Folha de S. Paulo


Serraglio diz que ex-chefe da Funai demorou a autorizar obra

Pedro Ladeira - 8.mar.2017/Folhapress

Em nota divulgada nesta sexta-feira (5) para rebater acusações do ex-presidente da Funai (Fundação nacional do Índio), o ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), confirmou que o governo cobrou de Antonio Costa medidas para liberar a obra de construção de uma linha de energia de alta tensão que vai atravessar uma terra indígena em Roraima.

Ao deixar o cargo, nesta sexta-feira, Costa disse em entrevista coletiva na frente do prédio da Funai que Serraglio contribuiu para a sua exoneração e que o ministro representa "uma causa", em referência ao agronegócio.

Na nota em resposta, Serraglio disse que Costa foi exonerado porque a Funai "necessita de uma atuação mais ágil e eficiente, o que não vinha acontecendo". O ministro escreveu que "muitas questões não vinham sendo tratadas com a urgência e efetividade que os assuntos da área requeriam, o que corrobora a necessidade de uma melhor gestão".

O ministro da Justiça citou como exemplo a construção de um linhão de energia elétrica "que deve passar por reserva indígena" —a nota não explica, mas se refere à terra indígena vaimiri-atroari, entre os Estados do Amazonas e de Roraima, que durante a ditadura militar foi cortada por uma rodovia federal, a BR-174.

A Eletronorte montou um consórcio para construir o linhão de Manaus até Boa Vista com valor estimado de R$ 2 bilhões. A obra foi licitada em 2011, pelo governo de Dilma Rousseff, mas o trecho Manaus-Boa Vista ainda não saiu do papel. Os índios seguidas vezes contestaram o plano e sugeriram que o traçado fosse alterado de forma a preservar a terra indígena. Há também na mesma região um grupo de índios isolados que pode sofrer os impactos da obra.

Estima-se que cerca de 250 torres de alta tensão teriam que ser construídas na torre indígena, ao longo de 125 km de extensão. No ano passado, o Ministério Público Federal pediu à Justiça Federal a revogação da licença prévia já emitida pelo Ibama, sob o argumento de que os índios não ofereceram consentimento à obra, o que contraria a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Houve uma decisão liminar facvorável à Procuradoria, mas que acabou cassada por decisão de um desembargador do TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, que acolheu um recurso da União.

No texto assinado por Serraglio, "a população de Roraima está estrangulada em seu desenvolvimento, importando energia da Venezuela em virtude das dificuldades de implantação de uma linha de transmissão".
O ministro escreveu que "o único acesso ao Estado por rodovia possível é impedido pelos indígenas a partir das 18h".

Serraglio explicou, na nota, o passo da passo dos pedidos de providências levados pelo governo ao então presidente da Funai. Ele disse que o assunto passou pelo presidente Michel Temer.

"Em audiência, a governadora [de Roraima] e todos os representantes do Estado solicitaram ao presidente da República uma solução rápida para essas questões. O ministro determinou ao então presidente da Funai providências imediatas. O que se viu foi não só a ausência de qualquer ação, como evidente ofensa ao princípio hierárquico, uma vez que o ex-presidente da Funai publicamente reclamou da incumbência", diz a nota.

Uma notícia divulgada pelo governo de Roraima em 17 de março confirma que de fato a governadora do Estado, Suely Campos (PP-RR), esteve em audiência com Temer para tratar da obra. O governo argumento que os índios aceitam "uma compensação financeira para passar o linhão em suas terras".

De acordo com o governo, em dezembro de 2015 o Ibama emitiu uma licença prévia para o empreendimento, "mas a Funai não emitiu a documentação necessária para a emissão a Licença de Instalação". O governo alega que "os impactos ambientais e à cultura indígena são mínimos, uma vez que a linha será construída na faixa de servidão de uma rodovia federal".

Procurado pela Folha, o deputado André Moura (PSC-SE) não foi localizado para falar sobre a exoneração de Costa. O ex-presidente da Funai disse que sua exoneração também se deveu a pressões do parlamentar que queria indicar nomes sem experiência no tema indigenista.


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