Folha de S. Paulo


Dinheiro de 'escândalo dos aloprados' veio da Odebrecht, diz delator

Fernando Donasci/Folha Imagem
SÃO PAULO / SÃO PAULO / BRASIL -21 /08/14 - :00h - O LOUCO DO URSINHO. O alemão Joachim Zahn tem um costume no mínimo estranho. Para qualquer lugar que ele for, leva junto uma pequena maleta com um ursinho de pelúcia e um álbum de fotos. Antes de uma viagem para os EUA, Zahn estava com um mau pressentimento. Sua filha então deu o urso de pelúcia para que o pai viajasse em segurança, com a condição de que ele mandasse uma foto do bicho ao chegar no destino. Desde então, Zahn, filho do alemão que trouxe a marca Mercedes-Benz para o Brasil, faz com que personalidades como Lula, Serra, Faustão e muitos outros posem com o brinquedo no colo.. ( Foto: Karime Xavier / Folhapress). COTIDIANO
Luís Inácio Lula da Silva e José Serra

O PT usou dinheiro oriundo de uma transação entre a Odebrecht e a cervejaria Itaipava para tentar comprar um dossiê contra o tucano José Serra, em 2006, no episódio que ficou conhecido como "escândalo dos aloprados", segundo um delator da empreiteira.

A história foi revelada por Luiz Eduardo Soares, ex-executivo do Setor de Operações Estruturadas, classificado pela Lava Jato como um departamento de propinas. Ele disse que foi chamado para uma reunião em um escritório do PT um dia depois de vir a público o caso dos aloprados.

Faltando duas semanas para o primeiro turno da eleição de 2006, dois petistas foram presos em um hotel em São Paulo com R$ 1,1 milhão e US$ 249 mil em dinheiro vivo.

Delação

A intenção seria comprar dossiê contra Serra, que disputaria o governo de São Paulo contra o petista Aloizio Mercadante, segundo as apurações da época. Na ocasião, Lula, presidente, minimizou o caso dizendo que aquilo era coisa de uns "aloprados" no PT.

Segundo o delator, um dos maços de dinheiro apreendido na ocasião com petistas estava embalado num invólucro com o nome de uma distribuidora de bebidas ligada à Itaipava. A pista sobre a origem do dinheiro teria causado pânico na campanha.

"Nós fomos tomados de surpresa na operação dos aloprados. O Júnior [Benedicto Júnior, ex-diretor de Infraestrutura da empreiteira] me ligou logo depois da operação dizendo que tinha dado um grande problema, que precisava de minha ajuda, e marcamos uma reunião no comitê de campanha do Partido dos Trabalhadores em São Paulo", disse. "Foi no primeiro sábado após o escândalo dos aloprados."

O delator relatou que Odebrecht e Itaipava se juntaram para trocar reais em dinheiro vivo no Brasil por dólares em dinheiro vivo no exterior. A Itaipava tinha muito dinheiro vivo no Brasil porque seus distribuidores recebiam em dinheiro as vendas de bebidas para bares e queria trocar isso por moeda estrangeira. A Odebrecht, por sua vez, precisava de dinheiro vivo aqui para pagamentos ilícitos.

Na delação, Soares deu detalhes desta suposta reunião na sede do comitê do PT.

"Nós chegamos lá e eu tive a surpresa de que está lá, além do Benedicto Júnior, o senhor Walter Faria [dono da Itaipava]. Tivemos uma reunião com o José de Filippi [tesoureiro da campanha de Lula]. E como nós tínhamos essa operação [entre Odebrecht e Itaipava] que já tinha começado de troca de reais por dólar, eles estavam com medo, porque descobriram que tinha uma parte desse dinheiro que estava com timbre da Leyroz de Caxias [distribuidora da Itaipava]. Aí isso mostrava que era da cervejaria Itaipava", relatou Soares.

Chamada - Vídeos delação

Segundo ele, o próprio dono da Itaipava cuidou do dinheiro repassado ao PT e esqueceu um envelope com o nome da distribuidora. "Aí o senhor Walter falou -eu até rio, me dá vontade de rir um pouco- que ele mesmo estava tirando e esqueceu de um pacotinho, de tirar os invólucros. Nós não sabíamos disso. O Júnior me chamou, porque como eu estava trabalhando com ele nessa parte de troca de reais por dólar, perguntando se o dinheiro era nosso. Não era nosso. O senhor Walter falou: 'Não, eu dei o dinheiro para o José de Filippi e ele se comprometeu até em assumir'", disse o delator.

"Aí a coisa morreu, arrefeceu, ninguém nunca soube de onde era o dinheiro", disse.

Questionado pela procuradoria se ficou claro na reunião que de Filippi sabia que aquele dinheiro havia sido usado para comprar o "dossiê dos aloprados", o delator respondeu que sim.

OUTRO LADO

Em nota, a cervejaria Itaipava afirmou que "não tem relação com o episódio dos aloprados". Mercadante disse em nota que "já foi investigado e inocentado por CPI parlamentar" e que teve inquérito arquivado no STF porque "não foi encontrado nenhum indício de participação".

O ex-ministro afirmou também que não é mencionado na delação de Luiz Eduardo Soares e não conhece o delator. Diz ainda que não houve nenhuma iniciativa da PGR quanto a ele.

José de Filippi Júnior informou por meio de nota que todas as doações foram registradas. "Desafio o senhor Hilberto Mascarenhas, com quem nunca conversei ou mesmo conheci, a provar o que ele fala. Nunca me comportei como um mascateiro cobrando repasses junto a quem quer que seja", afirmou.

Ele também negou envolvimento no escândalo dos "aloprados" e disse ter a "consciência tranquila".

O diretório do PT em São Paulo disse que não se manifestaria sobre as delações.

Colaborou REYNALDO TUROLLO JR., de São Paulo


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