. Espalhou na cidade que Martins não honrava suas contas, o que fez com que o dono do bar o processasse por calúnia e difamação.

Funaro é de São Paulo, mas frequentava Vargem Grande do Sul, cidade natal de sua mãe, desde a infância. Na adolescência vendia dólares aos moradores que queriam viajar ao exterior. Saiu para estudar administração de empresas e voltou milionário.

Aparecia na cidade pilotando um Lamborghini preto e se divertia com a trapalhada que provocava nos frentistas, que não sabiam onde ficava o tanque do automóvel para abastecê-lo.

Frequentava a missa aos domingos e ganhou fama de filantropo ao arrematar bezerros em leilões beneficentes e doá-los à igreja. Ergueu no alto da cidade uma mansão com heliporto. No final do ano, patrocinava queima de fogos que era a atração do Réveillon.

A partir do mensalão, onde apareceu como operador das propinas do Partido Liberal, passou a frequentar o noticiário nacional sempre metido em confusão. Pouco tinha como intimidar a imprensa da capital, mas em Vargem Grande do Sul ele passou a ameaçar jornalistas.

O semanal "Gazeta de Vargem Grande" despertou a sua ira ao noticiar a prisão na Operação Satiagraha, que investigava o banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity, por crimes financeiros.

A cada reportagem sobre os desdobramentos da investigação, ele se voltava contra Tadeu Ligabue, dono da publicação. Voava com seu helicóptero dando rasantes rente ao teto do jornal e da casa do jornalista. Dirigia impropérios a Ligabue sempre que o encontrava.

Tadeu Ligabue não quis falar sobre Funaro. "Esse cara é perigoso. Melhor não comentar sobre ele", diz. A Lava Jato parece dar razão à cautela de Ligabue. Pelo menos dois delatores da operação relataram ameaças graves do operador.

O empresário Milton Schahin disse ter ouvido de Funaro: "Você está com câncer, né? Pois vou comer seu fígado com câncer e tudo". O ex-vice-presidente da Caixa Econômica Federal Fábio Cleto disse que o doleiro ameaçou colocar fogo em sua casa, com os filhos dentro.

O advogado José Pedro Cavalheiro, alvo da ira de Funaro no bar de Paulo Martins, nega que tenha "conhecimento sobre a briga", que é comentada pelos moradores da cidade e confirmada pelo dono do estabelecimento e não falou com a reportagem.

Nem mesmo os amigos se atrevem a falar de Funaro. José Ricardo Buosi, o Zé da Kibon, ex-candidato a prefeito da cidade apoiado por Funaro, recusou-se a dar uma palavra.

Apenas Paulo Martins mantém a valentia diante do operador. Seu bar continua na rua do Comércio, mas na esquina oposta ao antigo endereço. "Ele já tentou fazer acordo comigo por causa do processo (que move contra ele por danos morais), mas eu não quero papo com esse cara. A mim ele não mete medo."


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