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Tensão na Esplanada contamina Congresso

Renato Costa/FramePhoto/Folhapress
Deputados discutem na Câmara após governo determinar reforço de tropas federais para proteger a Esplanada dos Ministérios, em Brasília
Deputados discutem na Câmara após governo determinar reforço de tropas federais para proteger a Esplanada

O caos que se instalou na Esplanada dos Ministérios com as manifestações contra o presidente Michel Temer e o uso das Forças Armadas tiveram consequências diretas no Congresso, anulando, nesta quarta (24), qualquer possibilidade de se dar o "clima de normalidade" que o governo havia cobrado de aliados.

Deputados chegaram a se agredir fisicamente. No início da noite, oposicionistas resolveram abandonar o plenário, o que permitiu ao governo aprovar uma medida provisória acerca da regularização fundiária urbana e rural.

Sob gritos de "fora, Temer!" e "Diretas Já!", deputados da oposição ocuparam a Mesa Diretora, quando o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deixou a sessão para falar com Temer.

Diante da mesa, abriram uma faixa onde se lia "#FORATEMER". O deputado Mauro Pereira (PMDB-RS) arrancou a faixa, dando início a um pequeno tumulto. Deputados chegaram a se empurrar.

Maia reassumiu o comando da sessão e tentou conduzir a votação da medida provisória. Foi questionado sobre sua participação na edição do decreto que autoriza a atuação das Forças Armadas nas ruas do Distrito Federal.

O governo atribuiu a medida a uma solicitação de Maia, que negou. "Afirmo e reafirmo que não é verdade", disse o presidente da Câmara, que pediu para o ministro da Defesa, Raul Jungmann, "restabelecer a verdade".

No Senado, também houve bate-boca, e o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), usou a convocação do Exército para criticar o governo.

"Beira a insensatez fazer isso num momento em que o país pega fogo", disse o peemedebista. "Se esse governo não se sustenta, é verdade, não serão as Forças Armadas que vão fazê-lo", afirmou.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), rebateu, afirmando que o governo não está caindo, que não está vago e que ninguém pode falar que o PMDB não apoia mais Michel Temer.

Aliados procuraram minimizar o desgaste ao longo do dia. "A manifestação que tem aí fora é uma manifestação até pequena pelas informações da internet. Não tem impacto nenhum [para a imagem do governo]. A população não gosta de ver depredação. Isso denigre a imagem de quem faz manifestação", disse o deputado Beto Mansur (PRB-SP).

A oposição reagiu. "O governo sai mais fragilizado. Isso aprofunda a crise e revela a fragilidade de Temer em permanecer à frente do governo", disse o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), antes de deixar o plenário junto com os outros oposicionistas.

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Parlamentares também criticaram o uso das Forças Armadas nas ruas.

Uma questão de ordem foi apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) questionando o decreto presidencial. O pedido foi rejeitado pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), que encerrou a sessão do dia. A partir de então, o decreto tomou conta do debate no plenário.

Randolfe comparou a situação atual à ditadura militar. "Não tem cabimento chamar as Forças Armadas. O presidente está querendo romper o nosso frágil tecido constitucional", disse. "O uso das Forças Armadas cabe quando todos os mecanismos polícias de segurança tiverem sido esgotados. Mas não é o caso, não foram esgotados."

A líder do PT no Senado, Gleisi Hoffmann (PR) disse que o decreto "é grave". "O que nós estamos e o que nós pudemos vivenciar aqui agora é uma situação que ofende a democracia", disse.

Ela e o senador Humberto Costa (PT-PE) pediram a convocação do colégio de líderes para debater o assunto.

"O presidente da República extrapolou as suas competências e tomou uma decisão que compromete a democracia brasileira", afirmou.

Humberto Costa escreveu em uma página na internet que Eunício continuava "sentado na cadeira, alheio a tudo, conduzindo uma sessão, como se nada tivesse acontecido". "Um escárnio!"

Eunício disse que havia encerrado as votações, mas que manteve a sessão para dar a palavra aos senadores.


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