Folha de S. Paulo


Conta do PT com Odebrecht recebeu R$ 324 mi em 5 anos, dizem delações

Ueslei Marcelino - 26.mai.2011/Reuters
GALERIA DILMA ROUSSEFF: MANDATOS E CRISE - Acusações de multiplicação de patrimônio derrubam o ministro Antonio Palocci da Casa Civil, seis meses após o começo do primeiro mandato de Dilma. Outras denúncias fazem Dilma promover uma
Antonio Palocci conversa com a então presidente Dilma Rousseff, em 2011

Levantamento feito pela Folha com base em relatos de delatores indica que empresas da Odebrecht abasteceram com R$ 323,5 milhões, entre 2009 e 2013, a espécie de conta-corrente entre o grupo e o PT. O crédito veio após interesses da empresa, como aprovação de medidas provisórias e obtenção de financiamento, serem atendidos.

Os repasses foram registrados em uma planilha chamada "Posição Programa Especial Italiano", uma referência ao ex-ministro Antonio Palocci –segundo as investigações, o principal interlocutor de Marcelo Odebrecht junto aos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff até 2011, quando ele deixou a Casa Civil.

A planilha, que perdurou ao menos até 2014, teve início, segundo delatores, quando Palocci pediu dinheiro para a campanha municipal do PT em 2008. O herdeiro da Odebrecht respondeu que descontaria esse valor do total acertado como contribuição da empresa para a eleição presidencial de 2010.

Em 2011, de acordo com Marcelo, a gerência da conta Italiano passa para o então ministro da Fazenda, Guido Mantega. O saldo da época foi reabastecido com R$ 127 milhões para financiar a campanha de Dilma em 2014, e a conta passou a se chamar Pós-Itália.

"A minha ideia foi de definir antecipadamente um valor global ao PT/governo federal para nos programarmos financeiramente e evitarmos pedidos pulverizados de contribuições", afirma Marcelo em sua delação.

Um ano antes, ele criara uma subconta, denominada Amigo, para bancar interesses de Lula. Ele diz que o crédito de R$ 35 milhões veio do que sobrou da contribuição da Odebrecht para a campanha de 2010 e bancou doações ao Instituto Lula e pagamentos em espécie.

CONTRAPARTIDAS

Segundo as delações, os primeiros créditos da planilha surgiram de pedidos de propina vindos de Palocci e Mantega por negócios em que a Odebrecht seria beneficiada: a ampliação do crédito para exportação a Angola e a aprovação de Medida Provisória (Refis da crise) com benefícios para a Braskem.

Marcelo diz que o valor das propinas, R$ 64 milhões e R$ 50 milhões respectivamente, foi decidido de forma arbitrária e não com base no ganho que a Odebrecht teria.

Os demais créditos da planilha, segundo o empreiteiro, também vieram de pleitos atendidos pelo governo, como outra MP, a venda do "Parque da Cidade" e o financiamento para o programa de desenvolvimento de submarinos (Prosub). Ainda assim, ele afirma que não se tratam de contrapartidas, pois não houve pedido de propina.

Marcelo afirma que os créditos serviam como lastro para que o governo atendesse o grupo Odebrecht nas mais variadas demandas –não somente naquelas que originaram a verba.

Ele reconhece, porém, que "apesar de não haver uma contrapartida específica, seguramente o atendimento à agenda de interesses das empresas do grupo era facilitado em virtude de pagamentos realizados ao PT e ao governo federal".

Sua delação traduz 36 anotações referentes à reuniões com Mantega na tentativa de listar quais pedidos foram atendidos. Apenas um aparece sanado, oito foram parcialmente acolhidos, 15 foram negados e não há informações sobre os demais.

O fato de haver contrapartidas difusas não impede, contudo, a condenação por corrupção. No julgamento do mensalão, em 2012, o Supremo Tribunal Federal não exigiu essa comprovação.

A partir das delações da Odebrecht, o STF autorizou inquéritos contra 98 pessoas. Elas podem ser denunciadas à Justiça, que pode acolher ou não a acusação.

As origens do italiano

OUTRO LADO

Antes de começar a negociar um acordo de delação, o ex-ministro Antonio Palocci disse à Justiça que o apelido Italiano não se refere a ele. Palocci negou que tenha pedido doações por meio de caixa dois à Odebrecht ou que tenha favorecido a empresa em troca de propina.

Ele afirmou que só reforçava pedido de contribuição de tesoureiros, mas não tratava de detalhes das doações. "Eu nunca operei contribuições".

Segundo Palocci, a Odebrecht jamais pediu contrapartidas e ele jamais deu "margem a que eles pensassem que era possível uma contrapartida vinculada a recurso de campanha".

Com as negociações para o acordo de delação, revelado pela Folha na última sexta (12), todas essas negativas podem mudar.

O ex-ministro Guido Mantega também já negou que seja o Pós-Itália e afirmou que as acusações de Marcelo Odebrecht são mentirosas. Sua defesa diz que ele não negociou repasses para o PT ou para a campanha presidencial de Dilma Rousseff (PT).

