Folha de S. Paulo


Moro proíbe que defesa de Lula grave depoimento e critica intenção 'política'

O juiz Sergio Moro proibiu, na manhã desta segunda (8) que a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva grave o depoimento que ele dará ao magistrado na quarta-feira (10), em Curitiba.

Segundo a decisão, somente a própria Justiça Federal irá filmar o que ocorre na audiência, como normalmente é feito desde o início da Operação Lava Jato.

"Há um risco de que o acusado e sua defesa pretendam igualmente gravar a audiência, áudio e vídeo, não com finalidade privadas ou com propósitos compatíveis com os admitidos pelo processo, por exemplo permitir o registro fidedigno do ocorrido para finalidades processuais, mas sim com propósitos político-partidários, absolutamente estranhos à finalidade do processo", disse Moro em sua decisão.

"A gravação pela parte da audiência com propósitos político-partidários não pode ser permitida pois se trata de finalidade proibida para o processo penal", acrescentou.

Segundo ele, Lula e seus advogados convocaram militantes para ato em Curitiba e querem transformar a audiência em evento político, "como se algo além do interrogatório fosse acontecer".

Moro, no entanto, aceitou que seja feita uma gravação adicional do depoimento. Além de vídeos com enquadramento em Lula, haverá registro lateral, "que retratará a sala de audiência com um ângulo mais amplo". "Tal gravação oficial será igualmente disponibilizada no processo às partes", afirmou o juiz.

Foi proibida, ainda, a entrada de pessoas com celulares na sala de audiência. A audiência não deve ser transmitida ao vivo. Nas ações da Lava Jato, vídeos dos depoimentos costumam ser tornados públicos horas depois do fim das sessões. O advogado do ex-presidente, Cristiano Zanin Martins, disse que irá recorrer.

Lula será ouvido no processo em que é réu sob acusação de ter recebido vantagens indevidas da empreiteira OAS, entre elas um tríplex em Guarujá, no litoral de São Paulo. Ele nega ter cometido irregularidades.

Os advogados do ex-presidente afirmavam que a forma como os registros das audiências são feitos atualmente, com foco na pessoa que depõe, cria uma "imagem distorcida" e impede que "sejam avaliadas a postura do juiz, do órgão acusador, dos advogados e de outros agentes envolvidos no ato".

Eles pediram para fazer outra gravação, própria, da audiência ou que houvesse imagens de todo o recinto e de forma direcionada à pessoa que faz uso da palavra.

Foi solicitado a Moro que o fotógrafo do Instituto Lula, Ricardo Stuckert, fizesse as gravações.

Já o Ministério Público e os advogados de Léo Pinheiro, sócio da OAS que também é réu no processo, pediram que o juiz recusasse o pedido de Lula. Segundo a defesa de Pinheiro, gravar o depoente "assegura a precisão do registro" e "visa garantir a maior fidelidade possível da prova".

A defesa de Lula disse, em nota, que a decisão "afronta expressa disposição legal e, por isso, configura mais uma arbitrariedade". Em nota, cita artigo do Código de Processo Civil que prevê a possibilidade –Moro diz que não há norma no Código de Processo Penal sobre o tema.

"De acordo com a lei, se o juiz faz a gravação da audiência em imagem e áudio, o advogado da parte também tem autorização da lei para fazer sua própria gravação", afirma o advogado Cristiano Zanin Martins.

"A forma de captação da imagem do depoente –com uma câmera fixada em seu rosto– foi mantida pelo juiz embora tenhamos demonstrado, com base científica, que essa forma de gravação coloca o réu em posição de inferioridade ao juiz e ao Ministério Público, afrontando também a garantia da presunção de inocência", diz a nota.

A defesa de Lula também pediu na segunda instância a suspensão do processo –e do depoimento– porque diz não ter tempo suficiente para analisar documentos da Petrobras relativos ao caso que deveriam ser juntados à ação penal.

INTENÇÕES

Na decisão desta segunda, Moro ainda disse que "não há qualquer intenção de prejudicar o acusado ou sugerir a sua culpa" ao registrar a audiência com foco no depoente. "Tanto assim que o depoimento das testemunhas, que não sofrem qualquer acusação, é registrado da mesma forma", afirmou.

"Aliás, esse é um procedimento não deste Juízo, mas de toda a Justiça Federal da 4ª Região, de gravar os depoimentos com o foco no depoente."

Lula será ouvido cerca de 20 dias após o depoimento de Léo Pinheiro no caso, que disse a Moro que o tríplex é do ex-presidente. A defesa do petista tem dito que a versão do empresário é negociada "para agradar" procuradores e destravar acordo de delação premiada.

Movimentos de esquerda têm se mobilizado para fazer manifestações na capital paranaense no dia da audiência.

Reprodução
Depoimento de Lula, como testemunha, por videoconferência a Moro em novembro passado
Depoimento de Lula, como testemunha, por videoconferência a Moro em novembro passado

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