Folha de S. Paulo


Grupos pró e contra Lula não se encontraram em Curitiba

Quem circulasse por Curitiba na noite que antecedeu o depoimento de Lula ao juiz Sérgio Moro notaria que a cidade estava preparada para uma quarta-feira (10) quente, temendo brigas entre os apoiadores do ex-presidente e os habitantes locais partidários da Lava Jato.

A presença policial era ostensiva, principalmente na área ao redor do fórum onde aconteceria a audiência. Ela foi cercada a partir das 23h de terça (9), num raio de 150 metros de distância do tribunal, para pedestres. Carros eram barrados ainda mais longe.

Nas rodovias que dão acesso à cidade havia bloqueios da Polícia Rodoviária Federal que vistoriavam os mais de 100 ônibus que trouxeram manifestantes favoráveis a Lula.

O que se viu, no entanto, foi uma quarta de atos pacíficos, em que os grupos antagonistas não se encontraram. Contribuíram para isso, além do esquema de segurança –que designou áreas diferentes da cidade para os atos de cada parte–, as orientações vindas de lideranças de ambas as partes.

Sergio Moro divulgou nas redes sociais um vídeo em que pedia a seus apoiadores que evitassem "confusão e conflito". Do lado pró-Lula, os organizadores da manifestação deram recado semelhante, ainda no acampamento que concentrou milhares de integrantes de movimentos de esquerda, notadamente do MST.

Apoiados por um caminhão de som, no qual estavam organizadores e uma dupla sertaneja, os esquerdistas deixaram o acampamento montado ao lado da estação rodoferroviária por volta das 10h e seguiram rumo à praça Santos Andrade, a cerca de 2 quilômetros de distância, no centro de Curitiba.

Usavam camisetas vermelhas e levavam cartazes com dizeres como "Impedir a prisão de Lula, derrotar o golpe" e bandeiras da CUT e do MST, além de partidos políticos como PSTU e PCO.

No trajeto, foram recebidos pelos curitibanos com um misto de curiosidade e antagonismo. Muitos transeuntes registravam a passagem da marcha com seus celulares, sem se manifestar.

Travando o trânsito por onde passavam, os lulistas foram hostilizados principalmente pelos motoristas, com buzinas e gritos como "tem enxada aí? Vai capinar um gramado". Bate-bocas sem maiores consequências aconteceram ao longo da caminhada.

Nos arredores da praça Santos Andrade, agências bancárias cobriram suas vidraças com tapumes, mas não foram registradas depredações. Os apoiadores de Lula concentraram-se no local durante toda a tarde, ouvindo discursos de líderes de esquerda num palco montado em frente ao campus da Universidade Federal do Paraná.

Segundo a Polícia Militar do Paraná, o grupo pró-Lula reuniu 5.000 pessoas em sua manifestação. Já a Frente Brasil Popular afirmou que eram 50 mil.

PRÓ-MORO

No mesmo período, os apoiadores de Sergio Moro se reuniam em número muito menor em frente ao museu Oscar Niemeyer, a cerca de 3,5 quilômetros de distância dos defensores de Lula.

Mesmo no momento de pico, no início da tarde, havia cerca de uma centena de pessoas, que recebiam o apoio dos carros que passavam em frente. Um boneco "Pixuleko" de nove metros de altura, representando o ex-presidente em trajes de presidiário foi inflado pelos manifestantes, que carregavam bandeiras do Brasil e cartazes com dizeres como "Lula, a República de Curitiba te espera de grades abertas".

A garoa que caiu em parte da tarde –o dia, nublado, teve máxima de 18°C– ajudou a acelerar o fim do protesto.

Os participantes atribuíram a baixa presença ao dia de trabalho e à mudança do local da manifestação, que foi retirada da frente do fórum de Curitiba na véspera, por conta do esquema de segurança desenhado pela PM.
Os dois locais, no entanto, estão a menos de 2 quilômetros de distância. Se caminhassem por poucos minutos, os fãs de Moro encontrariam, nas barreiras que isolavam o tribunal, dezenas de simpatizantes de Lula, que o esperavam para "um abraço", segundo o líder do MST, João Pedro Stédile.

Nem todos nos arredores da Justiça Federal eram admiradores de Lula. Num condomínio a metros do fórum, moradores gritavam "Lula ladrão!" para a manifestação pró- Lula.

Em coro, a resposta: "Lula, ladrão, roubou meu coração!" Seus apoiadores também revidaram com "ah, mas que piada, bate panela, mas quem lava é a empregada!".

A trupe lulista dispersou pouco depois de sua entrada. "Cada um de nós pode anotar na sua cadernetinha: eu estive no 10 de maio de 2017 no Paraná", disse Stédile, cravando como histórica a data.
O incidente mais grave registrado até o início da noite de quarta foi um ataque com rojão ao acampamento do MST, na madrugada anterior.

Segundo os acampados, um grupo de ao menos cinco pessoas disparou fogos que atingiram uma das barracas e queimaram braços e pernas de um militante que dormia. Ele teria sido atendido em um hospital e liberado. (ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER, MARCO AURÉLIO CANÔNICO E PAULO GAMA)


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