Folha de S. Paulo


Joesley acusa Temer de dar aval a compra do silêncio de Cunha

Ueslei Marcelino - 12.mar.2016/Reuters
Brazil's Vice President Michel Temer (L) is seen near President of the Chamber of Deputies Eduardo Cunha during the Brazilian Democratic Movement Party (PMDB) national convention in Brasilia, Brazil, March 12, 2016. REUTERS/Ueslei Marcelino ORG XMIT: BSB01
O vice Michel Temer (esq.) e o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha

O empresário Joesley Batista, dono do grupo J&F e da JBS, disse à Procuradoria ter recebido anuência do presidente Michel Temer a suborno para que o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, um dos operadores da Operação Lava Jato, ficassem em silêncio.

Segundo Joesley, o presidente disse: "Tem que manter isso, viu?".

A conversa foi gravada, segundo informação publicada pelo jornal "O Globo" e confirmada pela Folha.

O Planalto confirma o encontro com Joesley mas nega irregularidades. Diz que Temer "jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio" de Cunha e que não participou nem autorizou qualquer movimento com o objetivo de evitar delação ou colaboração com a Justiça.

Joesley e seu irmão Wesley foram ao gabinete do ministro do Supremo Edson Fachin para selar seus acordos de delação premiada, que envolve outros executivos do grupo.

Segundo a delação de Joesley, ele relatou a Temer que pagava propina a Eduardo Cunha e Lúcio Funaro pelo silêncio de ambos.

Cunha, segundo ele, prestou serviços ao grupo por meio de emendas em projetos de lei e influência sobre o FI-FGTS, que investiu mais de R$ 1 bilhão em empresas da J&F.

A PF filmou pelo menos uma entrega de recursos para intermediários de Funaro.

PERGUNTAS DA PRISÃO

Condenado pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal em Curitiba, em 30 de março a 15 anos e quatro meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão fraudulenta de divisas, Cunha foi criticado pelo juiz por supostamente ter pressionado por uma intervenção de Temer.

No despacho, Moro afirmou que Cunha, já em seu período na cadeia, provavelmente tentou provocar "alguma espécie de intervenção indevida" de Temer em seu favor na Justiça ao encaminhar perguntas a ele na ação penal, em novembro de 2016.

Para o juiz, esse comportamento de Cunha revelava que "nem sequer a prisão preventiva foi suficiente para fazê-lo abandonar o modus operandi, de extorsão, ameaça e chantagem".

O ex-deputado perguntou, em uma série de questionamentos encaminhados ao presidente, qual a relação de Temer com seu amigo José Yunes e se ele havia recebido contribuições de campanha "de forma oficial ou de forma não declarada".

"Para evitar qualquer mal-entendido, não há qualquer registro de que o Exmo. Sr. Presidente da República tenha cedido a essa tentativa de intimidação", escreveu Moro, na ocasião.

REUNIÃO EM XEQUE

Em nota escrita do complexo penal onde está preso, em Curitiba, Cunha voltou a pressionar Temer no mês passado, após entrevista do presidente à TV Bandeirantes.

Na nota, Cunha questionou dois pontos principais: no primeiro, sustenta que o encontro de 2010 — em que delatores da Odebrecht dizem ter negociado propina para o PMDB em reunião de que ele e Temer participaram— foi "agendado diretamente com" o presidente.

No segundo, afirma que a decisão de abrir o processo de impeachment de Dilma Rousseff, em dezembro de 2015, foi discutida com o então vice dois dias antes de oficializada.

Temer confirma a existência da reunião, realizada em seu escritório político em São Paulo, mas nega que nela tenham sido discutidos valores ou acertos escusos. Também negou, em entrevista à Band, no sábado, ter sido ele o responsável por agendar a reunião.

"[Em 2010], o Eduardo Cunha diz: 'Há uma pessoa que quer colaborar, mas quer pegar na sua mão, quer cumprimentá-lo'. E ajustamos um dia em que eu estava em São Paulo. Eu até confesso que cheguei um pouco atrasado à reunião", disse Temer.

Na nota, Cunha diz que "o presidente se equivocou nos detalhes".

"A referida reunião não foi por mim marcada. O fato é que estava em São Paulo, juntamente com Henrique Alves e almoçamos os três juntos no restaurante Senzala, ao lado do escritório político dele, após outra reunião e fomos convidados a participar dessa reunião já agendada diretamente com ele."

Cunha diz, no entanto, que na reunião "não se tratou de valor nem [se fez] referência a qualquer contrato daquela empresa".

"A conversa girou sobre a possibilidade de possível doação e não corresponde a verdade o depoimento do executivo", escreveu o peemedebista.

Os delatores da Odebrecht sustentam ter recebido, nesse encontro, a chancela de Temer para o pagamento de US$ 40 milhões em propina a integrantes do PMDB


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