Folha de S. Paulo


Fachin autoriza que Temer preste depoimento por escrito à PF

Demétrius Abrahão/Fotoarena/Folhapress
Ministro do STF será o relator no caso Temer; investigação de Aécio ficará com outro relator
Ministro do STF será o relator no caso Temer; investigação de Aécio ficará com outro relator

O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF (Supremo Tribunal Federal), autorizou que o presidente Michel Temer preste depoimento por escrito no inquérito decorrente da delação da JBS. Temer deverá responder às perguntas que serão formuladas pela Polícia Federal.

Ao autorizar a PF a tomar o depoimento do presidente, Fachin afirma que Temer pode responder as questões por escrito "em razão da excepcionalidade de investigação "em face do Presidente da República, lembrando-se que o próprio Ministério Público Federal não se opôs ao procedimento".

O presidente terá 24 horas para responder as perguntas formuladas pela autoridade policial, a contar do prazo de entrega das questões. E a PF terá, de acordo com Fachin, dez dias para concluir as investigações.

Na semana passada, a defesa de Temer pediu para que um eventual interrogatório fosse feito por escrito. Para o procurador-geral, o presidente fez uma "confissão" sobre ter participado de uma conversa na qual foram tratados possíveis crimes de corrupção de agentes públicos e pede para tomar o depoimento do presidente.

Fachin também dividiu em dois o inquérito que investiga o presidente Michel Temer e o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG).

O magistrado vai continuar relator da investigação que envolve Temer e o deputado afastado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), filmado pela Polícia Federal recebendo mala com R$ 500 mil entregue por um delator da JBS. A investigação sobre Aécio vai ser sorteada entre todos os ministros do STF.

Na sexta (26), a defesa de Temer fez dois pedidos ao Supremo: para separar a investigação à de Aécio e de Rocha Loures; e para que fosse sorteado um novo relator para o inquérito do presidente. Os advogados pediram ainda para que, se Temer tivesse que prestar depoimento, que fosse por escrito ou ao ministro – e não à Polícia Federal.

Os advogados de Aécio também pediram o fatiamento do inquérito. A defesa de Rocha Loures pediu um novo relator para o caso.

A decisão de Fachin nesta terça (30) abrange todos os pedidos.

De acordo com o ministro, a PGR aponta que Joesley Batista atuou de maneira a obter um novo interlocutor para sua empresa "no seio da Presidência da República, tendo o primeiro, em tese, indicado o segundo para uma suposta continuidade desse relacionamento".

Como Fachin já é relator de um inquérito que apura o esquema do PMDB na Petrobras, ele diz que a investigação sobre Temer e Rocha Loures deve tramitar em paralelo, também com ele: "por ora é possível verificar (...) a existência de concretos pontos de contato entre a investigação relacionada aos supostos fatos atribuídos" a Temer e Rocha Loures com os inquéritos "deflagrados para apurar a suposta atuação ilícita" de integrantes do PMDB do Senado e da Câmara, "a recomendar a tramitação sob a mesma relatoria"

Fachin destaca que, segundo a PGR, Temer substituiu Geddel Vieira Lima por Rocha Loures como seu interlocutor "para tratar de assuntos de interesse do grupo empresarial J&F; como também a suposta influência exercida por Eduardo Cosentino Cunha, ex-deputado federal, sobre assuntos governamentais, mesmo se encontrando recluso e afastado".

O ministro ressalta que "em tese", Rocha Loures agiu em nome de Temer, de acordo com os investigadores. Portanto, não seria possível separar as investigações relativas a eles.

"Até o presente momento, a conjugação das investigações nos mesmos autos e sob minha relatoria decorreu da flagrante conexão dos fatos trazidos à baila a pelos precitados colaboradores e à luz do que narrou o Procurador-Geral da República", informa a decisão.

O ministro ressalta que, de acordo com a PGR, o ponto central da investigação reside "nas relações espúrias" mantidas pela holding J&F, dona da JBS, "com representantes do setor público nas suas variadas esferas, cooptando-os para atuação conforme seus interesses em busca de objetivos empresariais traçados".

Sobre Aécio, Fachin declara que, segundo a PGR, o senador afastado usou o cargo para atuar em benefício da J&F, a holding da JBS, além da ingerência do PSDB em assuntos governamentais.

A investigação relativa ao tucano será sorteada por livre distribuição e deve seguir para outro relator.

PRAZOS

No inquérito de Aécio também serão investigados Andrea Neves, sua irmã, Frederico Pacheco, seu primo, e Mendherson Souza Lima, assessor do senador Zezé Perrela.

Todos foram presos em 18 de maio.

A investigação que atinge Temer e Rocha Loures abrange também Roberta Funaro, irmã de Lúcio Funaro, doleiro e operador do PMDB, que também foi detida.

"Todas essas circunstâncias determinam, portanto, o retorno imediato dos autos à autoridade policial para que, no prazo de lei, conclua suas investigações", escreveu o magistrado.

FORO PRIVILEGIADO

Para a Lava Jato, não é possível separar as condutas de Temer e de Rocha Loures na investigação. Conforme antecipou a Folha, a PGR busca denunciar o presidente Michel Temer ao STF com base na mala de dinheiro entregue pela JBS a Rocha Loures.

Loures é suplente de Osmar Serraglio (PMDB-PR), que deixou o Ministério da Justiça no domingo.

Com o retorno de Serraglio à Câmara dos Deputados, Rocha Loures deve perder foro no Supremo. No entanto, por estar atrelado a Temer na investigação, ele continuará no inquérito que tramita no STF.