O Instituto Lula disse que o ex-presidente nunca pediu valores indevidos à Odebrecht. "Lula não tem nenhuma relação com qualquer planilha na qual outros possam se referir a ele como 'Amigo'."

A defesa da ex-presidente Dilma afirma ser mentira que ela "tivesse conhecimento de quaisquer situações ilegais que pudessem envolver a Odebrecht".

A petista afirma que nunca recebeu propina ou se envolveu em atos de corrupção.

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Créditos

Total: R$ 323,5 mi

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
LM

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Em 2010, o governo brasileiro aumentou a linha de crédito para exportações a Angola em US$ 1 bilhão. O aumento interessava à Odebrecht, então Antonio Palocci e Paulo Bernardo pediram pagamento de propina para aprovação da medida. Sigla se refere à Luiz Mameri, executivo da Odebrecht responsável por negócios em Angola

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Construtora Norberto Odebrecht (área internacional)

ANO
2009

VALOR
R$ 64 mi

PLANILHA
Italiano

(EXPLICAÇÃO DOS NOMES/PLANINHAS)
Espécie de conta-corrente entre a Odebrecht e o PT, descrita na planilha Italiano. Gastos eram geridos e aprovados por Antonio Palocci

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
BJ

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Para liberação de recursos para obra da Odebrecht, Marcelo teve reuniões com Guido Mantega, Antonio Palocci e Dilma Rousseff. A verba para obras do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub) acabou sendo paga e houve um acerto de R$ 50 milhões como contrapartida. Sigla se refere à Benedicto Júnior, executivo da Odebrecht a cargo da obra

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Construtora Norberto Odebrecht (área de infraestrutura)

ANO
De 2011 a 2014

VALOR
R$ 50 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
BJ (2)

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Não está claro

ANO
Não está claro

VALOR
R$ 20.5 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
BK

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Braskem (sigla BK) e outras empresas tinham dívidas tributárias expressivas, e Marcelo Odebrecht negociou com Guido Mantega a aprovação da MP 470/2009, chamada de Refis da crise, que facilitou a quitação dos débitos. Guido pediu contrapartida para financiar a campanha de Dilma Rousseff em 2010, mas acabou usando o crédito de R$ 50 milhões só a partir de 2011 para pagamentos diversos. Esse valor, apesar de figurar na planilha Italiano, de Palocci, seria gerido exclusivamente por Mantega

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Braskem S.A.

ANO
2009

VALOR
R$ 50 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
HV

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Pagamento devido à demandas na área de energia, especialmente Belo Monte. Sigla de Henrique Valadares, executivo da Odebrecht responsável pela área

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Construtora Norberto Odebrecht (área de energia)

ANO
Não está claro

VALOR
R$ 12 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
OR

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
A Previ, fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil, comprou o

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Odebrecht Realizações Imobiliárias

ANO
2012

VALOR
R$ 27 mi

PLANILHA
Pós-Itália

(EXPLICAÇÃO DOS NOMES/PLANINHAS)
Em junho de 2011, quando Palocci deixa a Casa Civil, o principal interlocutor de Marcelo Odebrecht no governo federal se torna o ministro Guido Mantega. A planilha é rebatizada de Pós-Itália. Ela já continha saldo de R$ 50 milhões vindo da Braskem em 2009 e que Guido ainda não havia utilizado até então. Posteriormente, houve mais R$ 123 milhões de crédito

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
BBK

NEGÓCIO QUE ORIGINOU A PROPINA
Braskem pleiteava desoneração fiscal de matérias-primas para aumentar a competitividade. Após conversas entre Marcelo Odebrecht e Guido Mantega, o pedido foi atendido pela MP 613/2013. O pagamento de R$ 100 milhões dado em contrapartida seria usado pelo PT na campanha presidencial de 2014

EMPRESA QUE PAGOU A PROPINA
Braskem S.A.

ANO
2013

VALOR
R$ 100 mi

PLANILHA
Pós-Itália

*

Débitos

Total: De R$ 204,1 a R$ 229,1

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Evento 2008 (Eleições Municipais) via Feira

EXPLICAÇÃO
Pagamento a João Santana por campanha do PT na eleição municipal de 2008. Valor seria abatido da contribuição total da Odebrecht com a campanha presidencial de 2010

ANO
2008

VALOR
R$ 18 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Evento EL Salvador via Feira

EXPLICAÇÃO
Pagamento a João Santana por campanha de Mauricio Funes em El Salvador

ANO
2009

VALOR
R$ 5.3 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Solicitado em 2009 (via JD)

EXPLICAÇÃO
Pagamento a Palocci por meio de Juscelino Dourado. Inclui doações oficiais

ANO
2009

VALOR
R$ 10 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Solicitado em Abril e Maio 2010 (via JD)

ANO
2010

VALOR
R$ 8 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Eventos Julho / Agosto /Setembro 2010 (16 + 4 Bonus) via JD

EXPLICAÇÃO
Pagamento para campanha do PT em 2010, sendo que R$ 4 milhões foram declarados

