Folha de S. Paulo


Fachin autoriza inquérito contra Serra por suspeita de doações irregulares

Zanone Fraissat/Folhapress
Ministro das Relações Exteriores, José Serra (PSDB-SP), vota no Colégio Santa Cruz, em Alto de Pinheiros (zona oeste de SP), neste domingo
Então ministro, José Serra deixa local de votação em São Paulo na eleição municipal de 2016

O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal) autorizou a abertura de inquérito para investigar o senador José Serra (PSDB-SP) e o ministro das Relações Exteriores Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), sob suspeita de receberem pagamentos irregulares da Odebrecht em troca da defesa de interesses da empreiteira.

O pedido feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República) se baseia nas delações de Arnaldo Cumplido de Souza Couto, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, Carlos Armando Paschoal, Luiz Eduardo da Rocha Soares, Roberto Cumplido, Fábio Andreani Gandolfo e Pedro Novis.

Serra é suspeito de receber pagamentos irregulares em diferentes campanhas eleitorais. Novis, ex-presidente do grupo, diz ter realizado contribuições com a expectativa de que o político favorecesse a empresa no futuro.

Ele relata o pagamento de R$ 2 milhões para campanha à Prefeitura de São Paulo em 2004 e de R$ 4 milhões para campanha ao governo do Estado em 2006. Durante a gestão dele no governo, a Odebrecht sagrou-se vencedora em diversos processos licitatórios, segundo a PGR.

Em 2008, ano em que Serra era governador, ele teria solicitado diretamente à Odebrecht o pagamento de R$ 3 milhões para campanha à prefeitura da capital. Não é identificado quem foi o beneficiário do valor.

Em 2009, após negociação com o então presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra, a empresa teria repassado R$ 23,3 milhões para custear campanhas majoritárias, inclusive a de Serra à Presidência da República no ano seguinte.

Em troca, teriam sido acertados valores devidos ao grupo por obras no Estado.

SENADO

Os colaboradores também afirmaram que Aloysio Nunes pediu contribuição à sua campanha eleitoral ao Senado em 2010 e recebeu R$ 500 mil por meio de caixa dois, viabilizado pelo setor de operações estruturadas.

Na oportunidade, a Odebrecht estava enfrentando dificuldades em relação à Dersa (estatal responsável por investimentos rodoviários de São Paulo), ocasião em que Nunes, então chefe da Casa Civil do governo de São Paulo, se comprometeu a auxiliar na negociação dessas questões em troca da doação.

DERSA

Os delatores relataram a ocorrência de "ajuste de mercado" entre as empresas Andrade Gutierrez, Galvão Engenharia, Camargo Correa, Serveng Civilsan, OAS, Mendes Junior, Queiroz Galvão, CR Almeida, Constran e Odebrecht com o objetivo de "frustrar o caráter competitivo" da licitação da obra de construção do Rodoanel Sul, em São Paulo.

Segundo os depoimentos, Mário Rodrigues Júnior, então diretor de engenharia da Dersa, solicitou pagamento de R$ 1,2 milhão para financiar campanhas eleitorais após a Odebrecht ter vencido a licitação do lote 2 da obra. Antes disso, a concessionária teria feito ajustes em edital de licitação a pedido das empresas concorrentes.

Os colaboradores disseram que em 2007, José Serra, então governador de São Paulo, publicou decreto impondo às empresas renegociações de contratos mantidos com o poder público. Nessa ocasião, a Dersa era dirigida por Paulo Vieira Sousa, conhecido como "Paulo Preto" e próximo a Serra.

Após renegociação de valores em relação ao consórcio liderado pela Odebrecht, Paulo Vieira Sousa solicitou o pagamento de 0,75% do valor recebido por cada empresa, sob pena de alterações contratuais que as desfavoreceriam.

A Odebrecht, então, teria pagado R$ 2,2 milhões em favor da offshore Circle Technical Company Inc, que pertenceria a Amaro Ramos, supostamente operador do PSDB.

Os repasses teriam cessado após investigações implementadas por Ministério Público Federal e Tribunal de Contas da União, que concluíram pela ilegalidade das alterações contratuais.

OUTROS TUCANOS

As delações da Odebrecht que são detalhadas nas autorizações de abertura de inquérito do ministro do STF Edson Fachin atingem ainda os senadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e Ricardo Ferraço (PSDB-ES).

Na lista de apelidos da empreiteira, o paraibano é conhecido como "Prosador", e o capixaba, como "Duro".

Fachin aceitou o pedido de abertura de inquérito dos dois senadores.

Segundo os delatores da Odebrecht Alexandre José Lopes Barradas e Fernando Reis, Cunha Lima solicitou e recebeu R$ 800 mil para sua campanha ao governo do Estado do Paraíba, em 2014.

Ele perdeu a eleição para Ricardo Coutinho, do PSB.

O montante teria sido repassado por meio de um intermediário chamado "Luís". Os executivos do grupo baiano relataram que a empresa tinha a expectativa de receber "futura contrapartida e de realizar obra de saneamento naquele Estado".

O pagamento foi feiro pelo Setor de Operação Estruturadas do Grupo Odebrecht, área responsável pelo pagamento de propina e caixa 2 da empresa.

No despacho assinado por Fachin autorizando a abertura da investigação, a PGR afirma que vê indícios de caixa 2 em relação ao tucano.

Já Ferraço teria recebido da Odebrecht R$ 400 mil não contabilizados em sua campanha ao Senado em 2010, de acordo com os delatores Sérgio Luiz Neves e Benedicto Barbosa da Silva Júnior.

OUTRO LADO

Em nota, o senador José Serra afirmou que não cometeu nenhuma irregularidade e que suas campanhas "foram conduzidas pelo partido, na forma da lei". "A abertura do inquérito pelo Supremo Tribunal Federal servirá como oportunidade de demonstrar essas afirmações e a lisura de sua conduta."

Também em nota, o ministro Aloysio Nunes Ferreira disse que as afirmações são "mentirosas", mas afirmou que só vai se manifestar sobre o mérito "depois que tiver acesso ao conteúdo do pedido de inquérito."


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