Fachin determinou ainda que outro inquérito, que apura as condutas do procurador Ângelo Villela e do advogado Willer Tomaz, também presos na operação Patmos, seja enviado ao TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), uma vez que eles não têm foro no STF - mas, como procurador da República, Villela tem foro privilegiado no TRF.

Na decisão, o ministro destacou ainda que cabe à PGR apresentar provas para corroborar a delação premiada dos irmãos da JBS: "Aliás, é dever do Ministério Público Federal provar, de modo irrefutável, os fatos suscitados e que poderão ser objeto de eventual denúncia, por meio ele instrumentos probatórios regulares, ressaltando-se aqui a natureza da colaboração premiada, inapta, por si só, a gerar condenação".

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Os possíveis crimes de Temer

Outras acusações contra Temer na delação

Menções ao presidente no acordo de colaboração da JBS

Pagamentos a partir de 2010
O empresário Joesley Batista, da JBS, diz que fez pagamentos de R$ 4,7 milhões a pedido de Temer de 2010 a março deste ano. Na conta, diz, há um 'mensalinho' de R$ 100 mil e um repasse de R$ 300 mil, em dinheiro vivo, a um marqueteiro da confiança do presidente, Elsinho Mouco

R$ 1 milhão embolsado
O delator da JBS Ricardo Saud disse que a empresaria pagaria R$ 15 milhões ao PMDB, a pedido do PT, na campanha de 2014. Saud disse que Temer "guardou para ele, no bolso dele", R$ 1 milhão, que o atual presidente teria indicado para entrega em um endereço do coronel aposentado da PM de São Paulo João Baptista Lima Filho

O dinheiro recebido por Rodrigo Rocha Loures
Um dos principais aliados do presidente, o deputado federal pelo PMDB do Paraná foi flagrado recebendo mala com R$ 500 mil de Ricardo Saud, da JBS, em São Paulo. Existe a suspeita de que Temer seria o beneficiário

Senha para repasses a Cunha
Segundo Ricardo Saud, Temer sempre pedia para pagar Eduardo Cunha e o operador Lúcio Funaro mesmo na cadeia. "O código era 'tá dando alpiste pros passarinhos? Os passarinhos tão tranquilos na gaiola?", disse

Pedido a favor de Gabriel Chalita
Joesley diz que pagou caixa dois de R$ 3 milhões a Chalita, candidato do PMDB à Prefeitura de São Paulo em 2012, após Temer pedir os valores

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Perguntas e respostas sobre o áudio de Temer

Ouça

As gravações de Joesley são legais?
O STF tem decidido pela legalidade de gravações feitas pelo próprio participante de uma conversa. A dúvida sobre a legalidade surge quando uma pessoa grava, sem ordem judicial, conversas de terceiros, o que não foi o caso de Joesley.

O STF sabia que as gravações haviam sido feitas por Joesley sem acompanhamento judicial?
Sim. Quando o ministro Edson Fachin ordenou a abertura dos inquéritos, verificou a origem das gravações, relatada pela PGR (Procuradoria Geral da República) logo nos primeiros parágrafos do pedido de abertura da investigação. Caso houvesse ilegalidade, o ministro poderia ter ordenado a retirada dos arquivos dos autos

As gravações passaram por edição?
Setor técnico da Procuradoria não encontrou sinais de fraude ou adulteração. Porém perícia feita a pedido da Folha aponta que o material sofreu mais de 50 edições. A JBS não comentou o assunto. No momento mais polêmico do diálogo, sobre a mesada de Joesley a Cunha, a perícia não encontrou edições.

Havia "ação controlada", monitorada pelo Judiciário, para acompanhar as gravações de Joesley?
Não. A "ação controlada" começou depois da entrega dos áudios

Na conversa com Michel Temer, há interrupções bruscas na gravação, o que levou advogados de defesa alegarem edição ou fraude. O que houve?
Segundo a PGR, houve atritos entre o equipamento e a roupa de Joesley, o que pode ter causado interrupção das gravações, mas não edição ou fraude

Qual o equipamento usado nas gravações?
Os investigadores não sabem, pois Joesley Batista entregou os arquivos em pendrive. Ele colocou o equipamento no bolso do paletó. Isso explica a baixa qualidade em diversos momentos do áudio

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Hipóteses para saída de Temer

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A defesa de Temer

O presidente sustenta que o áudio é clandestino e foi "manipulado e adulterado, com objetivos nitidamente subterrâneos". Ele tenta suspender o inquérito até que a autenticidade seja verificada

Encontro
O presidente diz que trabalha rotineiramente até meia-noite ou mais e que costuma "ouvir à noite" empresários, políticos, trabalhadores e pessoas de diversos setores da sociedade.

Rodrigo Rocha Loures
Temer afirma que apenas indicou o deputado para "ouvir as lamúrias" e se "livrar" da visita de Joesley

"Tem que manter isso"
Temer diz que sugeriu apenas que o empresário permanecesse com uma boa relação. "A conexão é com a frase: eu me dou muito bem com o ex-deputado, mantenho uma boa relação. E eu digo: mantenha isso", falou o presidente, em depoimento. Afirma que não comprou o silêncio de ninguém porque não tem o que esconder

Cade
O peemedebista diz que as reclamações de Joesley, expostas na conversa, mostram que o governo não estava aberto para ele. Afirma que o Cade não decidiu nada a favor do empresário

Prevaricação
Temer diz que não levou a sério a história contada por Joesley e argumenta que o próprio empresário disse posteriormente que inventou o relato de que tinha comprado juízes. "Ele é um conhecido falastrão, exagerado."


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