ANO
2010

VALOR
R$ 20 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Evento Setembro 2010 Extra (Assuntos BJ, 900 via Bonus PT) via JD

EXPLICAÇÃO
Idem. R$ 900 mil foram declarados

ANO
2010

VALOR
R$ 10 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Menino da Floresta - direto com Menino

EXPLICAÇÃO
Pagamento a campanha de Tião Viana, candidato ao governo do Acre pelo PT, a pedido do irmão, Jorge Viana. R$ 500 mil foi pago de forma oficial

ANO
2010

VALOR
R$ 2 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Prédio (IL)

EXPLICAÇÃO
Pagamento por prédio para sede do Instituto Lula. Imóvel não foi considerado adequado, porém, e gasto foi creditado novamente na conta-corrente

ANO
2010

VALOR
R$ 12.4 mi

PLANILHA
Amigo

(EXPLICAÇÃO DOS NOMES/PLANINHAS)
Em 2010, no final do governo Lula, Marcelo Odebrecht reverteu o saldo da conta Italiano para a subconta Amigo, que, abastecida com R$ 35 milhões, atenderia os interesses do ex-presidente. Quando Palocci fazia um pedido referente a Lula, o valor era abatido da conta Amigo

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Feira (atendido 3,5MM de Fev a Maio de 2011) Saldo Evento

EXPLICAÇÃO
Pagamentos a João Santana ainda referentes à campanha de 2010

ANO
2011

VALOR
R$ 10 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa OH

EXPLICAÇÃO
Delatores não se lembram da explicação

ANO
2011

VALOR
R$ 4.8 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Feira (Pgto fora = US$ 10 MM)

EXPLICAÇÃO
Pagamentos a João Santana ainda referentes à campanha de 2010

ANO
2011

VALOR
R$ 16 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Doações a Carlos Zarattini (PT) e Candido Vaccarezza (ex-PT)

EXPLICAÇÃO
Descrição não aparece na planilha, mas valor foi descontado do crédito de R$ 27 milhões da Odebrecht Realizações Imobiliárias

ANO
2012

VALOR
R$ 5 mi

PLANILHA
Pós-Itália

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Pagamento de dívida da campanha de Fernando Haddad

EXPLICAÇÃO
Não está claro se valor foi anotado na planilha, mas Marcelo Odebrecht relata que tal pagamento foi descontado da conta Italiano

ANO
2012

VALOR
R$ 15 a 40 mi

PLANILHA
Italiano

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B

EXPLICAÇÃO
Pagamento a Palocci por meio de Branislav Kontic. Inclui pagamentos em espécie

ANO
2012

VALOR
R$ 2 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B 2 (jun e jul 2012)

ANO
2012

VALOR
R$ 1 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B 3 (jul 2012 extra)

ANO
2012

VALOR
R$ 1 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B 4 (Nov a Dez 2012)

EXPLICAÇÃO
Pagamento a Palocci por meio de Branislav Kontic. Palocci autorizou o desconto da planilha Amigo, então gasto foi relacionado a Lula. Inclui pagamentos em espécie

ANO
2012

VALOR
R$ 3 mi

PLANILHA
Amigo

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B 5 (Jan a Out 2013)

ANO
2013

VALOR
R$ 5 mi

PLANILHA
Amigo

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Programa B 6 (Dez 2013)

ANO
2013

VALOR
R$ 1 mi

PLANILHA
Amigo

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Doação Partido

EXPLICAÇÃO
Doação ao PT

ANO
2013

VALOR
R$ 4 mi

PLANILHA
Pós-Itália

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Doação Instituto 2014

EXPLICAÇÃO
Doação ao Instituto Lula

ANO
De 2011 a 2014

VALOR
R$ 4 mi

PLANILHA
Amigo

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Revista BRK

EXPLICAÇÃO
Pagamento a Revista Brasileiros

ANO
2014

VALOR
R$ 1.6 mi

PLANILHA
Pós-Itália

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Pagamento a campanha de Gleisi Hoffmann

EXPLICAÇÃO
Descrição não aparece na planilha, mas como Paulo Bernardo, marido de Gleisi, foi interlocutor da Odebrecht no negócio da ampliação de crédito a Angola, Palocci autorizou a doação para campanha da petista ao governo do Paraná

ANO
2014

VALOR
R$ 5 mi

PLANILHA
Italiano

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DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Feira

EXPLICAÇÃO
Pagamento a João Santana pela campanha presidencial de Dilma Rousseff

ANO
2014

VALOR
R$ 16 mi

PLANILHA
Pós-Itália

-

DESCRIÇÃO NA PLANILHA
Pagamento para a campanha de Dilma Rousseff

EXPLICAÇÃO
Descrição não aparece na planilha, atualizada até março de 2014. Valor foi pago em julho e relatado por Hilberto Silva, delator da Odebrecht. Doações oficiais também eram descontadas nesta planilha

ANO
2014

VALOR
R$ 24 mi

Planilha
Pós-Itália


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