Folha de S. Paulo


ANÁLISE

Moro não corrobora acusação de Lula ter 'o comando' do petrolão

JM/TFV/CE2017
LISBOA, PORTUGAL, 30.05.2017, O Juiz Sergio Moro nas Conferências do Estoril. Crédito JM TFV CE2017 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O juiz federal Sergio Moro

Na sentença pela qual condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 71, a nove anos e meio de reclusão por corrupção e lavagem de dinheiro, o juiz federal Sérgio Moro não corroborou uma das principais teses levantadas pela força tarefa do MPF (Ministério Público Federal) na Operação Lava Jato: a de que o ex-presidente tinha "o comando" do esquema criminoso montado na Petrobras.

Após escrever que diversos delatores e testemunhas negaram ter discutido o esquema com Lula, Moro escreveu na sentença: "Não é necessário no momento decidir se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi ou não o artífice principal do esquema criminoso que vitimou a Petrobras. É compreensível, por evidente, que o MPF assim tenha afirmado na denúncia, já que é um argumento destinado ao convencimento do juízo".

A ausência de uma definição sobre o verdadeiro papel de Lula no esquema não retira a força da condenação decidida por Moro. Mas para uma narrativa tanto histórica, pelos militantes do PT, quanto jurídica, pela defesa do petista, deve ser levada em conta por expor eventuais arroubos retóricos dos procuradores da República.

Para Moro, na ação penal que julgou bastaria "verificar se existe prova" da participação de Lula "nos crimes de corrupção e lavagem narrados na denúncia, relativos ao três contratos da Petrobras com o Consórcio Conpar e com o Consórcio Conest/RNEST e se foi ele [Lula] beneficiado materialmente com parcela da vantagem indevida".

Moro afirmou que o petista teve um "papel relevante no esquema criminoso", pois "cabia a ele indicar os nomes dos diretores ao Conselho de Administração da Petrobras e a palavra do governo federal era atendida".

O magistrado disse achar "um pouco estranho" que Lula não soubesse do que se passava na Petrobras. Escreveu que "é certo, provavelmente", que o ex-presidente "não tinha conhecimento de detalhes e nem se envolvia diretamente nos acertos e arrecadação de valores, pois tinha subordinados para tanto", porém "tendo sido beneficiado materialmente de parte de propina decorrente de acerto de corrupção em contratos da Petrobras, ainda que através de uma conta geral de propinas, não tem como negar conhecimento do esquema criminoso".

Para Moro, ficou demonstrado que Lula foi beneficiado com o apartamento tríplex no Guarujá "materialmente por débitos da conta geral de propinas" mantida pela construtora OAS a partir de dinheiro desviado da Petrobras.

Assim, determinar o real papel de Lula no esquema criminoso seria desnecessário para a causa. "Como foi provado o crime de corrupção, inclusive que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi direta e materialmente beneficiado, a discussão a respeito da suficiência ou não da prova oral para determinar se ele tinha ou não conhecimento do papel específico dos diretores da Petrobras na arrecadação de propinas passou a ser redundante."

O tom adotado pelo juiz ficou bem abaixo do empregado pelos procuradores da República de Curitiba (PR) que, em entrevista coletiva em setembro do ano passado, usaram um arquivo de PowerPoint para colocar Lula no centro do petrolão. A denúncia entregue a Moro foi assinada por 13 procuradores e a entrevista foi comandada por Deltan Dallagnol.

Eles escreveram na denúncia que "é evidente o controle supremo de Lula nos atos de corrupção que levaram às fraudes nos procedimentos licitatórios para a execução das obras" na Petrobras obtidas pela OAS por meio de fraude. Afirmaram ainda que "o ex-presidente da República comandou e garantiu a existência do esquema que permitiu a conquista de vários contratos por licitações fraudadas".

Os procuradores reforçaram que o petista "comandou a formação de um esquema delituoso de desvio de recursos públicos destinados a enriquecer ilicitamente, bem como, visando à perpetuação criminosa no poder, comprar apoio parlamentar e financiar caras campanhas eleitorais". Para os procuradores, "não se tratava de um projeto político lícito, mas sim, da conquista, ampliação e manutenção do poder, mediante estratagemas criminosos".


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